Acordo do Plano de Recuperação à espera do "sprint final"

Representantes dos 27 Governos europeus reúnem-se nesta sexta-feira por videoconferência para discutir o plano de 1,85 biliões de euros, a partir do qual Bruxelas pretende contribuir para a recuperação da economia europeia e suavizar o impacto da covid-19.
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Os 1,85 biliões de euros incluem 1,1 biliões de euros do Quadro Financeiro Plurianual, formado a partir das contribuições dos Estados. A outra parcela será mobilizada pela Comissão Europeia nos mercados financeiros, através da emissão de dívida, garantida pelo orçamento da União, podendo ascender aos 750 mil milhões.

"Precisamos de avançar urgentemente", alerta a comissária portuguesa, Elisa Ferreira, numa altura a maioria dos Estados estão a favor do plano, mas ainda não há o necessário consenso no Conselho Europeu para que este seja aprovado. Prevê-se que as discussões não sejam encerradas na cimeira desta sexta-feira (19 de junho), e devendo ser precisas mais algumas semanas para fechar uma posição comum.

"Mas, tempo é um luxo que não temos", salientou a Comissária, numa conversa com jornalistas europeus, a partir de Bruxelas, na antecâmara da cimeira, tendo lançado o apelo "aos colegisladores, ao Conselho e ao parlamento", para que "façam tudo o que tiverem ao alcance para avançar rapidamente, tanto na arquitetura geral, como nas propostas legislativas concretas".

De acordo com a proposta da Comissão Europeia, a parcela do plano de recuperação será distribuída de duas formas distintas. Dois terços, serão canalizados através do orçamento de longo prazo, em forma de subvenções a fundo perdido, e o restante na forma de empréstimos, se os Estados o desejarem e os projetos o justifiquem.

Portugal tem destinados 26,3 mil milhões de euros, divididos em duas parcelas. A primeira parte de 15,5 mil milhões de euros, será atribuída em subvenções. A restante fatia de 10,8 mil milhões, que resulta de um cálculo com base no Produto Interno Bruto, estará disponível em empréstimos.

"Nenhum Estado-Membro está frontalmente contra a proposta da Comissão", afirma a relatora do Parlamento Europeu para o Quadro Financeiro Plurianual, a eurodeputada Margarida Marques (PS), admitindo, porém, que "há posições diferenciadas e posições complexas, relativamente a algumas propostas".

A que mais se destaca é a posição dos Países Baixos, que têm vindo a apresentar uma proposta "bastante mais redutora relativamente às subvenções a fundo perdido", critica a deputada, referindo-se também à Áustria, Dinamarca e Suécia.

Neste ponto, o eurodeputado José Manuel Fernandes (PSD), relator para os recursos próprios do orçamento europeu, considera que os frugais "já começam a perceber", que esta crise "é também uma crise de procura. E, se não houver procura, nos Estados membros eles também não exportam. E, portanto, eles precisam que essa procura aumente".

A cimeira será ainda marcada por uma discussão em torno dos critérios para o cálculo da distribuição de verbas. Diplomatas de alguns Estados membros criticaram o modelo de cálculo dos montantes. Consideraram que critérios económicos, como o produto interno bruto, o PIB per capita e o nível médio de desemprego entre 2015 e 2019, são obsoletos e não refletem a realidade desta crise. Defendem antes uma chave de repartição que tenha em conta a cotação do PIB entre a primavera e o outono, considerando que este dado será mais realista para a avaliação do impacto da pandemia.

Haverá também uma discussão em torno das condições que serão impostas, para que o dinheiro possa ser distribuído. Desta vez, Bruxelas tem vincado que não se tratam de condições semelhantes às dos programas de austeridade, desenhados após a crise de 2008, que foram particularmente penalizadores, para os países onde agora o coronavírus deixa um maior rasto na economia.

A Comissão Europeia pretende que desta vez, as condições associadas definam as prioridades para a aplicação das verbas europeias, garantindo que o dinheiro será gasto na transição para a chamada economia verde e digital.

Será também discutida a dimensão e o conteúdo do Quadro Financeiro Plurianual e o respetivo financiamento, incluindo as correções e os recursos próprios. José Manuel Fernandes salienta que qualquer decisão sobre os recursos próprios "será sempre mais difícil", uma vez que "implica unanimidade no Conselho e depois a ratificação de todos os parlamentos nacionais".

"E, na nossa cabeça a ratificação dos parlamentos nacionais significa 27 Parlamentos. Mas, não é assim porque os Estados membros como a Bélgica que tem vários parlamentos. Estamos a falar de 41 parlamentos", exemplificou.

Há um ponto que para já reúne consenso: "não há tempo". E, se as negociações do Quadro Financeiro Plurianual "nos últimos dois anos ou mais, foram como uma maratona, este é o momento do sprint final", defende a comissária Elisa Ferreira.

"O nosso objetivo final é chegar a um acordo o mais rapidamente possível", garantiu o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, na carta-convite, que endereçou aos líderes dos 27 Estados membros. Porém reconhece que o acordo ainda não está ao virar da esquina.

"Ainda temos um caminho bastante longo a percorrer para chegar a um acordo, pelo que teremos de trabalhar afincadamente nos próximos dias e semanas", afirmou, deixando entender que na reunião de hoje não haverá decisões.

Na carta, Charles Michel apelou ainda ao "sentido de responsabilidade", para as discussões que têm pela frente, durante as quais, o liberal belga espera que que os 27 demonstrem "vontade de sair unidos e fortes deste grande desafio".

"A situação está longe de ser fácil mas eu espero que todos os Estados membros venham a agir com espírito de compromisso face a esta situação sem precedentes", defendeu ontem Angela Merkel em Berlim, "considerando que "o melhor será conseguirmos um acordo antes das férias do verão".

Fontes ouvidas pelo DN admitem que possam ser precisas mais duas cimeiras. Uma na segunda semana de julho, e outra imediatamente a anteceder a pausa no funcionamento das instituições, durante o verão.

O Parlamento Europeu terá posteriormente de se debruçar sobre o documento, já em setembro, com o tempo a escassear, sendo certo que os deputados têm reiteradamente afirmado que não estão disponíveis para aceitar a proposta como um facto consumado. No entanto, prometem "agir de forma responsável".

"Continuaremos a manter as nossas exigências em cima da mesa, - até porque aprovámos a necessidade de um plano de contingência caso não haja acordo, de forma que o quadro entre em vigor no dia 1 de janeiro de 2021 -, mas o Parlamento Europeu está particularmente sensível para os prazos", frisou Margarida Marques, adiantando que esta "vai ser esta a linha da intervenção do presidente do Parlamento Europeu na abertura da cimeira".

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