Oposição aponta o dedo aos serviços públicos, PS às contas certas
Os parceiros do executivo no Parlamento, PCP e BE, vão mostrar os ganhos de causa na reposição de direitos e rendimentos e apontam ao futuro para mostrar que são essenciais ao "caminho de progresso" pós-legislativas. O PS e António Costa vão entoar o canto das "contas certas" de Mário Centeno. E tentar desfazer a ideia de que "estão a vender a ilusão" de um país que já abandonou a "austeridade".
"Há uma sensação de que o país está melhor", assume o deputado social-democrata Duarte Pacheco. Mas a sua bancada vai tentar desmontar neste debate essa sensação e tentar mostrar como Portugal podia estar melhor com outra política.
O país cresceu. "É verdade", assume Duarte Pacheco, mas lembra que neste período de quatro anos fomos ultrapassados por três países da União Europeia; Estónia, Lituânia e Eslováquia. "Isto significa que somos piores do que os outros? Não, significa que os outros aproveitaram melhor a conjuntura internacional."
A queda do desemprego também serve de exemplo que, frisa o deputado do PSD, já vinha numa trajetória do passado. O emprego, frisa, foi criado com base no salário mínimo que "aumentou exponencialmente". "É esse emprego mal pago que queremos?" - questiona.
Além disso, insiste, "o governo conseguiu durante muito tempo esconder a degradação dos serviços públicos e a queda do investimento, mas hoje os portugueses já se apercebem disso em todas as áreas, em particular na saúde". Por isso, afirma, "fazemos uma avaliação negativa destes quatro anos".
O PSD vai apresentar neste diagnóstico da saúde do país uma receita diferente do PS, a que Rui Rio anunciou recentemente, com a economia a crescer com base no investimento, queda de impostos e salários mais bem pagos.
O CDS também não terá uma versão muito diferente. "Continuaremos a insistir que o governo vendeu ao país a ilusão que é o fim da austeridade", diz ao DN o líder parlamentar centrista Nuno Magalhães. E os exemplos de que assim é são muitos, garante. A começar "pela maior carga fiscal de sempre, os piores serviços públicos de sempre", diz.
É no setor da saúde que o CDS aposta mais fichas neste último diagnóstico da legislatura e num clima de pré-campanha eleitoral. O CDS argumentará, diz Nuno Magalhães, com a falta de cirurgias e de médicos. "A saúde está um verdadeiro caos e com condições pouco humanas." Aliás, este foi um dos principais cavalos de batalha de Assunção Cristas ao longo dos últimos quatro anos. E que até justificou, a par da alegada degradação dos serviços públicos, uma das duas moções de censura com que brindou o governo.
Mas também os problemas nos transportes e nas escolas vão servir aos centristas para fustigar o executivo liderado por António Costa. A "desativação das missões de soberania", que vão desde as forças de segurança, passando pela justiça e Forças Armadas, também vão merecer a forte censura dos centristas. "Há uma ilusão do fim da austeridade que se veste do manto de impostos e de cativações de Mário Centeno", afirma o líder parlamentar do CDS.
Quanto aos ganhos económico-financeiros, Nuno Magalhães prefere ver o copo meio vazio e aponta aos relatórios internacionais que dizem que o país está a crescer menos do que o governo diz. "É importante ter contas em dia, mas são conseguidas à custa do acesso aos serviços públicos, como é o caso da saúde", frisa. "Só a Nação rosa pode estar feliz!"
Os bloquistas vão rebater as críticas da direita, lembrando que os cortes nos serviços públicos durante o governo de Pedro Passos Coelho e Paulo Portas foram muito superiores. "Despediram e atacaram os serviços públicos", frisou ao DN Pedro Filipe Soares.
O líder parlamentar do BE sublinha que o PSD e o CDS foram "a bengala" do governo para não aprovar propostas do Bloco de contratação de mais profissionais e valorização das carreiras. Mas reconhece que houve défice de investimento público, sobretudo porque o executivo deu ouvidos a Bruxelas e financiou o sistema financeiro, por exemplo quando transferiu quase dois mil milhões de euros para o Banif ou fez a "venda ruinosa" do Novo Banco.
Neste debate sobre o Estado da Nação, o Bloco quer sobretudo prestar contas do que foi o seu contributo para a governação nestes quatro anos. "Mostrámos que é possível ter a economia a crescer, recuperar direitos, e sedimentar isso com a recuperação de salários e boa distribuição da riqueza", garante Pedro Filipe Soares. "E se não fomos mais longe, foi pelas restrições das metas do défice exageradas", garante.
A palavra do BE serve para "demonstrar que com os acordos à esquerda se conseguiu recuperar a confiança do país em si próprio e na economia, depois da destruição da autoestima nacional". Pedro Filipe Soares valoriza o papel do seu partido ao dizer que em 2015 o PS tinha um programa que mantinha os cortes salariais, a sobretaxa de IRS e pouca vontade de mexer nas pensões.
O BE também quer olhar para o futuro próximo e tem esperança de que, até 19 de julho, a Lei de Bases da Saúde e a Lei Laboral sejam consensualizadas. É isso que dirá perante a câmara.
Os comunistas, que também foram um dos pilares do governo na Assembleia da República, vão "valorizar" a criação de condições para "virar a página" do tempo da troika e do governo PSD/CDS, segundo o deputado do PCP António Filipe. O que se traduz, garante, pela reposição de rendimentos e de direitos perdidos naquela altura.
"Queremos mostrar que houve uma marca do PCP nesta melhoria de vida dos portugueses", afirma e dá exemplos de algumas medidas que o seu partido promoveu: a reposição dos feriados, dos subsídios de férias e Natal e das carreiras, a redução dos passes sociais, o alívio no IRS e a descida do IVA da restauração.
O PCP não vai esquecer-se de "chamar a atenção" do governo para o que não avançou, sobretudo na valorização dos serviços públicos e no investimento nas áreas sociais, com enfoque na saúde, bem como na legislação laboral. "Ainda há risco de retrocesso, a questão do período experimental ainda não está fechada", afirma António Filipe. Que insiste que nas áreas em que o "PS convergiu com o PSD e CDS não houve avanços".
"Mas vamos centrar muito a nossa intervenção na ideia de que é preciso avançar no futuro nas áreas sociais, sobretudo no acesso à saúde, e na legislação laboral, na valorização do trabalho e dos salários", garante o deputado comunista, que também é vice-presidente do Parlamento.
O governo, pela voz de António Costa, mas também com o respaldo do PS, tem para contrapor outros números. "Iremos demonstrar que a alternativa política [a geringonça] deu resultados a vários níveis", afirma ao DN o vice-presidente da bancada socialista João Paulo Correia. E sublinha os ganhos na coesão social, crescimento económico e emprego.
"Neste debate iremos falar dos ganhos na competitividade da economia e na justiça fiscal e social, que retirou milhares de famílias do limiar da pobreza, com a subida do salário médio."
Às acusações de que os baixos níveis de investimento público provocaram a degradação dos serviços públicos, contrapõe que esse investimento "tem crescido ano após ano" e que o SNS tem um orçamento bastante superior ao último ano de governação PSD/CDS. O que, diz, também se aplica aos transportes, em que tem sido feito um esforço na aquisição de material circulante.
E apesar de se estarem a aproximar as eleições legislativas e o PS até desejar uma maioria absoluta, João Paulo Correia garante que "faremos questão de realçar que cumprimos integralmente os acordos celebrados com o PCP e o BE e que cumprimos o nosso programa de governo". O que permite, insiste, "que o país e os portugueses vivam francamente melhor do que em 2015".
Obviamente, que o governo, pela voz do primeiro-ministro ou até do ministro das Finanças, não irá esquecer-se de lembrar que Portugal registou um excedente orçamental de 0,4% no primeiro trimestre de 2019, de acordo com as contas nacionais do Instituto Nacional de Estatística (INE). O que significa que as receitas superaram as despesas públicas em 179 milhões de euros, um feito inédito, pelo menos desde 1999.