"É precoce estar a prever-se a possibilidade de casamento fácil entre o PS e o PAN"

André Silva. No Parlamento português é o rosto do partido que surpreendeu nas europeias. Ao DN antecipa o objetivo de formar uma bancada, recusando antecipar a pangonça. Falta o PS ganhar e o PAN eleger deputados.
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Foram dias a viver "a três mil à hora", confidencia André Silva ao DN a meio da semana. A conversa não se fará nesse dia - está "exausto", diz o deputado único do partido Pessoas-Animais-Natureza, o rosto de quatro anos de trabalho no Parlamento que também deu frutos nas eleições europeias. O PAN elegeu um deputado para Bruxelas, Francisco Guerreiro, e André Silva explica em entrevista a responsabilidade (uma palavra que repetirá várias vezes) que tem perante o seu eleitorado.

O que é que o PAN vai fazer deste resultado?
Vamos continuar a trabalhar da mesma forma. Há uma confirmação de que a ecologia política é uma força política autónoma e deixou de ser um satélite. Vamos pedir aos portugueses aquilo que temos pedido nos últimos três anos e meio: que continuem a confiar em nós, que nos deem mais responsabilidade para termos um grupo parlamentar em outubro.

Extrapolar os resultados das europeias não é possível...
Não, e é perigoso fazer essa extrapolação. Melhor: é impreciso. Uma coisa são autárquicas, outra são europeias e legislativas. São momentos diferentes, com taxas de participação completamente diferentes. Acho que não devemos fazer qualquer tipo de extrapolação, nem da relação das forças políticas. Relativamente à eleição de 6 de outubro de 2019, o PAN ainda não elegeu nenhum deputado. Fará por isso. E está a trabalhar num programa eleitoral.

Falou na constituição de um grupo parlamentar. Quais os objetivos definidos?
Nós sempre tivemos como objetivo [a constituição do] grupo parlamentar, que tem no mínimo dois deputados. E sempre apontámos para o crescimento do partido. Mas honestamente, nem eu nem o partido temos um número pensado, nem um limite nem um máximo. Bem, há um mínimo...

Os dois deputados.
Os dois. Não temos um máximo pensado. Teremos listas em todos os círculos eleitorais e tentaremos marcar presença ativa junto das pessoas, fazendo campanha em todos os distritos e todos os círculos.

Elegendo para além de Lisboa.
Sim. É evidente que a perspetiva de eleger no Porto é diferente de eleger em Portalegre. Nós queremos eleger, e esse é claramente um objetivo, no distrito do Porto e fazer uma boa campanha nos distritos de Setúbal, Aveiro, Faro, mas mais concretamente no Porto é um objetivo. Queremos eleger um deputado no Porto.

O líder do PS e primeiro-ministro parece estar a namorar o PAN. Até que ponto é que o PAN está disponível para esse namoro?
Sim, já se percebeu que o PS está a namorar o PAN, aliás nunca antagonizou o PAN, na medida em que foi acolhendo algumas das nossas propostas ao longo dos últimos anos, por reconhecer no PAN uma mais-valia para fazer avançar algumas causas para o país e melhorar o Orçamento do Estado. Repito aquilo que disse desde o dia 5 de outubro de 2015: nós estamos disponíveis, como sempre estivemos, para nos sentarmos - nada mais! - para negociar soluções legislativas, como fizemos com vários partidos ao longo da legislatura, como resultado das eleições e da representação parlamentar e das forças que a compõem uma eventual solução governativa.

Acho que é precoce estarmos a dizer que o PAN irá apoiar uma solução governativa do PS. O PS não ganhou as eleições, não sabemos se vai ganhar as eleições - claro que as projeções assim o indicam -, o PAN não elegeu nenhum deputado e nós não conhecemos o programa eleitoral do PS. Também o programa eleitoral do PAN não está elaborado e são de facto dois partidos completamente distintos, com agendas completamente diferentes e é precoce estar-se a prever a possibilidade de um casamento fácil entre o PS e o PAN, quando há diferenças enormes entre os dois partidos.

Em 2015, António Costa foi à sede do PAN reunir-se convosco e discutir propostas, mas não assinaram nenhuma em conjunto. Até que ponto o PAN considera formalizar um acordo com o PS?
Tendo em conta os considerandos que apontei e que o PAN é um partido construtivo, que tem vontade de fazer avançar as [suas] causas, não pode irresponsavelmente perante os seus eleitores, após as eleições, não fazer nada com o resultado, se for um resultado significativo e que conta. O PAN pode contar para apoiar uma solução de um ou dois partidos, não sabemos. E não deve irresponsavelmente acantonar-se e estar dezenas e dezenas de anos a fazer oposição até ter uma maioria para formar governo. Sem contrariar os seus valores e as suas causas, sem pisar nenhuma linha vermelha, o PAN deve aceitar no mínimo sentar-se e fazer uma negociação. Mais do que isto, neste momento, é fazer futurologia.

O PAN absteve-se no primeiro orçamento do PS e votou a favor nos outros. Pode garantir pelo menos que, perante um determinado tipo de propostas, o PAN pode votar ao lado de um eventual governo socialista?
Sem contar rigorosamente nada para a solução governativa, sem fazer parte da solução porque o PS e os partidos de esquerda não necessitaram do PAN para formar uma solução estável, tínhamos duas opções - e é esta prestação de contas que fizemos aos eleitores e eles entenderam muito bem: fazer o tradicional papel de oposição e de guerrilha, de marcarmos acerrimamente as nossas diferenças e de pedir mais força e estarmos aqui 40 anos à espera de termos 116 deputados e formarmos um governo do PAN; a outra opção foi a de, construtivamente, durante quatro anos, tentar aprovar algumas medidas junto do partido que estava no governo.

Independentemente do resultado, e isto é que é importante, e do PAN ser necessário ou não contar para uma solução governativa, a nossa postura vai ser igual: o PAN terá sempre uma postura construtiva de melhorar orçamentos do Estado, fazer avançar propostas, assim o queiram evidentemente.

Teme um maior escrutínio à vida do partido?
Não temo nada. Acho que é muito positivo o PAN ser mais escrutinado. Aliás, já devia ter sido há mais tempo. Isso significa que teremos uma divisão do espaço mediático, mais justa e equitativa. Por exemplo: em várias dezenas de debates quinzenais, nestes quatro anos, contam-se pelos dedos das mãos as vezes que o PAN foi referido por 30 segundos nos telejornais. É positivo que exista esse escrutínio. Vai permitir-nos passar mais as nossas mensagens e esclarecermos outras que estão menos claras.

Há quem acuse o partido de ser mais "animalista" e menos ecologista. Como responde a isso?
Com trabalho feito. Há uma grande preocupação de comentadores que ocupam determinados campos políticos, bastante desconfortáveis com o crescimento do PAN. O que se tem verificado nos últimos dias é, genericamente, na maioria do casos, uma leitura correta, sensata, com críticas ao PAN. E depois temos visto alguns comentadores a tentar descredibilizar o projeto do PAN, tudo aquilo que temos vindo a fazer, muitas vezes com deturpações. Ou seja, continuam sem levar o PAN a sério. Fazem análises demasiado simplistas a mais de 350 propostas que o PAN fez e elaborou neste período, a quase quatro dezenas de iniciativas que conseguimos aprovar e dezenas de propostas no Orçamento, em variadíssimas áreas, a maioria delas em áreas sociais, contra vários tipos de discriminação e violência, seguido de propostas ambientalistas e uma pequena parte, uma reduzida parte, de propostas na área da causa animal.

Como é que vão traduzir esse programa na Europa, integrados nos Verdes europeus?
Há quatro anos foi a primeira vez que um grupo de cidadãos, que não tinha experiência político-partidária, que não vinha de outros partidos, entrou no Parlamento, foi tudo uma novidade, com diversos desafios e dificuldades de adaptação. Fizemos o nosso trabalho...

Na Europa, é a mesma coisa. Entramos num parlamento que tem três vezes e qualquer coisa mais de deputados, tem uma complexidade muito maior, temos menos tempo dentro de uma família já constituída, que cresceu - dos 6% para os 9%, o nosso grupo parlamentar, a nossa família. Temos sensibilidades comuns com a nossa família, vamos tentar integrar algumas comissões-chave, para fazermos o nosso trabalho, para levarmos as nossas causas. É um desafio enorme: os socialistas, quer o PPE, os dois juntos não têm 376 deputados para formar maioria, mas com os Verdes têm. Vamos ver se se inclinam mais para o ALDE, os liberais, o que não anuncia nada de bom, porque é a narrativa do crescimento económico, tantas vezes a qualquer custo dos direitos laborais, sociais e ambientais, ou se conseguimos fazer valer as nossas posições, equilibrar um bocadinho...

Uma pangonça europeia?
Exato [risos]. Isso será positivo, é um grande desafio. Consideramos também - e é mais arrojado - que a influência que os Verdes possam ter na União Europeia a reforçar direitos laborais, direitos sociais e a elevar o standard e os padrões ambientais... E mais do que isso, e é aqui que está o arrojo, o facto de a União Europeia ser um bloco económico importantíssimo e ter que lidar economicamente com outros blocos geoestratégicos: o esforço é tentarmos sermos líderes em determinadas matérias, como direitos humanos e proteção ambiental. No fundo, forçar, levar a que esses blocos evoluam também nas suas sociedades, na forma de estar, de lidar com os outros.

Já percebi que não lhe faz muita comichão a palavra pangonça?!
Não, nem pangonça nem geringonça... [risos]. Acho que está a dar-se como adquirido um cenário que não existe, que é prematuro, porque o PS não ganhou as eleições, o PAN não elegeu nenhum deputado e não significa que o PAN e o PS consigam chegar a algum acordo. São partidos completamente diferentes, têm agendas completamente diferentes, e em matérias de agricultura têm posições completamente distintas... Acho que é importante clarificar que ninguém ganhou eleições, há uma predisposição como sempre houve para o PAN dialogar com todos os partidos, mas é precoce falar-se de uma pangonça porque para que isso exista, para além dos pressupostos todos que já falámos, é preciso que o PAN queira casar com o PS, o que de facto está longe de acontecer.

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