Homenagem aos nossos "infantes de Marinha"
Obrigado a transferir a capital do Império português para o Rio de Janeiro para escapar à captura pelas tropas napoleónicas, o príncipe-regente D. João ordenou já com a Corte no Brasil a conquista de Caiena, a capital da Guiana francesa, que caiu em janeiro de 1809. Nessa ação militar, destinada a tirar desforço dos franceses que tinham invadido Portugal e chegado a entrar em Lisboa em finais de 1807, participaram "cerca de 300 infantes de Marinha, embarcados nos brigues Infante D. Pedro e Voador", como contou há três anos num artigo na Revista da Armada o Almirante Silva Ribeiro, hoje Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas. Ora esses "infantes" que integravam a então Brigada Real da Marinha são, embora sob outra designação, os nossos fuzileiros, corpo militar de elite que ontem celebrou 400 anos, tendo sido criado em 1621 com o nome original de Terço da Armada Real da Coroa de Portugal.
Foram muitos os teatros de operação onde os fuzileiros portugueses tiveram de mostrar o seu valor, em guerras várias, e agora são chamados com frequência a integrar missões internacionais. A par de outros militares portugueses, ajudarão nos próximos meses na formação de tropas de Moçambique que irão lutar contra as milícias jihadistas em Cabo Delgado, mas ainda há dois anos estiveram no país africano para ajudar no resgate das vítimas do ciclone Idai. Uma operação de salvamento de uma mulher em risco numa zona cercada pelas águas foi filmada e mostrou bem a extrema exigência que é feita a estes militares.
Elemento essencial de soberania, hoje como no passado, as Forças Armadas merecem todo o nosso respeito. Seja para dar ao futuro D. João VI trunfos para negociar na hierarquia de potências da Europa pós-napoleónica ou para ajudar hoje um país lusófono em dificuldades, no caso dos fuzileiros, seja para apoiar a reconstrução do Afeganistão, como vi fazer os comandos (em rotação com os paraquedistas), ou para travar a guerra na República Centro-Africana, é sempre Portugal que representam.
Tive o privilégio de ter tido nessa reportagem no Afeganistão como camarada de equipa do DN um antigo fuzileiro. Percebia-se como seria preciso muito para o abalar. Afinal, sei como é mítica a "pista de lodo" em Vale de Zebro e o que diz daqueles que a experimentaram, que nela treinaram, mesmo que na aridez afegã pareçam fora de contexto nomes como Terço da Armada Real da Coroa de Portugal, Brigada Real da Marinha ou Corpo de Fuzileiros (designação de 1961, quando começou a Guerra Colonial).
Na cerimónia dos 400 anos, muito condicionada por causa da pandemia, o atual Chefe do Estado-Maior da Armada, o Almirante Mendes Calado, realçou e bem, num vídeo divulgado nas redes sociais, o importante papel dos fuzileiros pois "o mar continua a ser fundamental para a preservação do modo de vida [português] e afirmação de Portugal como nação que se fez no mar". É impossível não concordar.