Burocracias, dúvidas, pedidos de esclarecimento e nenhuma adesão. Este é o quadro que retrata as primeiras semanas da “via verde” para a imigração. Um mês depois de ter entrado em vigor, o Protocolo de Cooperação para a Migração Laboral Regulada, que visa agilizar a contratação de cidadãos estrangeiros com contrato de trabalho no país acelerando o processo de emissão de vistos no prazo de 20 dias, não foi dado nenhum passo para formalização de pedidos. Para já, as empresas têm recorrido às confederações para esclarecer dúvidas e avaliar as responsabilidades exigidas no acordo assinado em abril entre o Governo e os representantes dos patrões. A obrigatoriedade de garantir “alojamento adequado” aos trabalhadores que chegarem a Portugal neste âmbito assumiu-se como o epicentro da divergência no período negocial entre a tutela liderada por Leitão Amaro e os representantes das organizações e ameaça agora ser um entrave à viabilidade deste memorando. “É uma das grandes interrogações. O grosso das empresas que representamos e que recorrem ao trabalho de imigrantes são de pequena e média dimensão, à exceção do setor dos transportes. São situações um bocado complexas, a habitação é um problema complicado para toda a gente. Como é que estes empresários podem assumir a responsabilidade desta norma?”, questiona ao DN João Vieira Lopes. O presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) valida “o esforço do Governo” no sentido de dar uma resposta à falta de mão de obra nos vários setores de atividade após o fim do regime das manifestações de interesse no ano passado, mas antecipa que “será muito difícil” garantir casa.Além de terem de se responsabilizar pelo alojamento, os empregadores devem ainda assegurar contrato de trabalho e formação. À CCP chegaram, nas últimas semanas,”bastantes” pedidos de esclarecimento de “empresas, associações e até juristas e advogados” mas, até agora, nada avançou. Ainda assim, João Vieira Lopes ressalva ser precipitada uma revisão do acordo junto do próximo Executivo. “Neste momento convém esperar alguns meses antes de começar já a mexer em coisas que ainda nem sequer estão concretizadas, isso iria criar uma grande instabilidade. O acordo fez-se com estas interrogações e temos de esperar, pelo menos, até ao fim do ano para ver como é que isto irá evoluir. Depois, sim, podemos refletir e ver as alteraçõesque serão necessárias introduzir”, assinala.Ao DN, uma fonte que não quis ser identificada confirma que a adesão tem sido de praticamente “zero” pela incapacidade de garantir um teto a estes trabalhadores. A exigência tem afastado os potenciais interessados, assegura. Do lado da Confederação do Turismo de Portugal (CTP) o cenário não difere. “Não existe ainda nenhuma empresa que tenha efetuado um pedido. Temos apenas recebido alguns contactos com questões”, aponta Francisco Calheiros. O líder dos patrões do turismo explica que o protocolo prevê “algumas especificidades em termos muito amplos que dificultam o entendimento acerca da concretização e alcance de alguns dos requisitos”. “Na fase de negociação chamámos a atenção para essa dificuldade e para os constrangimentos que a mesma acarretaria”, relembra. Durante o mês de abril foram realizadas reuniões técnicas semanais entre as confederações patronais, entidades públicas e a tutela no sentido de se “ultrapassarem os vários obstáculos”apresentados de modo a “definir um fluxo processual uniformizado”,revela. “Neste momento permanecem algumas dúvidas sobre as quais aguardamos respostas”, adianta ainda Francisco Calheiros. O DN pediu à Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) dados sobre o número de pedidos efetuados neste primeiro mês, mas o instituto público direcionou a responsabilidade deste balanço para o Governo. Do lado do Executivo não foram prestados esclarecimentos até ao fecho desta edição. .CIP espera que trabalhadores comecem a chegar em julho.Na Confederação Empresarial de Portugal (CIP) os primeiros 30 dias de vigência do protocolo para a migração laboral também se fizeram de burocracias. “Neste momento, não sei dizer se já algum processo passou para a fase de instrução”, admite Armindo Monteiro. O presidente da CIP mostra-se mais otimista face aps seus pares e espera que dentro de dois meses comecem a chegar os primeiros trabalhadores estrangeiros ao país. “Estamos ainda numa fase inicial e é normal que estes processos tomem o seu tempo.Creio que no fim do trimestre as coisas já devem estar a funcionar”, perspetiva. Armindo Monteiro afirma ser extemporâneo avançar com qualquer tipo de análise e reitera que só em julho deverá ser possível “ter alguma massa crítica para fazer um ponto de situação”. .Bernardo Trindade: “Responsabilizar as empresas pela habitação é condenar a via verde para a imigração”