Donald Trump, Presidente dos Estados Unidos da América.
Donald Trump, Presidente dos Estados Unidos da América.EPA / YURI GRIPAS

UE pode retaliar contra Trump com tarifas sobre soja, bourbon, motas, sumo de laranja, medicamentos, big techs

EUA dependem da União Europeia (UE) em 32 produtos estratégicos, principalmente nos setores químico e farmacêutico. Europa pode usar isso como trunfo. Barrar mais as big tech pode ser outra opção.
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A escalada da guerra comercial continua imparável: o governo dos Estados Unidos da América (EUA), liderado por Donald Trump, avançou com as primeiras grandes barreiras ao comércio internacional.

No caso em concreto, tarifas transversais de 25% às exportações de aço e alumínio, que assim incidirão sobre todos os fornecedores dos EUA nestas duas importantes matérias-primas, que atingirão em cheio países como Canadá, México e China.

A Europa também pode sofrer com isso, e noutros mercados, pois compra muito aos EUA, é o seu maior parceiro comercial.

Como forma de resposta, vários analistas consultados dizem que terá de haver maiores barreiras à importação de motores e máquinas e carros dos EUA (um mercado valioso para os americanos, cerca de 25 mil milhões de euros anuais), de produtos farmacêuticos (mais de 30 mil milhões de euros), mas também em segmentos onde a retaliação pode ser mais eficaz (“dólar por dólar”), como é o caso dos mercados de soja, bourbon, motas, sumo de laranja, apontam economistas.

Por onde irá agora, o governo Trump?

O presidente dos EUA já disse várias vezes que a ideia é subir tarifas contra a Europa numa lógica de “reciprocidade”, de forma a alinhar os valores cobrados à Europa com os que já são impostos aos EUA, argumenta. É a lógica do “olho por olho, dente por dente”.

Por exemplo, além do tratamento relativamente favorável no aço e alumínio (que está prestes a expirar para todos os fornecedores dos EUA), a Europa tem vários mercados onde a fúria de Trump pode doer.

Europa é mais do que um importante fornecedor de aço e alumínio

De acordo com o Eurostat, a principal exportação da União Europeia para os EUA são “produtos farmacêuticos”, superando 55 mil milhões de euros por ano.

Portugal contribui bem para esta exposição ou vulnerabilidade. Por ano (2024 é a nova referência), Portugal está a vender mais de 5,3 mil milhões de euros para os Estados Unidos, sendo que os grandes mercados são, por esta ordem: medicamentos e preparações farmacêuticas (1,2 mil milhões de euros); produtos petrolíferos refinados (mil milhões de euros); borrachas e plásticos; produtos metálicos (como aço e alumínio, no valor de 418 milhões de euros); têxteis e vestuário (465 milhões de euros).

A nível europeu, o segundo posto no ranking dos maiores mercados exportadores, com vendas superiores a 40 mil milhões de euros para os Estados Unidos, pertence ao setor automóvel, onde cresce a inquietação sobre o futuro próximo. Na Alemanha, o stress é enorme, como conta um economista do Ifo, de Munique.

“O furacão Trump continua”, observa Inga Fechner, economista do grupo financeiro ING.

“Desde as tarifas intermitentes sobre México e Canadá até ao mais recente e último anúncio de tarifas gerais de importação sobre aço e alumínio”, chegámos ao ponto em que “a Europa é diretamente afectada por uma decisão da Administração norte-americana”.

Segundo a mesma analista, que é especialista em Economia Internacional, “as tarifas dos EUA sobre o aço e o alumínio no valor de 25% prejudicarão os fabricantes europeus, que exportam cerca de 3 mil milhões de euros em aço e 2 mil milhões de euros em alumínio, afetando aproximadamente 1% do total das exportações de bens para os EUA”.

“Mas não é aqui que isto vai parar”, avisa.

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Como pode retaliar a Europa

“A ameaça iminente de tarifas generalizadas sobre a UE e a anunciada reciprocidade comercial tornam mais premente a questão de como a UE poderá e irá reagir.” Para a economista do ING, a Europa vai ter de estudar a imposição de tarifas sobre produtos “como soja, bourbon, motociclos ou sumo de laranja”.

Recorde-se que em junho de 2018, a UE respondeu às tarifas dos EUA sobre o aço e o alumínio “com contramedidas de retaliação imediatas na faixa dos 10-25%.”

No entanto, sob na Administração do ex-presidente Joe Biden “estas tarifas foram suspensas até 31 de março de 2025, o que significa que a União Europeia pode simplesmente restabelecer estas tarifas de retaliação sobre as exportações dos EUA, de forma rápida”.

Além disso, repara a economista, “os EUA dependem da UE em 32 produtos de importação estrategicamente importantes, principalmente nos setores químico e farmacêutico” e “pode utilizar isto como uma forma de alavancagem nas negociações comerciais, estando ciente de que os EUA podem fazer o mesmo”.

Outro campo de batalha pode ser “a retaliação com um imposto sobre os serviços digitais”, um mercado “liderado pelas principais empresas tecnológicas americanas”.

Na Alemanha, o maior exportador e a maior economia da Europa, agora em crise profunda, estagnada depois de uma recessão, a inquietação é crescente.

“As ameaças de Trump de impor tarifas sobre as importações dos EUA da UE num futuro próximo, a forte concorrência da China e as tensões internas estão a colocar uma pressão considerável sobre a indústria automóvel alemã”, afirma Anita Wölfl, especialista do setor do instituto de estudos económicos Ifo, sediado em Munique.

“O sentimento no setor automóvel na Alemanha atingiu um novo mínimo no início deste ano” e podemos afirmar que “a indústria automóvel está presa na crise” e “vê a sua posição competitiva em perigo sério alerta Wölfl.

Jason Graffam, analista da Morningstar DBRS, uma das quatro principais agências de ratings, refere que “as tarifas dos EUA aplicadas à UE terão um efeito adverso nas perspetivas de crescimento da própria UE e, se a perturbação for grave e prolongada, as consequências podem inclusive afetar negativamente algumas classificações de crédito soberano [ratings] na Europa”.

“Dito isto, pensamos também que uma guerra comercial entre os EUA e a UE pode, em última análise, resultar num maior apoio e integração a nível da UE, mas isso provavelmente levará tempo a ser implementado.”

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