Thomas Hegel Gunther: “Portugal tem de ser mais competitivo para compensar desvantagem geográfica"
A dois anos de lançar o novo modelo elétrico da VW, made in Portugal, o diretor-geral da Volkswagen Autoeuropa, Thomas Hegel Gunther, considera que a receita do país e da Europa para recuperar a competitividade perdida para o Oriente “tem de ser o aumento da produtividade”.
No caso português, em particular, Thomas Hegel Gunther lembrou que, apesar de o país ter bons trabalhadores e engenheiros muito competentes no setor, continua a ter uma desvantagem geográfica. “Portugal tem uma certa desvantagem em termos logísticos, na medida em que os principais mercados estão no norte e no centro da Europa”. Por essa razão, o gestor defende que “Portugal tem de apostar em ser ainda mais competitivo do que outras regiões, para compensar essa fragilidade”, disse numa entrevista no âmbito do Portugal Mobi Summit. Em causa podem estar fatores de produção como o custo do trabalho ou o da energia. Thomas Hegel Gunther defende, também por isso, a importância da manutenção do investimento da Volkswagen e do emprego em solo nacional.
Num português fluente, o gestor alemão considera ainda que Portugal pode desempenhar um papel importante para ajudar a União Europeia a ter uma política mais forte no apoio ao setor. “Não estou a falar apenas de apoio às grandes empresas, mas também às pequenas empresas, que acabam por, no seu conjunto, empregar muita gente”. E isso é uma realidade bem visível na quantidade de empresas de componentes e outros serviços que se formaram em torno da Autoeuropa, em Palmela, no distrito de Setúbal. Thomas Hegel Gunther lembrou que a indústria automóvel europeia emprega cerca de 14 milhões de pessoas e é importante ter políticas que contribuam para manter esses empregos.
Ao escolher a fábrica de Palmela para lançar o seu novo modelo ID. every1 elétrico, a VW está a dar um contributo para a manutenção desses empregos e de toda uma cadeia de produção no cluster automóvel nacional. O carro deverá estar pronto no final de 2027 e terá um preço de entrada em torno dos 20 mil euros, adiantou o executivo.
Será o contributo da marca para a democratização do acesso à mobilidade elétrica. É certo que ainda não está abaixo dos 20 mil euros, mas “importa dizer que o desenvolvimento dos carros nos últimos tempos tem sido espetacular ao nível da segurança ativa e passiva, da qualidade, da conetividade e, sempre a baixar as emissões, seja elétrico ou a combustão, pelo que o seu valor também é maior”.
Maior transformação de sempre
Olhando para os desafios com que se confronta o setor, o diretor geral da Autoeuropa observou que a indústria europeia está a viver a sua maior transformação de sempre: ao mesmo tempo que avança na era digital e na conectividade também tem de cumprir as metas de redução das emissões dos gases com efeito de estufa e enfrentar uma concorrência que não existia e que chega da Ásia, nomeadamente da China. “São grandes desafios, é uma fase interessante, mas que exige grandes investimentos”.
E, como se não bastassem as dificuldades, as tendências nem sempre são lineares, porque, se é verdade que a aposta é na eletrificação, a indústria e a VW têm de satisfazer diversos mercados, com necessidades diferentes, e, por isso, continuar a fabricar veículos híbridos e também ainda motores a combustão.
A seu desfavor, a indústria europeia tem custos de mão-de-obra e de energia mais altos e ainda um quadro regulatório e burocrático pesado, que “dificulta o trabalho, particularmente, às empresas médias e de pequena dimensão”, disse na entrevista. No último ano, somaram-se ainda as ações protecionistas e guerras tarifárias, assinalou.
Uma das limitações do espaço europeu face a outras geografias é, por exemplo, o excesso de regulação que proíbe a existência de zonas de testes para veículos autónomos. “Acho que esse é um bom exemplo de como apenas do ponto de vista regulatório, a Europa está em desvantagem em relação a outras zonas do mundo”. O mesmo acontece com as possibilidades de explorar o potencial da Inteligência Artificial, considerou.
Sobre os imperativos ambientais, Thomas Hegel Gunther disse que a Volkswagen encara a descarbonização como uma meta transversal. “Não são apenas os carros que estão mais limpos, mas todo o processo de fabrico e a logística associada. Estamos a investir mais de 200 milhões de euros na descarbonização”. É, por exemplo, o caso de um novo sistema de pintura que vai permitir reduzir as emissões em 90%, adiantou o responsável em entrevista a Paulo Tavares, curador do Portugal Mobi Summit.