FMI avisa que guerras são panela de pressão prestes a rebentar nos mercados financeiros
O ambiente global marcado por fatores geopolíticos graves e em crescendo - como as várias guerras atualmente em curso (a guerra entre Israel e vários vizinhos do Médio Oriente, a guerra da Rússia/Ucrânia) ou "disputas comerciais" sérias - é algo que, por enquanto, não se está a refletir em mais e muita "volatilidade" nos mercados financeiros, o que, no entender do Fundo Monetário Internacional (FMI), é mau sinal, "preocupa bastante". Parece algo que está a acumular e a ganhar força. Até quando, não se sabe.
Segundo um novo estudo, publicado esta terça-feira, o FMI sinaliza que se estão a acumular pressões cada vez maiores que, não sendo abordadas e travadas pelos responsáveis financeiros e políticos, podem acabar em novas explosões financeiras, em choques até devastadores como no passado recente (recorda-se já 2008, ano de má memória), podem alimentar a prazo movimentos de grande desvalorização de ativos financeiros ("sell-offs").
No novo Relatório sobre a Estabilidade Financeira Global, o FMI faz inclusive um paralelo entre esta fase da História (em que há sinais de "vulnerabilidades" que se estão a acumular) e o tempo que antecedeu a grande crise financeira global de 2008, que foi espoletada pela desvalorização, num ápice, de uma série de ativos financeiros altamente interligados, que teve a sua ignição da derrocada do banco norte-americano Lehman Brothers, na altura um dos maiores e mais respeitados do mundo.
Como uma panela de pressão sob aquecimento, prestes a explodir, ou um barril de pólvora de fácil ignição, neste outono de 2024, um ano volvido sobre o início da guerra de Israel contra Gaza na sequência do massacre de 7 de outubro perpertrado pelo Hamas, o FMI avisa que o mundo de começar a olhar rapidamente para estes fatores de tensão acumulada que podem derrubar novamente a estabilidade financeira que se tentou alcançar no pós-crise de 2008.
Chamando a atenção para o que classifica como "preocupações num futuro próximo", o FMI avisa que estão reunidas condições que podem fazer resvalar o mundo para o pior cenário ou para o cenário indesejado de uma nova crise financeira.
"Por um lado, as condições financeiras acomodatícias [expansionistas, com taxas de juro dos bancos centrais novamente a descer, com o dinheiro a ficar mais barato, outra vez] continuaram a aumentar as vulnerabilidades, como por exemplo valorizações elevadas de ativos em todo o mundo, aumento dos níveis de dívida pública e do sector privado e uma maior utilização de alavancagem [incorrer em dívida para pagar dívida] por parte das instituições financeiras, para citar algumas delas", diz o novo trabalho.
Segundo o artigo dos economistas Tobias Adrian, Sheheryar Malik e Jason Wu, que tutelam a área de estudo sobre o sistema financeiro global, no FMI, "tudo isto pode amplificar choques nos sistemas financeiros, no futuro".
Back to 2008?
Pior. O FMI vai mais longe, recuando ao ano de colapso do Lehman Brothers, que sacudiu e amputou em largas partes a ordem financeira global até então estabelecida, precipitando quase todo o mundo numa crise financeira (depois económica e depois de contas públicas) sem precedentes.
"Nós já vimos antes um aumento de vulnerabilidades, sobretudo antes da crise financeira mundial de 2008. A acumulação geralmente é gradual, o que deverá dar tempo aos decisores políticos para se ajustarem", avisam os especialistas.
Depois as guerras: aquelas onde morre gente e as outras, as comerciais. "A nossa segunda área de preocupação é que existe uma desconexão entre o aumento da incerteza – especialmente relacionada com o aumento dos riscos geopolíticos – e a volatilidade dos mercados financeiros", observa o FMI.
O que o Fundo nota é que, por exemplo, "uma medida padronizada de volatilidade anda muito abaixo das medidas do risco geopolítico". No entender do FMI, "isto indica que os preços dos ativos podem não estar a refletir totalmente o impacto potencial das guerras e das disputas comerciais".
Donde, "tal desconexão torna os choques mais prováveis, porque a elevada tensão geopolítica pode desencadear vendas súbitas nos mercados financeiros e fazer com que a volatilidade volte à medida que a incerteza se instala".
"Neste caso, algumas instituições financeiras [fundos, bancos, etc.] podem ser forçadas a vender ativos ou a procederem a uma desalavancagem dos seus balanços para cumprir exigências de margens ou cumprir regras de risco".
Ainda que estas medidas "possam proteger as instituições individualmente, elas na realidade podem exacerbar as vendas no mercado", conclui o FMI. É o risco sério de vir a alimentar uma bola de neve de proporção gigantesca e global, basicamente.