Deficiência. Peritos aconselham troca de benefícios fiscais por outros apoios

Grupo de trabalho de revisão de benefícios fiscais entende que apoios chegarão a mais pessoas, mas alguns fiscalistas discordam.

Os benefícios fiscais em IRS aos portadores de deficiência são um exemplo de medidas que implicam despesa fiscal que o governo deveria considerar substituir por apoios diretos, defende um grupo de peritos que ontem apresentou várias recomendações para a revisão do atual quadro de isenções, deduções e reduções de taxas. Mas a hipótese é rejeitada por alguns fiscalistas.

O grupo de trabalho, nomeado pelo governo para a terceira avaliação que é feita ao quadro de benefícios existentes (a anterior é de 2005), lembra que os apoios fiscais dirigidos a equilibrar o rendimento na incapacidade deixam de fora quem não paga IRS. E, assim, "poderia ser mais eficaz considerar um instrumento de despesa direta que chegaria a todos os indivíduos".

Mas a ideia não é consensual. "O subsídio premeia a ausência de rendimentos. É melhor o sistema de isenção", defende Tiago Caiado Guerreiro, para quem "quando se entrega dinheiro diretamente às pessoas, em termos psicológicos, tem-se mais poder sobre as pessoas".

O fiscalista lembra que as escolas divergem sobre os ganhos respetivos com despesa fiscal e despesa direta, mas salienta que "para alguma necessidade que as pessoas tenham, pois, é para isso que serve o Estado social", fazendo igualmente sentido fazer despesa direta nesse momento.

Já para João Taborda da Gama, a proposta será boa "em tese", mas é preciso ter em conta aspectos de equidade e eficiência. Por um lado, há que saber se "cidadãos com menos rendimentos já recebem outros subsídios por serem portadores de deficiência" e como se articulam ambos os apoios. Por outro, lembra que "a atribuição de benefícios em IRS é muito eficiente para o Estado e para quem os recebe". "As filas à porta da Segurança Social e o inferno burocrático assistencial em que vivem os cidadãos mais pobres tem de ser tomado também em conta."

O documento de propostas, Benefícios Fiscais em Portugal, foi apresentado ontem na Porto Business School da Universidade Católica. Passa em revista 542 benefícios fiscais dispersos por mais de 60 diplomas, para recomendar avaliações regulares, maior detalhe na inscrição nos orçamentos do Estado e a ponderação de alternativa de despesa direta.

João Taborda da Gama diz que a proposta será boa "em tese", mas é preciso ter em conta aspectos de equidade e eficiência.

Afinal, 50% das famílias e um terço das empresas do país não beneficiam da despesa fiscal ao não pagarem impostos. Mas os benefícios fiscais "fazem parecer que o governo é menor e que proporciona maiores benefícios", aponta o grupo de estudo de 12 elementos liderado pela economista Francisca Guedes de Oliveira.

O relatório defende que os benefícios fiscais passem a ser alvo de avaliação no momento da sua criação, com uma definição clara de objetivos e beneficiários (mais de um quinto destas medidas não têm um objetivo declarado), e antes de serem renovados ou revogados. Neste caso, com a criação de uma unidade técnica e profissional responsável por garantir que a avaliação se faz em ciclos de cinco anos.

João Taborda da Gama vê com bons olhos as recomendações feitas. "Mais do que uma avaliação e quantificação trata-se de um trabalho muito sério de levantamento e de estabelecimento de metodologias importantes para o futuro, que qualquer governo ou parlamento devem seguir na hora de conceder, alterar ou revogarem benefícios fiscais", defende.

Em 2019, a despesa fiscal deverá ficar em 11,7 mil milhões de euros, mais de sete mil milhões relativos a taxas reduzidas de IVA.

Para António Gaspar Schwalbach, o aspeto mais relevante das propostas está na sistematização dos benefícios fiscais existentes. "Não se justifica termos mais de cinco centenas de benefícios fiscais, e, mais importante, estarem de tal forma distribuídos pela legislação que é quase impossível identificá-los a todos." O fiscalista acompanha também a recomendação de que, no Orçamento do Estado, a previsão de valores que ficarão por cobrar em impostos passe a ser classificada de forma mais rigorosa e tão detalhada quanto a restante despesa pública.

Em 2019, a despesa fiscal deverá ficar em 11,7 mil milhões de euros, mais de sete mil milhões relativos a taxas reduzidas de IVA. Nos impostos diretos, a maior fatia de despesa apoia os objetivos do Regime Fiscal dos Residentes Não Habituais, com 526 milhões de euros que ficarão por cobrar em IRS em 2019 - abaixo dos 592 milhões de 2018. Só em segundo lugar surgem os apoios à pessoa portadora de deficiência, com 346 milhões de despesa prevista para este ano.

Mário Centeno, ministro das Finanças, defendeu que, "num futuro próximo", deverá proceder-se à "reavaliação e efetiva monitorização" dos benefícios fiscais existentes em Portugal com vista a uma "melhor gestão da despesa pública. A proliferação e a falta de uma monitorização rigorosa da eficácia e eficiência dos benefícios fiscais constituem um dos aspetos mais criticáveis do atual sistema tributário português, com relevantes consequências negativas no plano da equidade e da receita fiscal cessante", sustentou.

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