As quatro prioridades que não podem esperar nem um dia
Vai ser um desafio descobrir as semelhanças entre a tomada de posse e as primeiras horas na Sala Oval de Joe Biden e de Donald Trump. O empresário nova-iorquino prometera para o primeiro dia acabar com a lei de saúde que ficou conhecida como Obamacare e iniciar a construção do muro na fronteira com o México.
A primeira promessa não se realizou porque nunca teve apoio suficiente entre os republicanos e a segunda ficou por cumprir: dos 1600 quilómetros de muro, que seria pago pelo México, foram colocados 75 quilómetros de vedação e os restantes 653 quilómetros foram de reparação ou reconstrução da anterior, conta a NBC News. O dia da tomada de posse ficou ainda marcado por uma mentira posta a circular por Trump e pelo porta-voz, a de que nunca uma cerimónia daquelas tivera uma assistência tão grande, prenúncio do que se seguiria nos restantes quatro anos.
As prioridades de Joe Biden contrastam com as de Trump. No lugar de restrições no acesso à saúde e de combate à imigração e ao crime - o alegado efeito do muro - , o antigo vice de Barack Obama dá sinais de abertura ao mundo e de respeito pelas instituições internacionais: antes de mais os Estados Unidos vão regressar ao Acordo de Paris sobre as alterações climáticas e vai revogar a proibição de entrada no país de cidadãos naturais de alguns países de maioria muçulmana.
Outras medidas para consumo interno passam por uma ordem de extensão de restrições sobre despejos e execuções hipotecárias e outra relacionada com o combate à covid-19, no qual vai tornar obrigatório o uso de máscara em propriedade federal, num total de uma dúzia de ordens executivas a assinar no primeiro dia.
"O presidente eleito Biden tomará medidas - não apenas para reverter os mais graves danos da administração Trump - mas também para começar a fazer avançar o nosso país", escreveu o futuro chefe de gabinete da Casa Branca Ron Klain num memorando para as novas chefias na Casa Branca e divulgado no sábado.
CitaçãocitacaoNos seus primeiros dez dias de mandato, o presidente eleito Biden tomará medidas decisivas para enfrentar estas quatro crises, evitar danos urgentes e restaurar o lugar dos EUA no mundo
Nas vésperas da tomada de posse, Donald Trump disse em entrevista ao The Times que não queria misturar trabalho com celebração, pelo que o primeiro dia na Casa Branca não seria na sexta-feira mas de facto na segunda. Ainda sem a sua equipa aprovada pelo Senado, Joe Biden não quer perder um minuto e nos primeiros dez dias irá assinar uma série de ordens executivas, onde a prioridade se relaciona com a saúde e a educação: reabertura de escolas, expansão dos testes ao coronavírus e estabelecimento de padrões de saúde pública mais claros.
Segundo o memorando de Ron Klain, as ordens executivas estavam relacionadas com a pandemia, a crise económica, as alterações climáticas e a injustiça racial. "Todas estas crises exigem uma ação urgente. Nos seus primeiros dez dias de mandato, o presidente eleito Biden tomará medidas decisivas para enfrentar estas quatro crises, evitar outros danos urgentes e irreversíveis, e restaurar o lugar da América no mundo", acrescentou Klain.
Biden pretende também enviar para o Congresso vários projetos de lei, sendo o mais urgente o plano de 1,9 biliões de dólares para revitalizar a economia, embora se saiba que também deverá seguir um projeto de lei sobre imigração.
Durante a campanha, o democrata prometeu uma série de medidas a tomar logo no primeiro dia. Uma simples de cumprir (se é que não o fez já) é passar uma mensagem de tranquilidade aos países aliados: "Vou estar ao telefone com os nossos aliados da NATO e dizer "Estamos de volta, e podem contar connosco novamente"."
Biden comprometeu-se a reverter no primeiro dia ações de Donald Trump, como a baixa de impostos de 2017 para as empresas e os mais ricos (precisa de aprovação do Congresso); restaurar o direito dos trabalhadores federais em associarem-se em sindicatos; ou restabelecer a orientação federal do tempo de Obama que assegura aos estudantes transexuais acesso a desportos, casas de banho e balneários de acordo com a sua identidade de género.
Também disse que iria emitir novas normas éticas a aplicar à sua administração. Disse que iria conceder o estatuto de refugiado aos milhares de venezuelanos que entraram no país nos últimos meses assim que fizesse o juramento. Por fim, comprometeu-se a enviar ao Congresso um projeto de lei que revoga as proteções de que gozam os fabricantes de armas.
O campo de Joe Biden e de Kamala Harris está minado pela crise do coronavírus: o país tem menos dez milhões de postos de trabalho do que no início da pandemia e 400 mil pessoas morreram de covid-19. Mas também pelo ambiente que se vive no país, graças à retórica do presidente cessante e de parte significativa do Partido Republicano. Se é certo que dois terços dos norte-americanos estão satisfeitos com a gestão da transição de poder (Trump recebeu então 40% de aprovação), só 49% estão confiantes de que Joe Biden tomará as decisões certas para o futuro do país.
É no controlo da pandemia que mais confiam no seu sucesso (53%). Não ajudará à desconfiança o facto de sete em cada dez republicanos acharem que o futuro presidente não foi eleito de forma legítima, conclui a sondagem realizada para o The Washington Post e ABC News.
Investigadores do Departamento de Justiça dizem não ter encontrado qualquer prova de que os detidos que saquearam o Capitólio dos EUA no dia 6 tivessem a intenção de capturar e matar congressistas. Num tribunal do Arizona que iniciou na sexta-feira o caso de Jacob Chansley, conhecido por Jake Angeli ou xamã QAnon, os procuradores federais retiraram uma declaração anterior de que os apoiantes de Donald Trump planeavam "capturar e assassinar funcionários eleitos" no assalto à sede do Congresso.
O Departamento de Justiça afirmou que, apesar dos apelos feitos durante o ataque para capturar certos congressistas e para enforcar o vice-presidente Mike Pence, ainda não tinham sido encontradas quaisquer provas. "Não há provas diretas neste momento de equipas para capturar e assassinar", disse Michael Sherwin, procurador do distrito federal de Washington que está a supervisionar a investigação do ataque ao Capitólio.