FMI. Metade das economias da Europa ainda consegue acelerar um pouco este ano, Portugal incluído
Cerca de metade das economias da grande Europa -- grupo formado por 38 países, onde estão todos os da União Europeia, mas também Noruega, Islândia, Sérvia, Ucrânia, Rússia ou Turquia -- ainda deve acelerar este ano face a 2024, indica o Fundo Monetário Internacional (FMI), no estudo com as novas previsões (outlook) sobre quase todos os países do globo, com toda a informação disponível até, pelo menos 4 de abril.
Ou seja, já incluíndo o anúncio bombástico das tarifas recíprocas de 2 de abril, o crescendo na guerra e reposta comercial contra os EUA nos dias seguintes e o caos e incerteza que entretanto foram lançados e afundaram os mercados.
De acordo com o novo outook, divulgado esta terça-feira em Washington (EUA), neste grupo de 18 economias (cerca de metade dos 38 analisados pelo FMI) está Portugal, cujo crescimento económico real deverá acelerar ligeiramente, de 1,9% em 2024 para 2% este ano, apesar do ambiente cada vez mais hostil no comércio internacional por causa do agravamento muito agressivo das tarifas, de muita "incredulidade" e de total incerteza no que será o rumo das políticas nos grandes blocos regionais do mundo.
Seja como for, a crise global já está a provocar estragos em Portugal: o país já vai crescer menos do que o previsto há seis meses (no outlook de outubro), indica a instituição liderada por Kristalina Georgieva.
Na altura, quando o Presidente dos EUA, Donald Trump ainda não tinha chegado ao poder, a projeção do FMI apontava para um crescimento de 2,3% em Portugal, este ano. Este ritmo de expansão da riqueza interna acaba de levar um corte de 0,3 pontos percentuais, agora.
Pior está a Europa, sobretudo a Zona Euro, que este ano deve avançar uns míseros 0,8% (contra 1% previsto em janeiro, no outlook intercalar, ou 1,2% no outlook de outubro), mostra a entidade de Washington.
E pior ainda estão os Estados Unidos, a maior economia do mundo, cujo crescimento leva agora um corte de quase um ponto percentual face a janeiro, devendo crescer cerca de 1,8%. Ainda assim, bem mais do que os 0,8% esperados para a Zona Euro.
O FMI recorda que até janeiro, até Trump chegar ao poder, e antes deste desencadear a guerra comercial atual em março e início deste mês, a economia mundial e as grandes economias do mundo estavam a voar baixinho, mas a coisa parecia "estabilizada". Pois que o mundo mudou e muito, diz o economista-chefe do Fundo.
Para Pierre-Olivier Gourinchas, "o sistema económico global sob o qual a maioria dos países funcionou nos últimos 80 anos está em redefinição e a levar o mundo para uma nova era".
"As regras existentes estão a ser postas em causa, enquanto outras novas estão ainda por surgir. Desde o final de janeiro, uma série de anúncios de direitos tarifários aduaneiros por parte dos Estados Unidos, que começou com o Canadá, a China, o México e sectores críticos [aço e alumínio], culminou com um quadro de taxas quase universais em 2 de abril", recorda o economista.
Assim, "a taxa efetiva dos direitos aduaneiros dos EUA ultrapassou os níveis atingidos durante a Grande Depressão, enquanto as contra-respostas dos principais parceiros comerciais fizeram subir significativamente a taxa global", barrando ainda mais os fluxos comerciais e fazendo encarecer as mercadorias.
"A incerteza epistémica [do que se conhece] e a imprevisibilidade política que daí resultam são dos principais vetores nestas perspetivas económicas" e "a manterem-se, o aumento abrupto dos direitos aduaneiros e a incerteza que o acompanha vão fazer travar significativamente o crescimento global".
Segundo Gourinchas, "a previsão de referência do nosso World Economic Outlook já inclui os anúncios de tarifas entre 1 de fevereiro e 4 de abril por parte dos EUA e as contramedidas de outros países".
Só com isto, "a nossa previsão de crescimento global recua para 2,8% e 3% neste ano e no próximo, ou seja, uma descida acumulada de cerca de 0,8 pontos percentuais em relação à atualização do outlook intercalar de janeiro de 2025".
Além disso, o FMI decidiu avançar com uma previsão global onde se exclui as tarifas de abril (previsão anterior a 2 de abril), ou seja, um cenário em que Trump não lançava a bomba tarifária. "De acordo com esta trajetória alternativa, o crescimento mundial teria sofrido apenas uma ligeira redução cumulativa de 0,2 pontos percentuais, para 3,2% em 2025 e 2026", calcula o economista-chefe do FMI.
"Condições financeiras ainda mais restritivas"
Mas o horizonte parece pouco auspicioso. Para o FMI, "o agravamento destes riscos de deterioração económica e financeira domina as nossas perspetivas [outlook]", assumindo como risco maior "um contexto de escalada das tensões comerciais e de ajustamentos dos mercados financeiros".
"As posições políticas divergentes e em rápida mutação ou a deterioração do sentimento poderão conduzir a condições financeiras mundiais ainda mais restritivas" e "o recrudescimento de uma guerra comercial e o aumento da incerteza quanto à política comercial prejudicarão ainda mais as perspetivas de crescimento a curto e a longo prazo". Menos cooperação internacional vai "comprometer" o regresso a uma economia global mais resistente, lamenta o antigo credor de Portugal.
(atualizado às 14h30 com declarações do economista-chefe do FMI)