O número de professores a passar à reforma vai disparar nos próximos anos. Em 2018, não chegam a 700 (669) os professores e educadores de infância que se aposentaram, em linha com o que se passou nos últimos anos e depois de uma corrida às reformas antecipadas no período da troika. Mas em 2019 as aposentações vão bater já nas mil, até chegarem às 3500 daqui a cinco anos, segundo as projeções do Ministério da Educação. Traduzindo: até 2023 vão reformar-se cerca de 11 mil professores (10% do universo atual, que ronda os cem mil), um enorme desafio para o ensino público, que pode perder boa parte dos professores mais experientes na próxima década e que não tem candidatos suficientes a sair das faculdades, alerta a classe..Os números podem colocar um problema ou ser uma oportunidade, como reconhece a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico num estudo publicado nesta semana. Desde 2014, reformaram-se cerca de 4500 professores, já contando com os que se aposentaram neste ano, ao passo que nos próximos cinco anos esse número vai passar para mais do dobro, números recordados agora por Arlindo Ferreira no seu blogue, Arlindovsky. As razões são óbvias, ao analisar o Perfil do Docente em 2016-17, publicado recentemente: existem cerca de 50 mil professores no Estado com mais de 50 anos, o que equivale, grosso modo, a metade de todos os professores do 1.º ciclo ao secundário - e sem contar sequer com os seis mil educadores de infância nesta faixa etária. Para se ter a noção do fosso geracional na classe, o país tem 16 mil professores no ensino público entre os 30 e os 39 anos e não chega sequer aos 500 com menos de 30 anos. ."Enquanto o perfil etário da classe docente apresenta claramente desafios, também pode representar uma oportunidade para revitalizar a profissão com novas ideias, novos níveis de aptidões e de especialização por parte de agentes de mudança da profissão", argumenta a OCDE no Reviews of School Resources, publicado na quinta-feira. "Tudo depende de como Portugal conceptualiza a profissão docente e as suas oportunidades de desenvolvimento." E é aqui que as coisas podem correr mal, considera a Associação Nacional dos Professores Contratados, que se diz alarmada com o abandono da profissão não só pelos professores à beira da reforma, mas também pelos que preferem seguir outras carreiras e já não voltam - "todas as semanas somos contactados por imobiliárias", conta César Israel Paulo, porta-voz da associação. ."Dentro de pouco tempo podemos não ter professores suficientes e desembocar em situações como a de Inglaterra, que tem de importar docentes. Nos próximos dez anos podemos perder 40% a 50% dos professores e nem a quebra da natalidade vai compensar as saídas, até porque temos menos pessoas interessadas em entrar na carreira. Até os contratados já estão, na sua maioria, na casa dos 40 anos", afirma César Israel Paulo. Manuel António Pereira, presidente da Associação Nacional de Diretores Escolares, concorda que os cursos da área da educação são, neste momento, "muito pouco cativantes, os professores são socialmente desacreditados, mal pagos e as escolas não têm autonomia para contratar, o que dificulta a entrada no sistema". O Reviews of School Resources refere os critérios de colocação nas escolas, que favorecem os professores que já estão no sistema, como um dos fatores para a falta de renovação dos quadros..Infografia DN.Menos dias de trabalho a partir dos 55 anos. Em resposta às questões levantadas pela OCDE, que admite ser "muito preocupante para o planeamento futuro o facto de apenas 1% dos professores portugueses terem menos de 30 anos", o Ministério da Educação argumenta que "abriu recentemente um novo ciclo de recrutamento e progressão que se deverá acentuar nos próximos anos, nomeadamente tendo em conta a aposentação de uma parte considerável do corpo docente e o restabelecimento das condições de progressão na carreira"..Entre as soluções apontadas pela OCDE para o sistema português estão a flexibilização das regras de reformas antecipadas, para que os professores se aposentem sem penalizações, e prever os maiores incentivos salariais na carreira para mais cedo, de forma a cativar mais profissionais para o setor. Manuel António Pereira aponta uma outra medida para retirar trabalho aos professores mais velhos e abrir a porta aos mais novos. "A partir dos 55 anos, os professores podiam trabalhar apenas três dias por semana, que passariam a ser dois aos 60 anos." Segundo o presidente da Associação de Diretores Escolares, isso permitiria aos professores mais velhos "irem largando as turmas", ao mesmo tempo que transferiam conhecimentos aos mais novos, "para que não se perca o capital de experiência desses profissionais", um dos riscos apontados pela OCDE..Como o DN escreveu nesta sexta-feira, a média de idades dos professores do 1.º ciclo público é de 47 anos, que passa para os 50 no 2.º ciclo. No 3.º ciclo e secundário públicos, a média é sensivelmente a mesma, 49 anos. O DN tentou, sem sucesso, ouvir as duas maiores federações sindicais da área da educação. A Fenprof e a FNE questionam há anos a redução do número de professores e o aumento da idade da reforma, que, como Mário Nogueira argumentou ao DN há um ano, "tiveram impacto sobre os novos professores, que não conseguiram entrar" no sistema.