Joaquin Phoenix é o trunfo de 'Joker'
Esta tem sido a temporada de prémios mais monótona dos últimos anos. Chega-se à 92.ª cerimónia dos Óscares com muitas certezas empacotadas e apenas uma pequena dose de esperança de que o fator surpresa opere algum tipo de magia numa noite em que, mais uma vez, não há apresentador/a para animar os convidados e os espectadores. Essa monotonia, entenda-se, não é só prerrogativa daquele que se encaminha para ser o melhor filme, mas também dos atores e das atrizes. A maior diferença é que, neste campo, os intérpretes que têm vindo a somar estatuetas são, sem dúvida nenhuma, os vencedores por pleno direito: dificilmente alguém dirá que Joaquin Phoenix não tem o papel de uma vida em Joker ou que Renée Zellweger não estudou muitíssimo bem a linguagem da alma atormentada da estrela Judy Garland, em Judy.
Podemos olhar, claro, para o fabuloso regresso de Antonio Banderas em Dor e Glória, longe de Hollywood, naquela que é a sua personagem mais bela e genuína em muito, muito tempo - regresso esse que ganhou simbolismo maior por se tratar de uma autoficção de Pedro Almodóvar. Ou então olhar para Leonardo DiCaprio, que continua a provar a sua veia de grande talento na colaboração com os melhores (neste caso, Quentin Tarantino, em Era Uma Vez em... Hollywood). E Adam Driver, que soube viajar maravilhosamente para dentro do drama de Marriage Story sem o referente distrativo da personagem Kylo Ren (Star Wars)... Mas nenhum estará no mesmo patamar de génio performativo que Phoenix.
Da parte das mulheres, fica-se a matutar nesta quarta nomeação da jovem Saoirse Ronan, que agora é a nova protagonista do universo de Mulherzinhas, depois de Winona Ryder. Ronan, como quem não quer a coisa, tem sido uma das atrizes mais "prejudicadas" no cenário dos Óscares, um pouco na linha de DiCaprio, que quando ganhou a sua estatueta já acumulava cinco nomeações. Se considerarmos a possibilidade de um passe de mágica de última hora, talvez este não fosse despropositado - ela é das melhores da sua geração. Mas depois há ainda o caso de Scarlett Johansson, nomeada também como atriz secundária (Jojo Rabitt) e que não parece estar sob uma boa estrela.
O contrário pode dizer-se da sua advogada em Marriage Story, Laura Dern, que tem marcado território de uma maneira impressionante. Não haverá grande margem para a destronar. A acontecer, talvez outra mulherezinha de Greta Gerwig, Florence Pugh, tenha direito a uma afirmação retumbante, essa inglesa que chegou a Hollywood com uma extraordinária postura de confiança.
Por outro lado, este tem sido também o ano de glória de Brad Pitt, que representa uma espécie de selo na carta de amor de Tarantino a Hollywood. De resto, se se excluir Al Pacino, outro dos recordistas de nomeações (oito, a contar com esta, e um Óscar ganho), Joe Pesci será o grande perdedor da noite, ele que causou o maior dos espantos no seu regresso ao grande ecrã em O Irlandês. Martin Scorsese recuperou-lhe a pele de gangster e ele retribuiu com uma serenidade arrepiante, capaz de não deixar ninguém indiferente.
Estreado apenas na Netflix, Dolemite Is My Name, de Craig Brewer, foi material mais do que adequado ao renascimento de um meio apagado Eddie Murphy. A candura e a justeza desta sua personagem lendária - que só ele concebe com o toque subtil de uma comédia triste - valia-lhe a presença nos nomeados para melhor ator. E afirmá-lo não tem nada que ver com a questão da cor da pele, bem entendido.