"O PSD não pode estar neste limbo"

Miguel Pinto Luz tece duras críticas a Rui Rio, embora defenda que tem de continuar até às eleições. O vice-presidente da Câmara de Cascais na entrevista DN/TSF.

Já liderou a distrital de Lisboa do PSD e foi brevemente secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e Comunicações no segundo governo de Pedro Passos Coelho, que durou apenas 27 dias. O seu nome já foi apontado por Miguel Relvas e por Marques Mendes como possível futuro líder do PSD. O vice-presidente da Câmara Municipal de Cascais, Miguel Pinto Luz, fala da liderança do seu partido, das europeias e dos desafios para os próximos tempos.

António Costa classificou há cinco anos a vitória de António José Seguro nas europeias como "poucochinho". Como é que classificaria esta derrota de Rui Rio?
Bem, começamos logo pelo tema quente, e não vou fugir à questão. Eu entendo que o PSD teve de facto uma derrota, e uma derrota é sempre uma derrota, e esta foi muito má, muito dura. Mas, ainda assim, tenho de fazer uma análise mais ampla do resultado. O resultado de António Costa também ele é poucochinho. Depois de quatro anos de festim, de regabofe, de distribuição sem medida, de acudir a todos os interesses, a todas as corporações, o Dr. António Costa tem 33%, mais 1,5% do que o tal resultado poucochinho. O resultado do PS é entendido como uma grande vitória porque o resultado do PSD é um resultado muito fraco, e isso há que dizê-lo sem rodeios porque é talvez o resultado histórico mais baixo do PSD. O que nos deve levar, com humildade, a fazer uma análise rigorosa desses números.

Estava à espera?
Confesso que não estava à espera de que fosse tão pouco. Defendi desde início a candidatura de Paulo Rangel, e hoje defenderia da mesma forma. Acho que o Paulo Rangel é de longe, de todos os cabeças-de-lista que se apresentaram nestas eleições, o mais bem preparado para desempenhar o lugar. Ainda assim, eu não esperava que o resultado fosse tão baixo. Aconteceu e essa análise tem de ser feita retrospetivamente, mas, mais importante, temos de olhar para as eleições legislativas.

Esta derrota é de Rui Rio, de Paulo Rangel, é de todos, é possível identificar os principais responsáveis?
Tenho uma perspetiva muito futebolística da análise de resultados: pode ser imputado a todos sem exceção, mesmo àqueles que não apoiaram Rui Rio. Eu disponibilizei-me para apoiar e estive na rua a fazer esta campanha. Como fui pai não tive a disponibilidade para estar ainda mais tempo na rua, mas gosto de fazer campanha na rua, concorde ou não com os líderes que lideram em determinado momento o meu partido. É o partido como um todo que deve refletir, e não interessa agora fazer a noite das facas longas nem, tão-pouco, a caça às bruxas. É tempo, portanto, de toque a rebate e de perceber que temos de juntar, de federar - haja vontade. Agora, esse movimento de federar cabe tanto àqueles que não apoiaram Rui Rio como cabe à direção de Rui Rio e ao próprio. Os casamentos têm sempre os dois lados, os namoros a mesma coisa, e, na vida, se nos queremos aproximar, temos de dar sinais. Acho que a direção nacional e o Dr. Rui Rio têm tido todo o espaço para o fazer. Houve aquele episódio no início do ano, mas não passou, de facto, de um episódio e a minha posição foi clara nessa altura, não concordei com essa tomada de posição, não concordei desde o início, desde o congresso. O Dr. Rui Rio deve fazer com estabilidade todo o mandato e deve ter disponíveis todos os soldados do partido, com lealdade. Mas nessa lealdade tem de haver espírito crítico. Ainda assim, houve estabilidade após esse episódio do início do ano para se implementar uma dinâmica, um programa, no terreno.

A direção soube aproveitar essa estabilidade, soube integrar aqueles que, estando no terreno, têm uma visão crítica sobre algumas das situações que o partido tem atravessado e a forma como tem reagido?
Eu vi muita gente na rua, vi os críticos na rua, todos eles ao lado de Paulo Rangel. Mais até do que a direção, que também teve esse papel, o próprio candidato teve essa preocupação de juntar todos. Todos os ex-líderes estiveram na campanha - Passos Coelho, Manuela Ferreira Leite - e, por isso, acho que desse ponto de vista tiveram todas as armas no terreno para poderem usufruir delas.

"O PSD não tem sido capaz de dizer bem alto e de tornar clara a desgovernação deste governo socialista"

Então o que é que faltou, porque é que Rui Rio não tem conseguido chegar mais longe?
Aí tenho de fazer uma análise mais profunda do que é que tem falhado. O PSD, de alguma forma, não tem sido capaz de dizer bem alto e de tornar clara a desgovernação deste governo socialista. Tem sido, de facto, um desgoverno para este país, e o PSD tem sido parco, tímido, diria eu, em tornar clara essa má governação. De uma forma muito clara e muito objetiva, tenho de dizer que faz falta ao PSD denunciar o embuste que este Governo socialista tem sido. E que embuste é que tem sido? De facto, as pessoas hoje sentem melhor qualidade de vida, sentem mais dinheiro no bolso, sentem um desafogar do seu dia-a-dia. Portanto, mas que diabo, está aqui um político a dizer que isto é um embuste, mas que embuste é este? É um embuste do falso sucesso governativo. Eu digo que é o governo campeão do desinvestimento e campeão das cativações. Depois, o que é que ele faz com esses recursos que consegue acomodar do desinvestimento e das cativações? Vai acudir e apagar todos os fogos imediatamente. Quando existe um problema numa corporação, há sempre uma resposta com o Orçamento Geral do Estado, à custa das cativações e do investimento. E a resposta é sempre a mesma: mais Estado, mais nacionalizações, mais regalias, mais cedências aos interesses. Esta visão do mundo está ultrapassada e não vingou, e não vingou nestas eleições europeias. Vou dar três exemplos. O problema nas PPP da saúde. Arrasa-se as PPP, mesmo as que funcionam, as que são boas para o erário público, para os utentes. Há problemas no ensino particular e nos contratos de associação, a resposta é a nacionalização. Há problemas nos transportes, a resposta é a nacionalização e o passe, mas depois não se vê o reverso da medalha. Muito bem, o passe social foi uma boa medida, mas temos de perceber que não existe infraestrutura para acudir ao aumento da procura, e vemos o que está a acontecer na Soflusa, no aumento de procura desmesurado. É esta forma impreparada de governar com a qual eu não estou de acordo. No fim, o que me custa mais nisto tudo é o custo desta demagogia. Passada uma legislatura inteira temos crianças com cancro tratadas em contentores numa cidade que é a segunda do país, num país da União Europeia. É uma máquina de comunicação muito forte, é uma forma de fazer política com a qual eu não me identifico. E não o que temos de entregar aos concidadãos, uma visão de longo prazo.

A questão recente dos professores foi precisamente o governo a defender que não havia dinheiro para pagar os retroativos que era preciso pagar e o PSD a defender que era preciso pagar, pôr dinheiro no problema.
É aquilo que eu chamo a exceção que confirma a regra.

Assim é difícil, de facto, passar uma mensagem...
Eu acho que os partidos da oposição estiveram muito mal em todo esse processo.

O PSD também?
O PSD também. Estiveram todos. Acho que os senhores deputados e as senhoras deputadas, que tiram hoje muito partido da ARTV, têm de perceber que o pau tem dois bicos e, portanto, a comunicação tem dois bicos. Os deputados inauguraram essa nova forma de fazer política, mas têm de perceber que existe o reverso da moeda. Não é possível discutir um problema tão sério daquela forma. Parecia que estavam ali numa mesa de café a decidir o futuro de tantos milhares de professores. Isso temos de o dizer, e o Dr. António Costa, mais uma vez exímio comunicador...

Basicamente, ele não precisou de fazer nada.
Não precisou de fazer nada. Precisou só de ter a acutilância política de aproveitar um momento e de fazer uma crise que não existia.

Acha que esse foi um momento de viragem? Ou seja, até aí, o PSD tinha liderado a pré-campanha e a partir daí parece que surgiu numa posição mais envergonhada.
Esse episódio teve um papel preponderante no resultado final. Já ninguém fala do escândalo de "la famiglia"... Havia dois temas que estavam a liderar a campanha, infelizmente para mim, porque não se falava na Europa, que era aquilo que devia estar: a família socialista que, de facto, estava a ganhar uma dimensão que eu nunca tinha visto, sinceramente, e acho que a dado momento na história temos de voltar a esse tema, para que não se repita; o outro era a inexistência do cabeça-de-lista do Partido Socialista. Portanto, os ingredientes eram os necessários e suficientes para o PSD ter um grande resultado, e não só o PSD, também outras forças políticas que se opunham ao PS. Porque, de facto, assistimos a uma inexistência total do cabeça-de-lista do PS. Já tínhamos assistido enquanto ministro das Infraestruturas e, no fundo, ele não defraudou as nossas expectativas. O Dr. António Costa teve de ir acudir ao fogo e teve de liderar a campanha, a campanha foi o Dr. António Costa. Pela primeira vez, um primeiro-ministro em funções em Portugal diz que estas eleições europeias podem significar uma avaliação do governo; sobe a fasquia, cria uma crise que eu não posso dizer que é artificial porque nós ajudámos... demos a oportunidade e o Dr. António Costa agarrou-a e isso, com certeza, influenciou o resultado eleitoral.

O que é que correu mal?
Para se perceber o que é que correu mal tenho de fazer primeiro uma análise da Europa. As eleições são europeias, são o segundo maior ato democrático no mundo, logo a seguir às eleições na Índia. Temos de partir do todo e perceber depois o papel do PSD. Os partidos socialistas europeus só ganharam em dois países - Portugal e Espanha. O socialismo deixou de ser entendido como uma solução de futuro pela vasta maioria da Europa no seu todo. Só em Portugal e em Espanha é que o socialismo ainda vinga. Depois, ouço muito contentes os partidos ditos moderados tradicionais, o PSD incluído, por essa Europa toda porque, de facto, os nacionalistas não ganharam o espaço que todos pensavam que iam ganhar. Ora, eu tenho exatamente a leitura contrária, os partidos nacionalistas não cresceram aquilo que as sondagens diziam que iam crescer, mas aconteceu uma coisa muito clara: consolidaram-se. Passou a ser uma realidade consolidada, não é um epifenómeno, deixou de ser um epifenómeno. Nós não podemos agora sentar-nos à sombra da bananeira e pensar que passámos este resultado e vamos continuar a fazer tudo na mesma. Porque é que os nacionalistas se consolidaram? Porque existe de facto um sentimento de insegurança económica, dos salários, das pensões, insegurança identitária, a Europa hoje tem uma insegurança identitária grande, mas depois existe também uma insegurança física. A Europa, pela primeira vez em muitos anos, tem experiências de terror nas ruas. Estes partidos ditos nacionalistas verbalizam aquilo que os partidos democráticos moderados não conseguem verbalizar; aquilo que cidadãos comuns que estão lá fora, que não vivem, não respiram política de manhã, à tarde e à noite não conseguem verbalizar, mas eles verbalizam, dizem-no e depois dão respostas. Respostas com as quais não concordo, sou um democrata convicto. E nós, partidos moderados, o que é que fizemos? Imediatamente na noite das eleições e nos dias subsequentes fechámo-nos - nomeadamente o Dr. Costa é pródigo nisso -, fechámo-nos em salas e começámos a discutir a forma pela qual poderíamos contrariar os resultados que os eleitores deixaram claros nas urnas, fazendo as manigâncias e jogadas de bastidores, as geringonças que ninguém absolutamente percebe. Isto já é tradição, o Dr. Costa é exímio nestes arranjinhos, e sabe muito bem como fazê-los, mas esta aliança progressista que o Dr. António Costa propõe para a Europa é talvez, diria eu, o maior brinde que podemos dar ao senhor Salvini e à senhora Le Pen. Alianças contranatura entre liberais, sociais-democratas e outros para juntarmos num gueto e bipolarizarmos completamente o terreno político só vão dar mais palco ao senhor Salvini e à senhora Le Pen. É talvez o maior erro político que se cometeu nas últimas décadas na Europa, mas nessa altura com certeza estaremos cá para falar sobre isso. Depois temos o crescimento dos Verdes. O PAN cresce em Portugal, é verdade, mas crescem muito mais todos os partidos homólogos em toda a Europa. Porquê? Porque, mais uma vez, os partidos moderados esqueceram essa agenda. Quem é que liderou a agenda do ambiente em Portugal nos anos oitenta e noventa? O PSD. Hoje, o PSD não tem um Carlos Pimenta, não tem um campeão do ambiente. Jorge Moreira da Silva foi outro campeão do ambiente. O PSD hoje não tem isso, os partidos moderados hoje não têm isso, abandonaram essa agenda, nenhum deles tem essa agenda. Portanto, essa agenda tem de cair nalgum lado porque as pessoas preocupam-se com o ambiente, preocupam-se com o futuro do nosso planeta.

"Os partidos nacionalistas não cresceram aquilo que as sondagens diziam que iam crescer, mas aconteceu uma coisa muito clara: consolidaram-se"

Há ainda outro ponto: o enfraquecimento do PSD e da direita, porque não foi só o PSD, também foi o CDS. Isso é uma ótima porta de entrada para outros movimentos. O que é que o PSD está a fazer, no seu entender, de mal, como é que chega a este resultado e até que ponto este resultado não determina o seu futuro?
Não determina, acho que este resultado deixa claro que o PSD continua a ser o partido alternativo. O que o PSD não está a fazer é a verbalizar aquilo que tem de verbalizar e a condicionar a agenda do Dr. António Costa. O PSD tem de ir mais além, não basta dizer mal. Não basta dizer mal de manhã, à tarde e à noite e depois ser o campeão dos soundbites.

Sabe qual é a agenda de Rui Rio?
Não. Falta, de facto, concretizar essa agenda. Sempre que o PSD ganhou eleições em Portugal foi porque era o partido da mudança. O PSD é o partido das reformas, das grandes reformas deste país. O PS é o partido do statu quo, do andar para trás. Nós fomos sempre o partido das grandes reformas e, por isso, o PSD não faz grandes reformas estando na oposição, fá-las estando no poder. Para isso tem de ter uma agenda progressista, mobilizadora dos setores mais dinâmicos da sociedade, como fez no passado. O PSD tem de ir buscar os empresários, tem de ir buscar os ambientalistas, tem de ir buscar os agentes culturais, tem de ir buscar os agentes do setor social que no passado estiveram ao nosso lado a fazer esta transformação. O PSD tem de dizer sem dogmas onde é que quer estar e onde é que não quer estar, não pode estar neste limbo sem dizer onde é que quer estar e onde é que não quer estar. Isto não é ser liberal ou deixar de ser liberal, isto é dizer de uma forma muito clara, como o PSD soube dizer no passado, que a banca tem de ser privatizada; que os media tinham de ser privatizados - e privatizámos -; que tínhamos de ter televisões privadas, e criámos televisões privadas. Esse foi o PSD. O PS ajudou em revisões constitucionais sucessivas que permitiram essas mudanças, mas quem foi o motor dessa mudança foi o PSD.

Mas, embuste ou não, os eleitores parecem gostar daquilo que tem sido servido nos últimos quatro anos.
Claro, porque falta comunicar e ter esta agenda clara. Por último queria falar das respostas aos problemas das pessoas. Que problemas é que hoje sentimos? Há pouco falámos da mobilidade, e é um problema, mas e a habitação? As minhas filhas hoje terão muita dificuldade em comprar uma casa em Cascais, que é o meu município. Em Lisboa é praticamente impossível. Tem de haver políticas de habitação pública, claras. A Câmara de Paris tem mais de 25% do parque habitacional, em Lisboa não chega a 3% ou 4%. Políticas de família: andamos a dizer que envelhecemos e que o país envelheceu, e depois não temos políticas de família? Isto não é ser de direita ou ser de esquerda. Eu defendo há vários anos que tem de haver uma oferta pré-escolar pública, universal e gratuita do Estado. Tem de existir, porque as nossas mães e os nossos pais não conseguem ter os filhos na única oferta pré-escolar que existe e que ou é privada ou é das IPSS. Nós queremos dizer que queremos combater o envelhecimento e uma demografia com uma pirâmide que está a funcionar contranatura em termos de sustentabilidade da segurança social, e não temos políticas ativas de família para responder a isto?

Porque é que não acontece?
É um debate que tem de ser feito dentro do PSD, e é uma pergunta que tem de ser feita à atual direção. A forma de comunicar tem de mudar, a mensagem tem de ser muito mais clara, estas linhas de rumo têm de ser muito claras e muito objetivas, e não têm sido. Porque é que não acontece? Isso não me cabe a mim, que tenho estado de fora, mas ao fiel soldado disponível para fazer o combate. Essa questão tem de ser feita à atual direção do partido.

O que é que o resultado destas europeias, à luz de tudo o que dissemos até agora, lhe diz, a si, sobre o que vai acontecer nas legislativas?
Em primeiro lugar, estas europeias disseram uma coisa muito clara: já não há voto de clube no PSD, no CDS ou em qualquer partido em Portugal, esse voto acabou. Eu não voto porque sou do PSD, eu não voto porque sou do CDS, eu não voto porque sou do PS, isto ficou muito claro. 70% dos portugueses não estão interessados em ter uma palavra a dizer sobre o seu futuro, isso também ficou muito claro. E ficou muito claro que os partidos não apresentaram um programa objetivo e concreto para as eleições a que se propunham, que eram as eleições europeias, andámos a falar de tudo menos da Europa. O que é que temos a aprender para outubro? Não falemos de tudo que não interessa a quem vai votar, falemos daquilo que interessa a quem vai votar - temas que eu já trouxe aqui. Depois temos de ter a consciência clara e objetiva de que se não apresentarmos um programa mobilizador, os votos não aparecem de geração espontânea como apareciam no passado. Isso mesmo obriga a maior responsabilização dos políticos, a uma maior profissionalização da mensagem e da comunicação e a ter programas - desculpem-me eu continuar a insistir - objetivos e concretos que eu não vi nestas eleições em nenhum partido. Talvez a Iniciativa Liberal ou o PAN tivessem sido mais objetivos, pelo menos para os seus eleitorados. Todos os outros foram muito genéricos, não se falou da Europa, e isso no fim conta, e conta para os resultados que vimos.

Dito isso, Rui Rio tem condições para conduzir o PSD a uma vitória nas legislativas ou nesta altura, como disse há pouco, já não há alternativa a não ser manter o atual líder até lá?
Bom, eu sou muito claro sobre a manutenção do atual líder, não tenho outra posição que não esta: o Dr. Rui Rio tem de disputar eleições legislativas.

Por uma questão de princípio, não porque esteja satisfeito com a forma como o partido...
Não é uma questão de estar satisfeito ou não estar satisfeito. Cometeram-se erros, esses erros estão espelhados de uma forma muito clara neste resultado e, portanto, tem de se reorientar estratégias, se assim entenderem. Agora, o Dr. Rui Rio tem condições para ganhar as próximas legislativas, não vejo de outra forma.

Portanto, tal como David Justino disse na TSF há poucos dias, a esmagadora maioria do partido está com a liderança de Rui Rio até às eleições legislativas. É esse o seu caso?
Eu estarei com a atual direção do partido e com o PSD, o meu partido de sempre, disponível para lutar para ganhar as próximas eleições legislativas.

Mesmo que as sondagens - e a última da TSF - apontassem para a possibilidade de o PSD correr o risco de ter o seu pior resultado de sempre?
Mesmo assim. Eu tenho 25 anos de militância no partido, e muitas batalhas começámos com sondagens muito, muito negativas, muitas. Lembro-me em Lisboa, lembro-me várias do Dr. Passos Coelho, e depois ganhámos.

Rui Rio na Câmara do Porto...
Também. Nenhuma lhe dava a vitória, foi uma grande surpresa. Bem, nessas eleições houve várias, Sintra com Fernando Seara, o próprio Santana Lopes em Lisboa...

As sondagens mudaram um pouco desde aí, pelo menos têm estado mais fiáveis nos últimos tempos.
Acertam mais vezes.

Exatamente, mas há um partido que está bastante dividido... Como é que devem ser feitas estas listas?
Fui presidente de uma distrital durante seis anos, foi muito tempo. Desde o 25 de Abril fui o presidente de uma distrital que esteve mais tempo com esse cargo, e sempre defendi que devíamos ter clarificado desde sempre o papel das distritais e da nacional. O PSD tem sempre esse problema, o PS é muito claro nisso e o CDS também. O PSD sempre foi muito pouco claro nessa definição, tanto nas autárquicas como nas legislativas, sobre qual é o papel de quem. Lisboa, tipicamente, é o líder do partido que escolhe, a do Porto também, mas não está escrito, isto nunca foi explanado em letra escrita estatutária ou regulamentar. O mesmo se passa nas legislativas e, portanto, há sempre estes faits divers nesta altura, o perceber o que é que vai acontecer, se vai acontecer uma razia ou uma limpeza como a Dra. Manuela Ferreira Leite fez no passado.

Ou como Rui Rio promete fazer agora. Teme que ele aproveite esta oportunidade para fazer essa limpeza?
Eu não temo, porque também não tenho ambição absolutamente nenhuma, mas devo dizer que a minha ambição é que o PSD tenha o melhor resultado possível no próximo mês de outubro, mas para isso é preciso o toque a rebate, é preciso unir. O documento que foi aprovado em comissão política nacional é similar em tudo ao documento aprovado pelo Dr. Pedro Passos Coelho, eu diria até que na letra escrita é quase igual. Nada muda, o que muda é a forma de interpretar o que está escrito e a forma de exercer o poder e concretizar a elaboração das listas. Pelo calendário que foi aprovado penso que vai haver um processo de diálogo com as distritais, e isso é saudável e deixa-me esperança de que o processo seja participado.

Está disponível para integrar essas listas?
A coisa de que eu tenho mais orgulho de ter feito na política são estes 15 anos de autarca em Cascais. Foi onde eu nasci e é onde eu tenho deixado, do meu ponto de vista, obra feita. Mas eu faço a pergunta ao contrário, numa reflexão que eu tenho de fazer: é se eu posso, de alguma forma, aportar algum valor ao PSD nesta altura nessas funções ou aporto mais valor nas funções que desempenho? Nada me move particularmente para ter mais uma linha de currículo ou ter mais esta função ou aquela. Eu sou um homem e um político do fazer acontecer, do terreno, foi sempre uma opção de vida, eu podia ter sido outras coisas e sempre foi uma opção de vida ir a eleições, dar a cara na minha terra, e poder fazer acontecer e transformar a vida das pessoas.

Portanto, se o partido achar que o Miguel Pinto Luz é uma figura importante para, nestas eleições, voltar a fazer isso, está disponível?
Para ficar claro, eu gosto pouco daquela frase típica que os políticos dizem nestas alturas, que é: "Eu estou disponível para servir o meu partido naquilo em que o meu partido entenda que eu posso ser útil." Eu não disse isso, eu disse exatamente o contrário, disse: "O meu partido pode-me escolher, mas eu tenho de fazer uma reflexão interna pessoal sobre se eu posso aportar o valor que eu entendo que devo aportar nessas funções. Essas funções não servem só o partido, servem os portugueses que estão lá fora, e esses preocupam-me mais.

"Tenho um conjunto de ideias para o meu país que, na devida altura, quero muito apresentar aos militantes do meu partido e aos portugueses"

Isso significa que também pode vir a ser candidato à liderança se esse for o cenário que lhe pareça mais certo para o partido?
Seria completamente ao arrepio de tudo aquilo que disse se agora viesse introduzir esse tema aqui. Deixe-me dizer-lhe uma coisa para não fugir à questão: eu tenho um conjunto de ideias para o meu país que, na devida altura, quero muito apresentar aos militantes do meu partido e aos portugueses, mas esta não é a altura, esta é a altura da união, é a altura de não haver divisionismos, é a altura de juntar e de toque a rebate, repito.

Se daqui a uns meses o PSD perder as legislativas, será altura?
O PSD não vai perder as próximas legislativas.

Se perder por pouco, o líder mantém-se?
O PSD não vai perder por pouco as próximas legislativas.

Não são esses os sinais, nem das europeias das sondagens...
Mas eu sou um otimista militante e estarei no terreno a lutar para que assim seja.

Se o PSD perder as legislativas, acha que faz sentido Pedro Passos Coelho voltar, ainda faz falta à política portuguesa?
Eu acho que a história ainda se vai fazer em relação a Pedro Passos Coelho. Fruto desta governação socialista que, de facto, não deixa vir à tona a realidade do país, porque a ofusca artificialmente com o desinvestimento e com as cativações, a história ainda vai ser feita em relação ao Dr. Pedro Passos Coelho, de quem sou amigo e que acho que foi um primeiro-ministro que exerceu funções num tempo muito difícil, mas que mostrou uma enorme resiliência, um enorme sentido de Estado em todos os momentos. A diferença grande entre a dimensão dos líderes vê-se quando o Dr. Costa dizia que se ia embora se a questão dos professores passasse e o Dr. Pedro Passos Coelho dizia que não abandonava os portugueses mesmo quando foi o episódio do irrevogável. Portanto, são dimensões de estadista completamente diferentes, que só o tempo dirá e só o tempo fará a devida justiça ao Dr. Pedro Passos Coelho.

Isso quer dizer que ele só tem passado, não tem futuro?
Acho que ele tem naturalmente muito futuro e tem o futuro que ele entender ter na política, no PSD, no país ou fora do país. O que eu entendo é que o PSD tem de se abrir, tem de trazer gente nova, caras novas, não do ponto de vista geracional, etário, mas do ponto de vista do pensamento e da forma de estar na vida e na política, porque o mundo mudou e os partidos não perceberam que o mundo mudou e continuam a comunicar da mesma forma que comunicavam há 20 e há 30 anos.

De que forma é que a geringonça, a abertura do arco da governação à esquerda, pode afastar o PSD do poder durante bons e longos anos? Não é um risco que existe neste momento e que não existia antes da geringonça?
Eu penso que não. A geringonça veio trazer uma nova realidade em termos da arquitetura pós-eleitoral em legislativas, isso é objetivo. Agora, o PSD com Passos Coelho conseguiu com o CDS uma maioria, portanto não há geringonça se o PSD conseguir um projeto mobilizador de mudança, como Passos Coelho apresentou, um CDS também forte à direita e em conjunto uma maioria, que diabo, é igual a uma arquitetura de esquerda para governar. O que coloca é mais variáveis no sistema e perante uma liderança do PS que está disponível para fazer alianças à esquerda, à direita ou, agora com os liberais, na aliança progressista, então aí cria ainda muito mais variáveis porque não há espinha dorsal possível que se encontre neste PS. Agora, num Partido Socialista normal, eu penso que essas variáveis não são tantas e a arquitetura pós-eleitoral parlamentar é mais fácil de se fazer. Eu continuo a acreditar que é possível esse projeto mobilizador.

Pedro Santana Lopes tem vindo a defender aquilo a que chama uma grande frente de direita. Parece-lhe viável e sobretudo eficaz a criação de uma espécie de geringonça à direita?
Entendo que os políticos em Portugal aprendem pouco com os erros e acham que a resposta a resultados maus é juntarmos vários resultados maus e todos juntos vamos parecer um bocadinho menos maus. O PSD não ganhou eleições no passado a juntar e a agremiar mais siglas partidárias à volta de um projeto, não é assim que se ganha.

Mas para o PS, para o PCP e para o Bloco de Esquerda funcionou com resultados maus...
O PSD ganha se for buscar outra vez o discurso ambientalista e se for buscar os melhores ambientalistas para o seu seio; ganha se for buscar os melhores académicos, os melhores agentes culturais, os melhores atores no setor social. É assim que o PSD ganha, e depois, claro, as siglas vêm, os projetos vêm. Agora, artificialmente juntar siglas à procura de um resultado aritmético, sem um projeto mobilizador, sem um projeto de mudança, sem um projeto que concretize a transformação necessária na sociedade portuguesa? Eu penso que isso é redutor e não é esse o caminho que nos levará com certeza a derrotar esta geringonça.

Rui Rio não é esse projeto de que fala.
Eu percebo o vosso papel, mas o Dr. Rui Rio é o líder do PSD e eu acredito que o PSD é o partido alternativo, e ficou claro. O Dr. Rui Rio tem agora os tempos estatutários e regulamentares para apresentar um programa ao país, uma agenda mobilizadora, uma agenda de mudança; e depois perceber que tem de agregar e federar o PSD todo. Estive há dias nas Conferências do Estoril e estava a moderar um debate com o José Manuel Durão Barroso e o Zapatero, e este dizia uma coisa muito interessante: estes partidos históricos, com muita história e com muito tempo e muita experiência, sempre que estão unidos e têm um projeto mobilizador ganham eleições; sempre que estão divididos perdem eleições. Vemos o PP espanhol - o Vox nasce do PP espanhol e o Ciudadanos nasce do PP espanhol -, vemos o PSOE com as divisões, vemos o Partido Socialista francês que praticamente desapareceu, mas a quantidade de líderes e de protocandidatos à liderança do Partido Socialista francês era enorme e, portanto, dividiu-se, e era um partido histórico do socialismo europeu. Sou dado a concordar com Zapatero nesta afirmação, e esta afirmação só diz uma coisa: o PSD unido, federando e indo buscar à sociedade civil os melhores que sempre conseguiu trazer, com um projeto mobilizador, ganhará as próximas legislativas.

É possível que o PSD desapareça.
O PSD, o PS, o CDS, todos os partidos tradicionais. Parece que o PS está saudável... o PS, hoje, está longe de ter uma maioria absoluta, de ter resultados que já teve no passado. O PSD está muito longe de ter maiorias acima de 50% como teve o Cavaco. A tendência é clara, temos de abrir os olhos e perceber que temos de fazer alguma coisa. Temos exemplos por essa Europa fora, pelo que é bom que aprendamos com esses exemplos.

Portanto, Pedro Santana Lopes é bastante mais moderno do que todo o PSD?
Eu gosto pouco de comentar os outros partidos políticos, particularmente o partido político do Dr. Santana Lopes. Não tenho nada a comentar, não tenho nada a comentar sobre a sua liderança.

Gostava de ter a sua opinião sobre aquilo que acho que é o fenómeno mais preocupante destas últimas eleições, que são aqueles 70% para os quais os políticos parece que não falam. Nesta frente o que é possível mudar, o que está a falhar, como é que se pode alterar esta situação? Porque de repente podemos estar a falar de vitórias que valem efetivamente 10%, 11% ou 12% daquilo que são os portugueses como um todo.
A primeira coisa que temos de fazer é que não podemos discutir a abstenção só no dia das eleições à noite e, talvez, no dia a seguir, depois esquecemos a abstenção até às próximas eleições. Esta é a primeira coisa. Temos de dizer que é um problema e é um problema que nós temos de ver resolvido. Devemos debater a abstenção, como nós fizemos, e eu promovi esse debate com o Dr. Nuno Garoupa, com a Marina Costa Lobo e outros, e temos um documento que iremos apresentar em breve. Porque é fora dos momentos eleitorais que nós devemos discutir isso, de uma forma completamente desprendida, pôr o dedo na ferida, olhar para os números, que nos dizem muito, e perceber o que é que podemos fazer. Discutir o voto obrigatório, sim ou não; porque é que os portugueses não vão votar; os políticos cumprem com as agendas que se propõem e com os programas que apresentam ou depois fazem tábua rasa daquilo que se propõem, e isso mina a confiança dos políticos em relação aos seus eleitorados. Temos de perceber que esta enorme divisão que existe entre os eleitores e os eleitos tem de ser resolvida, temos de resolvê-la e, por isso, temos de começar a discuti-la no dia a seguir às eleições e continuar a discuti-la até às próximas eleições. Sem dogmas e sem preconceitos absolutamente nenhuns sobre temas como o voto obrigatório ou as dinâmicas de democracia participativa, que colocam a democracia muito mais próxima dos cidadãos e não só nos momentos eleitorais específicos. As autarquias têm sido pródigas nesse desenvolvimento das democracias participativas.

"Um partido frentista como o PSD que junta os melhores, do empresário, do dono da mercearia, do funcionário público"

Do seu conhecimento - esteve dentro da máquina partidária -, um partido é uma bolha?
Não tenho essa perceção, um partido como o PSD é muito o reflexo da sociedade e de direções que não percebem que têm essa massa crítica, essa matéria-prima disponível, não percebem o manancial de potencial que existe num partido como o PSD, um partido frentista como o PSD que junta os melhores, do empresário, do dono da mercearia, do funcionário público... Tudo junto, tem ali o espelho da sociedade, estão lá todos. Eu tenho o mesmo ADN que vocês, eu sou de carne e osso como todos os outros e o PSD tem essa gente de carne e osso, tem o país real. Agora, tem de ouvi-lo, tem de utilizá-lo.

O PSD de Rui Rio não o tem aproveitado?
O PSD de Rui Rio vai aproveitar, estou confiante, até às próximas eleições legislativas para as ganhar.

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