Pelo menos 16 casos da variante do Reino Unido. Falta saber se já há contágio no país
O Instituto Ricardo Jorge confirmou a presença da nova mutação do SARS-CoV-2 em Portugal. Analisaram 22 amostras, 13 delas colhidas no aeroporto de Lisboa, e 16 deram positivo. São sobretudo de viajantes, mas ainda está em análise se há transmissão comunitária.

Amostras são analisadas no Departamento de Doenças infeciosas, do Instituto Ricardo Jorge, no Instituto Ricardo Jorge, em Lisboa
© Álvaro Isidoro / Global Imagens
A nova variante da covid-19 está oficialmente identificada em Portugal continental. O Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge (INSA) confirmou ontem que, em 22 amostras analisadas, 16 testaram positivo à variante recentemente identificada no Reino Unido.
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E, o que se sabe para já, é que esta é 70% mais contagiosa do que as outras existentes. Treze das amostras foram colhidas no aeroporto de Lisboa, onde houve também a maior confirmação de casos, até porque um dos critérios para a investigação foram as pessoas associadas a casos positivos de Covid-19 com historial de viagem. Sequenciaram, ainda, nove amostras provenientes de outros laboratórios. Falta saber se já há transmissão comunitária.
"Caso venha a verificar-se que algumas dessas sequências estão associadas a casos para os quais foi reportada a inexistência de viagem ao estrangeiro, os mesmos poderão configurar transmissão comunitária, requerendo particular investigação de contactos por parte das autoridades de Saúde Pública", sublinha uma nota do INSA
A atualização do relatório de situação sobre a diversidade genética do SARS-CoV-2 em Portugal, foi enviada pelo INSA ao Ministério da Saúde no sábado. O Gabinete de Marta Temido diz que o documento está a ser estudado.
Foram analisadas 22 sequências do genoma do novo coronavírus em amostras suspeitas. Estão associadas a casos positivos com historial de viagem e amostras com falha de deteção do gene S nos testes de diagnóstico RT-PCR, característica da nova variante, que foi detetada pela primeira vez no Reino Unido, em setembro, tendo-se alastrado a 34 países dos cinco continentes.
Estes 16 casos - sobretudo em Lisboa e Vale do Tejo - poderão ser uma pequena parte do que circula no país, segundo o pneumologista Filipe Froes. "Na maior parte dos casos não se faz a sequenciação do genoma, o que significa que poderá haver mais do que os anunciados agora e há mais tempo. Depois, também é preciso ter em consideração que, tendo a variante sido já detetada em outros países, pode ter entrado em Portugal por outras vias, como a terrestre".
As análises foram realizadas no âmbito do "Estudo da diversidade genética do novo coronavírus SARS-CoV-2 em Portugal", desenvolvido e coordenado pelo INSA, em colaboração com o Instituto de Gulbenkian de Ciência. Analisaram até à data 2290 sequências do genoma, de amostras de 65 laboratórios, hospitais e instituições, representando 199 concelhos.
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Novas preocupações
Para o virologista Pedro Simas, as mutações fazem parte dos vírus, esta era esperada e não é a primeira. Mas, sublinha, a comunidade tem de estar atenta. "Havia três preocupações em relação a esta nova variante: que tivesse impacto nas vacinas, e não há evidência que tenha; que tivesse maior virulência, e já se percebeu que não tem; que provocasse um maior número de infeções, e não é claro que isso aconteça. Tem uma maior capacidade de disseminação em relação às outras variantes, mas penso que isso não se reflete num aumento de infeções descontrolado, até porque as regras para prevenir a infeção são as mesmas. Há qualquer coisa nela que a torna mais competitiva em relação às outras e é preciso estar vigilante", diz o investigador do Instituto de Medicina Molecular.
As preocupações do pneumologista Filipe Froes centram-se, sobretudo, na capacidade do Serviço Nacional de Saúde. "Estas mutações causam sempre preocupação em três áreas: se traz mais transmissibilidade e, provavelmente a nova variante tem maior transmissibilidade nas idades pediátricas - há países a manter as escolas enceradas mais tempo; maior gravidade da doença e, neste caso, os dados disponíveis não apontam para isso; e, se houver mutações em cima de mutações, pôr em causa a eficácia da vacina, mas por enquanto as vacinas mantêm a eficácia."
O problema é que a nova variante surge num período de festividades e de convívio familiar. "Já estamos a detetar um maior número de infeções, quer em termos de novos casos, quer de internamento", sublinha o coordenador do Gabinete de Crise da Ordem dos Médicos.
Restrições em avaliação
O Governo não prevê "alterar as medidas previstas devido ao aparecimento da nova variante do SARS-CoV-2", disse fonte governamental ao DN. As restrições na próxima semana são as mesmas que vigoram desde a declaração deste segundo estado de emergência, com a possibilidade de serem mudadas se existirem dados novos.
Na mesma linha, o Presidente da República disse que vai prolongar em uma semana o estado de emergência, que termina no dia 7, até porque se desconhecem os efeitos da época natalícia no evoluir da disseminação do novo coronavírus.
Filipe Froes sublinha que "faz parte da abordagem de uma pandemia, a reavaliação contínua das medidas", e que o foco deve ser na vacinação. É ele o relator final do documento da OM, que salienta que deve ser dada prioridade à idade e ao tipo de doença. "Se há uma medida que esta variante vem tornar mais premente é a vacinação para evitar ainda mais a disseminação da doença. O aumento de casos e a contínua mutação que pode ocorrer podem diminuir a eficácia da vacina."
Pedro Simas entende que os próximos três meses são cruciais no evoluir da pandemia e que a aposta deve ser na vacinação e por grupos de risco. Quanto às medidas, propõe "um equilíbrio entre a sociedade e o endurecimento das medidas, que têm impacto na saúde pública, na economia e em tudo", podendo tornar-se "insustentáveis". "Como estamos num planalto de infeções, cada vez mais as medidas para controlar o vírus se tornam difíceis. Em termos pandémicos, estamos no princípio. É natural que o número de infeções continue a aumentar, porque cada vez se torna mais difícil controlar a doença", justifica
Vacinação em lares arranca em Mação
A vacinação nos lares arranca esta segunda-feira em Mação. Serão vacinados utentes e funcionários da Casa de Idosos de São José das Matas (51 pessoas) e Santa Casa da Misericórdia de Cardigos (61).
É uma nova etapa das prioridades no Plano de Vacinação. Mas o virologista Pedro Simas sublinha que deviam dar prioridade a todos os idosos. "Entre 1 e 15 de outubro, 24,5 % das mortes por covid-19 foram nos lares e 75,5 % fora, devia ser dada prioridade aos grupos de risco. Concordo com a Ordem dos Médicos".
Refere-se a um documento entregue a 21 de dezembro à tutela, cujo relator é Filipe Froes. "Para facilitar a operacionalização da vacina e ter maior impacto na redução da mortalidade, fizemos propostas de intervenção em que defendemos que a vacinação de privilegiar critérios assentes em grupos etários, como faz o Reino Unido.
Com Paula Sá
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