Rodrigo Maluff: “O Paraguai pode vir a ser um tigre económico”
Quais são os atrativos económicos de um país como o Paraguai, sem mar, situado entre os gigantes Brasil e Argentina, e também com a Bolívia como vizinha a norte? Se alguém quiser investir ou fazer comércio no Paraguai, como se ultrapassa esta dificuldade de ser um país encravado?
Se observar a região, verá que tanto a Bolívia como estados centrais do Brasil estão ainda mais distantes do mar do que o Paraguai, e não têm a vantagem da hidrovia Paraguai-Paraná. Esta hidrovia compreende mais de 1700 quilómetros de rios navegáveis. Hoje, o Paraguai tem a terceira maior frota de barcaças fluviais do mundo. Movimentamos quase 24 milhões de toneladas de produtos, e este é o mecanismo concorrencial através do qual o Paraguai recebe importações. Por exemplo, não somos produtores de combustíveis fósseis, pelo que importamos qualquer coisa como 2,5 mil milhões de dólares em combustível. E também exportamos assim a produção agrícola do Paraguai, que foi e continua a ser a força vital da economia nacional. É uma via navegável essencial, que pode e tem de ser melhorada para movimentar mais mercadorias, com uma integração desde Corumbá, na fronteira entre o Brasil e a Bolívia, até à foz do Rio da Prata.
Então se esta localização não é um problema, a proximidade com a Argentina e o Brasil é uma oportunidade, já que são ambas grandes economias?
Estamos no meio de um mercado de 300 milhões de pessoas. Assunção fica a uma hora e meia, duas horas e quinze minutos de distância de todas as capitais regionais por via aérea, criando um hub de conectividade. Estão até a surgir reuniões de negócios na nossa capital, como esta semana o Congresso Mundial da FIFA. Hoje temos um sistema de maquila onde os industriais brasileiros e argentinos estão a utilizar o Paraguai como plataforma de produção para entrar nesses mesmos países com custos mais baixos. É preciso dizer que o Mercosul, graças aos acordos que temos com os países vizinhos, tem sido benéfico para nós. Temos incentivos realmente disponíveis para ajudar o Paraguai a industrializar-se. Hoje, os nossos vizinhos estão num nível de industrialização superior ao nosso, pelo que nos estão a permitir incentivos que facilitam o investimento na indústria no Paraguai.
O Paraguai destaca-se também por ser o maior país a ter relações diplomáticas com Taiwan e não com a China. Quando olhamos para os países da América Latina, a China é um parceiro comercial incontornável. Como funciona a relação económica com a China? O Paraguai importa indiretamente, mas não exporta?
Assim é. O Paraguai tem um défice com a China. Importamos 3,5 mil milhões de dólares da China e enviamos quase nada ou muito pouco diretamente. Mas essa é a situação geral da nossa relação com toda a Ásia Oriental. Não temos sido muito fortes nas nossas ligações comerciais com a Ásia, mas esta relação diplomática com Taiwan permite-nos agora ter uma relação comercial muito ativa com pelo menos um país da região. Com Taiwan estamos apenas a começar. Queremos aumentar as entregas dos principais produtos paraguaios: carne de bovino e hoje carne de porco. Estamos a caminho de abrir igualmente o mercado do frango.
Portanto, Taiwan é um parceiro económico importante, não apenas um parceiro político.
Hoje em dia, é um importante parceiro económico. Estes produtos são produzidos por paraguaios e estão entre as cinco principais importações em quase todas estas áreas, além de serem uma porta de entrada para a Ásia. Além disso, dada a estrutura e a plataforma económica do país, onde temos energia disponível hoje a um preço razoável, sendo a rede elétrica paraguaia 100% baseada nas renováveis, isto também se tornou interessante para Taiwan, principalmente dada a experiência mundial com situações complicadas como a covid e situações tarifárias como a que estamos a ver agora com os Estados Unidos. Isto encorajou-os a montar o seu primeiro parque industrial no Paraguai, para onde estamos a começar a trazer indústrias taiwanesas. O atual governo paraguaio está a concentrar-se em transformar esta relação, que antes era mais de cooperação diplomática, numa que integre no Paraguai a cadeia de produção de Taiwan na região.
Em termos de relações económicas com Portugal, a carne de bovino paraguaia é bem reputada por cá. Que outros produtos paraguaios pretende vender para Portugal e que relações comerciais e de investimento existem?
Há um baixo nível de investimento português no Paraguai. São cerca de 20 milhões de dólares, o que é pouco, dentro dos 8 mil milhões de dólares de investimento direto estrangeiro. E o comércio também não tem sido muito fluido até agora. Mas há todo um potencial que vemos em Portugal para o Paraguai. Toda a vossa expertise em geração de energia renovável é muito valiosa para o Paraguai. Por volta de 2030 ou 2031, chegaremos a um estrangulamento na geração de energia. Daí em diante, e até 2040, teremos de investir fortemente na geração de energia, e queremos que seja renovável para manter este selo nacional, que é o de que tudo o que é produzido no Paraguai sai com o selo de 100% de energia renovável. Há um espaço importante para a integração entre os nossos países. Por outro lado, várias empresas de construção portuguesas já participaram em concursos de obras. Estão muito ativas na tentativa de chegar ao mercado paraguaio. A tecnologia do nosso orgulho nacional, a nova ponte construída sobre o rio Paraguai, é uma tecnologia 100% portuguesa, e para nós foi mágico ver uma ponte a crescer em dois lados, ligada depois ao meio sem um centímetro de desvio.
Como se chama a empresa portuguesa que fez essa ponte?
É a ConstruGomes.
Quanto deve crescer a economia?
Somos um exemplo de macroestabilidade na região há quase 25 anos. Os números falam por si, mas o mais gratificante é saber que atingimos no ano passado o grau de investimento. Este grau de investimento é o caminho procurado com esta disciplina orçamental e macroeconómica. Neste trampolim de estabilidade, acreditamos que se avançarmos com os setores que já referi, também a soja, o arroz e a carne processada, mais uma combinação de novos setores para a economia nacional, como o setor florestal e o setor dos biocombustíveis, e queremos também fazer alguma produção de alumínio ou polipropileno, temos a base para isso. E também queremos incluir os combustíveis do futuro dentro desse crescimento. Acreditamos que no Paraguai temos a base para que o mundo veja surgir um novo tigre económico. Quanto à perspetiva de crescimento, hoje está entre os 3,5 e os 4% anuais. Ao implementar corretamente estes novos setores, fazendo bem o trabalho, este governo pode aumentar a taxa de crescimento para 7%, esperançosamente 10%. É por isso que tentamos mostrar ao mundo que, com base nesta estabilidade, o Paraguai pode vir a ser um tigre económico. O último, penso eu, depois dos países asiáticos, foi a Irlanda, e o Paraguai tem esse potencial. Acredito que podemos duplicar a economia nacional na próxima década.