O peso da dívida pública em proporção do Produto Interno Bruto (PIB) caiu no ano passado, mas só porque o valor nominal da economia portuguesa aumentou mais do que o valor global do endividamento público. Aliás, este aumento no valor nominal da dívida é um fenómeno recente que acaba de regressar.Segundo o Banco de Portugal (BdP), a instituição responsável pelo apuramento oficial da dívida, a dívida subiu por causa dos empréstimos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) que o país recebeu no ano passado e ainda devido a um aumento no valor (stock) dos certificados de aforro, isto é, uma das formas de dívida interna (os credores do Estado são as famílias, no caso).Assim, mostra o BdP, depois de quase um ano e meio de alívio, a dívida pública total voltou a subir em termos homólogos, tendo avançado 3,4% em 2024, naquele que é um dos maiores aumentos dos últimos dez anos.Como referido, o rácio da dívida desceu de 97,9% do PIB em 2023 para 95,3% em 2024, revelou o banco central governado por Mário Centeno. O valor final do ano passado fica ligeiramente abaixo da estimativa mais recente do Ministério das Finanças, de Joaquim Miranda Sarmento, que estava a apontar para um rácio de 95,9% do PIB.No entanto, de acordo com um levantamento feito pelo DN, aquela descida de 2,6 pontos percentuais do PIB ao longo de 2024 acaba por ser a mais fraca desde 2015 (ano em que caiu o equivalente e 1,5% do PIB). Em 2021, o peso da dívida cedeu 10,2 pontos do PIB, no ano seguinte emagreceu 12,7 pontos e em 2023 baixou mais 13,3 pontos do PIB.Esta forte descida do peso da dívida nos últimos quatro anos ascende a mais de 26 pontos percentuais do PIB, um movimento sempre precedentes e único na História recente do país. Portugal, que durante vários anos (no tempo do programa de austeridade e depois na pandemia) chegou a ter um rácio de dívida acima de 130% do PIB, continua a ter um dos valores mais elevados da Europa, embora as descidas muito significativas dos últimos anos tenham levado o País a receber inúmeros elogios e contribuído para a subida da nota do crédito público (ratings).Fim da tendência de descida na dívida nominal?Seja como for, o endividamento total das administrações públicas, que entre maio de 2023 e setembro de 2024 esteve em efetiva contração, começou a acelerar novamente desde outubro último.O Banco de Portugal refere que no final de 2024, a dívida pública na ótica do Tratado de Maastricht (a do Pacto de Estabilidade, a que conta para a Comissão Europeia e outros avaliadores internacionais) “totalizava 270,7 mil milhões de euros, mais 8,8 mil milhões de euros do que no final de 2023”.Esta variação anual “resultou, em grande medida, do aumento dos títulos de dívida (+7,5 mil milhões de euros), especialmente de curto prazo (+5,9 mil milhões de euros), e dos empréstimos (+1,4 mil milhões de euros).”Já as responsabilidades em depósitos desceram cerca de 100 milhões de euros de euros entre 2023 e 2024 “devido sobretudo à diminuição dos certificados do Tesouro (-1,3 mil milhões de euros), que foi parcialmente compensada pelo crescimento dos certificados de aforro (+700 milhões de euros)”.Segundo o banco central, só no mês de dezembro ocorreu um agravamento de grandes proporções na dívida a cargo dos contribuintes. Neste caso, foi o recebimento de mais uma tranche do PRR (modalidade empréstimo) e uma subida substancial no valor em stock dos certificados de aforro.Em dezembro de 2024, a “aumentou 1,5 mil milhões de euros em relação ao mês anterior”, para os referidos 270,7 mil milhões de euros. “Esta evolução refletiu o acréscimo dos empréstimos (+1,1 mil milhões de euros), por via do recebimento de uma tranche do Plano de Recuperação e Resiliência (1,3 mil milhões de euros), e de emissões de certificados de aforro (+400 milhões de euros)”, explica o BdP.Elogios e avisosPortugal tem sido elogiado pela forte redução da divida e pela entrega de excedentes orçamentais anuais (como também vai acontecer em 2024, devendo o saldo chegar a 1% do PIB, como noticiou o DN esta semana), mas os avisos continuam porque um rácio de 95% do PIB continua a ser um dos maiores da Europa e muito excessivo face ao máximo de 60% exigido pelo Pacto.A agência de ratings Morningstar DBRS “congratula-se com esta redução significativa da dívida, uma vez que o nível de endividamento ainda relativamente elevado de Portugal aumenta a vulnerabilidade das finanças públicas a choques negativos no crescimento e nas taxas de juro ou à cristalização de passivos contingentes”.Por isso, continuam os analistas, as notas sobre a qualidade da dívida da República “podem ser reduzidas se um agravamento das perspetivas de crescimento de Portugal ou um compromisso mais fraco com a disciplina orçamental conduzirem a um aumento significativo do rácio de dívida pública a médio prazo”.