A sua filha tem vergonha de ir à praia? Não é o fim do mundo, é só a adolescência
O verão e a exposição do corpo é motivo de angústia para muitos pré-adolescentes e adolescentes. Porquê?
A puberdade interfere não só na imagem corporal, mas também na autoestima. À medida que os adolescentes amadurecem cognitiva e emocionalmente, desenvolvem uma autoimagem mais complexa - que incorpora os seus interesses, talentos, valores, aspirações e relacionamentos. Mas, durante o início da adolescência, a imagem que veem no espelho constitui grande parte de sua autoimagem, sendo muito natural e comum o foco na aparência corporal.
A fase da adolescência é marcada por alterações no corpo, associadas à puberdade, mudanças essas que ocorrem a ritmos e de formas diferentes, e que são aceites de forma distinta pelos adolescentes. As mudanças são muitas vezes vividas com estranheza, e os jovens necessitam de algum tempo de adaptação a uma imagem nova que, muitas vezes e de modo transitório, não surge de forma harmoniosa. Quando este é o caso, o verão e a consequente exposição do corpo, é experienciada com alguma vulnerabilidade, pois a causa do desconforto torna-se mais visível, aumentando também o receio de que os outros olhem com crítica para a sua imagem corporal.
Faz parte do desenvolvimento que os miúdos nestas idades sejam mais pudicos ou reservados relativamente ao seu corpo?
Quando dizemos que cada criança é uma criança diferente é mesmo verdade! E por isso, a maneira como vivenciam as mudanças inerentes ao crescer depende de muitos fatores, nomeadamente do seu desenvolvimento cognitivo, emocional e social. Em todo o caso, a presença de uma maior reserva em expor o corpo prende-se com uma espécie de janela temporal de que aquele miúdo necessita para ele próprio se relacionar com as transformações corporais que estão a ocorrer, para se adaptar e para estabelecer uma autoimagem (neste caso corporal) positiva.
A partir de que ponto é que isso pode tornar-se um problema?
Na adolescência, o corpo é frequentemente associado ao valor da pessoa e à maior ou menor aceitação por parte dos pares; colocando-se uma pressão desajustada que condiciona, muitas vezes, a relação saudável do jovem com o seu corpo.
Assim, a forma como o adolescente desenvolve a relação com a sua autoimagem corporal é muitas vezes influenciada pela fase de desenvolvimento global que está a operar-se, em que tende a existir uma sobrevalorização de modelos (que tanto podem ser os amigos ou vir dos media), com a necessidade ou pressão de ser igual para ser aceite e maior sensibilidade às opiniões dos pares, que decorre de uma importante tarefa de desenvolvimento da adolescência em que o adolescente vai estruturando a sua identidade.
A verdade é que muitos adolescentes passam por um período de maior dificuldade em aceitar que o seu corpo em transformação não corresponde ao "protótipo idealizado", sentindo-se tristes, envergonhados, ansiosos, frustrados... Esta insatisfação corporal e, em certos casos, distorção da imagem, pode afetar negativamente o comportamento alimentar, a autoestima, o envolvimento em atividades físicas e sociais.
A que sinais é que os pais devem estar atentos?
Precisamente por ser um período de muitas mudanças e de necessidade de adaptação, a expressão pontual de desconforto com a autoimagem corporal pode ser normativa. Contudo, os pais devem estar atentos a verbalizações persistentes de auto desvalorização e crítica face à aparência; preocupação persistente com peso e calorias; alterações no humor; isolamento social; comportamentos que podem visar "disfarçar" ou corrigir de forma obsessiva aspetos corporais, como o uso de roupa larga, a prática de exercício físico excessivo ou a constante maquilhagem.
Quando pensamos nestes comportamentos, pensamos sobretudo em raparigas e excesso de peso, mas também pode afetar os rapazes e ter que ver com outras questões, não é?
Para além do tema do peso, podem surgir preocupações exacerbadas com corpos musculados, com o aparecimento de pelos, com a estatura, com a forma do corpo, com o tamanho das mamas [uma questão que afeta muitos rapazes na adolescência].
O que pode fazer-se para ajudar o adolescente a ter uma relação mais saudável com o seu corpo?
A compreensão dos pais, o apoio e diálogo são fundamentais nesta fase. Para incentivar uma imagem corporal saudável, é importante que os pais reconheçam que esta preocupação com a aparência física faz parte da adolescência e que pode causar sofrimento acentuado. Neste sentido, importa ajudar os filhos a aceitar e apreciar as mudanças físicas, elogiar e mostrar orgulho nas qualidades de personalidade, colocando a importância da aparência corporal em perspetiva. Além disso, tentar ser um bom modelo, pois quando os pais cuidam e apreciam os seus próprios corpos, aceitando as suas imperfeições, ensinam os filhos a fazer o mesmo.
E o que não fazer? Por exemplo, se a adolescente ou o adolescente se recusam a tirar a t-shirt na praia, podemos obrigar?
Forçar alguém a fazer algo com o qual não se sente confiante pode aumentar ainda mais a resistência e a necessidade de "fuga". Antes de obrigar os filhos a fazer seja o que for, os pais devem procurar através do diálogo compreender o que está na génese do comportamento do filho, aquilo que o preocupa ou incomoda, aquilo que sente e, em conjunto, encontrarem alternativas que possam ser mais apaziguadoras. Por exemplo, propor que em vez de um biquíni, use um fato de banho. Importante é nunca humilhar ou ridicularizar. Fazer uma brincadeira sobre uma mudança corporal do adolescente pode ser sentido por ele como algo muito penoso para ele. Nunca desvalorizar aquilo que a criança ou o jovem diz sentir ou pensar. Evitar a voz crítica em relação à imagem corporal, seja a sua, a de alguém da família ou a de quem quer que seja.
» Encoraje a assertividade. Ensine o seu filho a expressar as suas necessidades aos adultos e a exprimir os seus pontos de vista junto dos seus pares;
» Saliente os esforços do seu filho e a forma como ele se estará a sentir. Seja realista quando elogia.
» Encoraje a competência. Não se ofereça para fazer as coisas pela criança, nem se apresse a oferecer ajuda.
» Apoie e incentive o seu filho em novos desafios e experiências. Isso diz-lhe que confia nele e nas suas capacidades;
» Assuma o papel de modelo, mas simultaneamente de "intérprete" da realidade, apoiando o seu filho na tradução que faz sobre o funcionamento do mundo;
» Incentive o seu filho a assumir a responsabilidade em escolhas ajustadas à sua idade (qual o filme que vão ver, qual o sabor do iogurte que vai comer, qual a camisola que vai vestir, quais os amigos com quem vai ao cinema, que comida escolhe no refeitório...);
» Reforce positivamente o seu filho. Os comportamentos, as atitudes e os gestos aos quais damos mais atenção tendem a repetir-se, de forma mais intrinsecamente motivada. O seu filho sentir-se-á mais validado, apoiado e valorizado sempre que o reforça positivamente;
» Não assuma que domina todas as forças e fraquezas do seu filho.
Para promover a autoestima e autoconfiança precisa de dar oportunidades ao seu filho para ele experimentar e se desafiar, e manter-se por perto para o apoiar, caso seja necessário. E isto, pode implicar "dar um passo atrás", ceder à tentação de se substituir a ele, observar e incentivar, para ele dar muitos passos em frente. Aquilo que acredito pode ser mais desafiante para si, mas que é muito necessário neste processo, é conseguir tranquilizar-se. Converse com os seus próprios medos (que a criança chore, que erre, que se magoe...), fortalecendo a sua própria tolerância, dando tempo, espaço e oportunidade para que o seu filho se descubra a ele próprio, aprenda a resolver problemas e desenvolva um autoconceito positivo.