Mário Centeno, governador do Banco de Portugal.
Mário Centeno, governador do Banco de Portugal.Leonardo Negrão

Mário Centeno: "A guerra está aqui e vamos ter de gastar muito dinheiro"

"Temos grandes questões na dívida pública, mas esta deverá crescer novamente nos próximos anos devido aos desafios na defesa", disse o governador. Taxas de juro do BCE não voltarão a 0%, avisou.
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A Europa (Portugal, incluído) vai precisar de se endividar muito, novamente, ao longo dos próximos anos para se poder "gastar muito dinheiro" na área militar e defesa, avisou Mário Centeno, o governador do Banco de Portugal (BdP), esta sexta-feira, numa conferência, em Lisboa.

No seminário sobre transmissão da política monetária e mercado de trabalho, que decorreu na sede do BdP, no Museu do Dinheiro, Centeno fez as honras de abertura e aproveitou o palco para lançar uma rajada de avisos.

"Na Europa, conseguimos na Europa combater a inflação", trazê-la de um nível nunca visto na História do euro, de 10,6% em outubro de 2022, para perto de 2% atualmente, e "fizemo-lo sendo a economia mais estável do mundo".

"Somos, e essa é a minha opinião, os maiores fornecedores de estabilidade do mundo", atirou Centeno, quando segundos antes havia feito algumas comparações entre as economias da União Europeia (UE) e dos Estados Unidos da América (EUA).

"Mas a guerra está aqui" e "atualmente, há milhões de europeus deslocados", continuou o governador.

"Esta situação não tem paralelo em nenhuma outra grande zona económica do mundo atual" pelo que, sugeriu o responsável pela autoridade monetária portuguesa, "podemos utilizar fundos de defesa para continuar a construir ativos seguros, tal como fizemos com o financiamento do Next Generation EU, na Europa [o orçamento plurianual da UE, dedicado à recuperação pós-pandemia e aos PRR - Planos de Recuperação e Resiliência]".

O economista recordou que "estamos a caminho de normalizar a política monetária", mas deixou claro que "as taxas de juro manter-se-ão acima do que eram antes da covid-19", "isso é algo que temos todos de compreender".

Como já referido repetidas vezes, as taxas de juro centrais da Zona Euro estarão a caminhar para um nível "neutral" mais próximo de 2% e, como quis dizer Centeno, não voltarão a 0% ou mesmo a valores negativos, como aconteceu entre meados de 2014 a setembro de 2019.

"A isto chamar-se-á, de facto, normalização da política monetária", mas agora, por causa do enorme problema da guerra e outras ameaças (como as guerras comerciais) "no domínio orçamental vamos precisar de programas bem concebidos e vamos precisar de gastar muito dinheiro".

"Nós temos esse dinheiro e não devemos recear gastar dinheiro em nosso benefício". No entanto, "precisamos de programas muito bem concebidos", disse o governador.

Muito dinheiro, muita dívida a caminho

E como de onde virá todo esse "muito dinheiro"? A resposta foi direta: mais dívida pública, claro.

"Temos grandes questões sobre o lado orçamental, sobre a dívida pública, que aumentou durante a pandemia covid-19, mas que deverá crescer novamente nos próximos anos devido aos desafios que enfrentamos na defesa e a outras questões na Europa", assumiu Centeno.

"Por isso, temos de ter isto em conta quando pensamos na política monetária".

Para tentar deixar à audiência da conferência uma nota "mais positiva", o ex-ministro das Finanças disse esperar que a referida quantidade de dívida e "muito dinheiro" que vai ser injetada na defesa e noutros investimentos e gastos "contribua para que a Europa saia do hiato negativo do produto [crescimento abaixo do potencial, que hoje se traduz em estagnação económica] que, infelizmente, tem atualmente".

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