Nicolasito, o filho de Maduro segue os passos do pai e já está na mira dos EUA
"Revolucionário e leal até à medula, sempre orgulhoso de seguir o caminho que apontas para mim", escreveu no Instagram Nicolás Ernesto Maduro Guerra, mais conhecido na Venezuela como Nicolasito para se distinguir do pai, o presidente venezuelano. "Conta comigo. Não só como filho, mas como militante do sonho bolivariano da pátria livre e soberana", acrescentou na mensagem a 24 de novembro, por ocasião do 57.º aniversário de Nicolás Maduro. Ao lado do pai desde que este chegou ao poder, em 2013, considera uma "honra" estar na lista de sanções dos EUA. O seu próximo desafio serão as legislativas marcadas para dezembro.
Fruto do primeiro casamento de Maduro com Adriana Guerra Angulo (terão casado em 1988 e em 1994 o agora presidente dizia estar solteiro), Nicolasito acaba de festejar os 30 anos. A festa a 21 de junho em Caracas acabou, segundo a imprensa espanhola, com dois chefes da polícia local detidos. Isto depois de terem respondido às queixas dos vizinhos, que denunciaram a celebração em plena quarentena decretada pelo próprio governo de Maduro para travar a pandemia de coronavírus. De acordo com o El País, um dos polícias chegou a escrever no Twitter (a mensagem terá sido apagada) que não podia fazer nada porque a festa estava a ser vigiada pelos funcionários da Casa Militar (responsáveis pela segurança do presidente).
Não é a primeira vez que Nicolasito está no centro da polémica: em março de 2015 causou indignação nas redes sociais o vídeo em que dançava, no casamento de um rico empresário sírio-venezuelano em Caracas, enquanto ao seu redor caíam notas de dólares. Isto em plena crise económica e quando, na prática, a compra de moeda estrangeira era proibida entre os particulares na Venezuela e todas as transações nas casas de câmbio estavam sujeitas à autorização do Estado.
Maduro Guerra foi flautista no sistema de orquestras na Venezuela, mas a paixão pela música foi substituída por um curso de Economia na Universidade Nacional Experimental Politécnica das Forças Armadas. Quando chegou ao poder em 2013, após a morte de Hugo Chávez que o tinha designado como seu herdeiro político, Maduro criou um cargo no governo especialmente para o filho que tinha então 23 anos: líder do Corpo de Inspetores Especiais da Presidência. A sua tarefa era impedir a especulação de preços por parte dos empresários privados.
Um ano depois, tornava-se também coordenador da Escola Nacional de Cinema da Venezuela, apesar de não ter qualquer conhecimento sobre o tema. "O filho de Maduro não sabe nada de sétima arte. Do que sabe é de roubar câmaras", disse na altura o dramaturgo venezuelano José Tomás Angola. "Imagino as aulas: cinema de tortura, cinema de propaganda, porno suave bolivariano, cinema mudo", indicou o realizador Jonathan Jakubowicz, ambos citados num artigo escrito na altura da nomeação no jornal El Mundo. Mais recentemente, começou a apresentar um programa de entrevistas nas redes sociais, intitulado Maduro Guerra Live, que é transmitido também na televisão pública.
Nicolasito, que é casado e tem duas filhas, cresceu a assistir aos comícios de Chávez e é membro das juventudes do Partido Socialista Unido da Venezuela. Há um ano, numa delegação de jovens do partido, visitou a Coreia do Norte, escrevendo no Instagram que "a luta do povo coreano é justa. E mais do que isso, é humana. E, como tal, é também nossa. Esta visita é histórica porque nos permite aprender com vocês". Mas as viagens não são de agora, já que costumava acompanhar o pai quando este era chefe da diplomacia de Chávez e continua a acompanhá-lo em atos públicos Na mesma rede social tem uma foto onde surge atrás do pai e do presidente russo, Vladimir Putin, numa visita ao Kremlin.
Desde 2017 que Nicolasito assumiu um outro cargo político: o de membro da Assembleia Constituinte. Esta foi criada pelo pai para retirar o poder à Assembleia Nacional, que desde 2016 - e pela primeira vez em plena revolução bolivariana lançada por Chávez em 1999 - é liderada pela oposição. Em janeiro de 2019, depois de meia centena de países questionarem a reeleição de Maduro, o novo líder da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, autoproclamou-se presidente interino da Venezuela, considerando que o cargo tinha ficado livre segundo a Constituição.
O resultado é que o país tem desde então dois presidentes, com Maduro a manter-se no cargo apesar da pressão internacional de meia centena de países - incluindo os EUA, Espanha ou Portugal - e da pressão dos protestos nas ruas. Guaidó não conseguiu derrubar o sucessor de Chávez e, desde janeiro deste ano, existe uma segunda liderança da Assembleia Nacional (eleita numa sessão paralela sem a oposição), só para complicar ainda mais a situação política no país.
As eleições convocadas para 6 de dezembro - e nas quais se espera que Nicolasito seja um dos candidatos por El Valle (Caracas) - servem para eleger os novos deputados. Mas a oposição já denunciou o escrutínio, alegando que este não pode ser justo quando o novo Conselho Eleitoral e a sua líder, Indira Alfonso, foram nomeados pelos juízes do Supremo Tribunal de Justiça (nas mãos do regime) quando por lei deviam ser designados pela Assembleia presidida por Guaidó. "Os venezuelanos não podem reconhecer uma farsa, como não o fizemos em maio de 2018 [quando Maduro foi reeleito]. Ninguém vai validar ou ratificar uma ditadura quando não há um mecanismo real de disputa do poder", disse Guaidó, com a Assembleia Nacional a alegar que "não existem as condições mínimas para garantir o direito de voto."
Em causa está também um novo sistema, desde logo o número de deputados - passa de 160 para 277 -, com Alfonso a alegar o aumento demográfico da população, quando milhões de venezuelanos deixaram o país nos últimos anos por causa da crise económica, social e política. Além disso, 48% dos novos deputados serão eleitos por voto nominal e os restantes por voto em lista em 87 círculos eleitorais que parecem ter sido desenhadas para permitir uma maioria para o Partido Socialista Unido da Venezuela. "As decisões recentes diminuem a possibilidade de construir condições para um processo eleitoral credível e democrático", disse a alta-comissária dos Direitos Humanos das Nações Unidas, a ex-presidente chilena Michelle Bachelet, que denunciou ainda "torturas e detenções arbitrárias" no país.
O único filho do presidente - que tem também três enteados fruto do casamento com Cília Flores, ex-procuradora-geral dez anos mais velha com quem tinha uma relação desde a década de 1990 - está desde junho de 2019 na lista de sanções norte-americanas. Nicolasito foi acusado de estar envolvido nos esforços de propaganda e censura do regime, além de beneficiar dos lucros provenientes das minas venezuelanas - que alguns alegam terem-lhe sido oferecidas pelo pai.
"O regime de Maduro foi construído com base em eleições fraudulentas e o seu círculo íntimo leva uma vida de luxo com os lucros da corrupção enquanto o povo venezuelano sofre", disse então o secretário do Tesouro dos EUA, Steven Mnuchin. "Maduro depende do seu filho Nicolasito e de outros próximos do seu regime autoritário para manter o estrangulamento da economia e reprimir o povo da Venezuela", acrescentou. Na altura, o filho de Maduro disse ser uma "honra" ser sancionado, alegando que era o primeiro com menos de 30 anos a fazer parte dessa lista.