Destituição a curto prazo divide críticos de Rui Rio
Um processo visando a destituição de Rui Rio e a eleição de um novo líder do PSD antes das próximas eleições legislativas (outubro) "não é de todo recomendável". "Como estão, as coisas não estão bem mas não sou apologista de soluções mais radicais", disse ao DN um dos principais críticos internos de Rui Rio, Carlos Carreiras, presidente da Câmara de Cascais.
Para este dirigente laranja - que chegou a ser vice-presidente do partido no tempo de Passos Coelho e coordenou o processo autárquico de 2017 -, "era preferível que a atual direção do partido tivesse consciência de que as coisas não estão a correr bem e tentasse outros modos de mobilizar o PSD".
Outro crítico de Rio, José Eduardo Martins - em tempos até visto como potencial candidato à sucessão de Passos Coelho - partilha do mesmo argumento: "Sou institucionalista, acho que os mandatos devem ir até ao fim", disse ao DN.
Já Miguel Pinto Luz - vereador em Cascais e ex-presidente da distrital de Lisboa do partido, além de putativo candidato à liderança - deixou a pergunta: "Avanço para quê? Não há eleições marcadas, como eu já sucessivamente tenho dito. É extemporâneo estarmos a falar de um cenário que não está em cima da mesa sequer. Deixemos a vida rolar e não queiramos constantemente ultrapassar a realidade." "Tiram-me o sono sondagens que de alguma forma dão o PSD não tão representativo na sociedade portuguesa, [mas] essa discussão deverá ser feita dentro do partido e não me verão a contribuir em nada para divisionismo ou para situações de mais desequilíbrios dentro do PSD."
Todas estas reações surgiram na sequência da notícia de que Luís Montenegro anunciará hoje à tarde no Centro Cultural de Belém que é candidato à liderança do PSD e que quer que Rui Rio convoque ele próprio diretas no partido imediatamente.
Dizendo que vê "com grande preocupação o que se está a passar" no PSD, "a começar pelo comportamento e pela atitude da direção do partido e seus apoiantes", Carlos Carreiras responsabilizou Manuela Ferreira Leite pelo súbito agudizar da situação: "Veio incendiar tudo isto ao acentuar a ideia de que a liderança não tem um projeto alternativo para as próximas eleições."
Contudo, para Carreiras não é só à direção que se exige "um grande sentido de responsabilidade". Isso "exige-se a todos os militantes que tiveram responsabilidades no PSD, aos que as têm e aos que as querem ter no futuro". E, além do mais, há um problema de calendários: avançar agora para um processo de destituição (e substituição) do líder colocaria o partido em campanha interna até às eleições europeias (final de maio). Refletindo a sua própria experiência como presidente da Câmara de Cascais, Carlos Carreiras conclui: "Há militantes do PSD com responsabilidades de governo em autarquias importantes e não é agradável sentir este ambiente negativo à volta do partido."
Fontes próximas de Montenegro salientaram ao DN que, para já, o ex-líder parlamentar não se associa ao movimento das distritais - liderado pelas de Lisboa, Viseu e Setúbal - que querem a convocação de uma reunião extraordinária do Conselho Nacional que destitua Rui Rio. Quer apenas desafiar o líder do partido a convocar diretas. E se não o fizer, então Rui Rio poderá ter de enfrentar a tal sublevação no Conselho Nacional (o "parlamento" do PSD), sendo por ora impossível prever para que lado cai a contagem de espingardas.
O seu "chefe do estado-maior" parece ser o deputado que lhe sucedeu na chefia da bancada do PSD, Hugo Soares (e que Rio não reconduziu, fazendo-o substituir por Fernando Negrão). Montenegro tem também consigo Luís Campos Ferreira, que há semanas renunciou ao mandato parlamentar, dando ao Expresso uma entrevista muito crítica para com Rui Rio. Segundo fontes próximas de Montenegro, um dos tópicos fortes da intervenção que prepara para hoje no CCB terá que ver com a questão dos calendários. Montenegro tentará assegurar que uma mudança de líder agora não irá diminuir a força do PSD nas europeias (finais de maio) e nas legislativas (início de outubro).
Face à tempestade, a direção do PSD - começando pelo próprio Rui Rio - manteve-se em silêncio.
Em Belém, o caso está a suscitar preocupação. À saída, ontem, de uma iniciativa na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, Marcelo Rebelo de Sousa começou pelo argumento óbvio: por princípio, o Presidente da República "não se pronuncia sobre a situação interna de nenhum partido e, portanto, não abre uma exceção" para comentar "aquilo que é próprio da vida partidária, ou da vida sindical, ou da vida patronal".
Contudo, logo de seguida acrescentou: "Eu o que sempre disse, em abstrato, e mantenho, foi que é bom haver uma área do governo forte e uma oposição ou oposições fortes, isso é bom, e haver alternativas de poder." "É bom para a democracia e é bom para um Presidente da República, porque quanto mais alternativas houver em termos de governação e de poder, naturalmente, mais escolha têm os portugueses e mais fácil é resolver situações de crise."