Custo da mão-de-obra sobe há ano e meio e pressiona preço das casas novas
Rui Oliveira / Global Imagens

Custo da mão-de-obra sobe há ano e meio e pressiona preço das casas novas

Os preços dos materiais já estão a estabilizar, mas o custo do trabalho na construção nova aumentou 8,1% em 2023, segundo o INE. Faltam 90 mil trabalhadores no setor, estima o sindicato da construção. Patrões preparam-se para anunciar aumentos salariais.
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Os custos de construção de habitação nova continuam a subir, alavancados agora no aumento da fatura com a mão-de-obra. Há ano e meio que a componente do trabalho não para de encarecer e não há previsões de quebra, dada a escassez de trabalhadores em Portugal e na Europa. Aliás, os patrões das empresas de construção preparam-se para anunciar aumentos salariais. Como confirmou a AICCOPN (associação do setor) ao DN/Dinheiro Vivo, o processo de negociação está em curso. Caso não haja rapidamente uma mudança de paradigma nesta atividade, agilizando a introdução de novos métodos construtivos que não exijam tantos trabalhadores, a descida do preço da habitação no país e a introdução de uma oferta mais adequada ao rendimento dos portugueses pode ser uma miragem.

De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE), o custo para construir uma casa nova apresentou uma crescimento médio de 3,9% no ano passado. Este incremento deveu-se essencialmente ao aumento em 8,1% da mão-de-obra. Os materiais de construção, cujo preço começou a subir com a pandemia e galopou com o início da guerra na Ucrânia, dá finalmente sinais de estabilização. Em 2023, cresceu apenas 0,9%, quando um ano antes tinha registado um aumento de 16,7%. Segundo José Matos, secretário-geral da Associação Portuguesa de Comerciantes de Materiais de Construção, “as cadeias de abastecimento voltaram à normalidade e os preços baixaram. Essa é a tendência se não houver nada de disruptivo nos próximos meses”.

Há, no entanto, espaço para a descida de preço de alguns materiais. Segundo os dados do INE, em dezembro último, verificou-se uma quebra de 2,2% face ao mesmo mês de 2022 do custo global destes produtos. Os revestimentos, isolamentos e materiais de impermeabilização registaram uma descida de cerca de 20%, o aço para betão e perfilados e a chapa de aço macio e galvanizada apresentaram uma redução da ordem dos 15% e o consumo de produtos energéticos diminuiu 10%. Em sentido inverso, o betão pronto e os artigos sanitários evidenciaram crescimentos homólogos de cerca de 10% e o cimento, as tintas, primários, subcapas e vernizes de 5%.

13% de aumento

Em dezembro, o custo da mão-de-obra aumentou 7,5% face a igual mês de 2022. E não se antevê movimentos de quebra. Albano Ribeiro, presidente do Sindicato da Construção de Portugal, estima que faltem 90 mil trabalhadores no país para responder às obras da ferrovia, hospitais, habitação, entre outras, que estão projetadas para os próximos anos. Para a construção do futuro aeroporto, serão precisos mais 15 mil, diz.

O problema está há muito identificado, mas os baixos salários praticados pelo setor em Portugal não são atrativos para o regresso dos cerca de 300 mil trabalhadores que emigraram. O dirigente sindical está apostado em incrementar os rendimentos dos que cá estão que, diz, “estiveram anos a ganhar o salário mínimo”. Em cima da mesa, tem uma proposta de aumento da ordem dos 13%.

Como adianta, “não queremos menos de 900 euros para um operário de 1ª, que agora ganha 780 euros”. Outra das reivindicações é o aumento do subsídio de alimentação de 6,5 para oito euros. Até porque “é uma inverdade que os trabalhadores da construção têm bons salários”, frisa. O DN/Dinheiro Vivo sabe que esta sexta-feira as empresas de construção estiveram reunidas na AICCOPN para debater a nova tabela salarial. Dentro de poucas semanas, deverá ser divulgada aos trabalhadores.

Face aos baixos salários praticados na generalidade das construtoras, porque têm os custos com a mão-de-obra aumentado? O mercado adaptou-se à escassez de trabalhadores e surgiram alternativas para dar resposta aos donos das obras. Atualmente, “são poucas as empresas de construção que têm na sua estrutura operários qualificados. Estão centradas na gestão e direção de obra”, explica uma fonte ligada ao setor. Ou seja, recorrem à subcontratação de serviços. No mercado, encontram-se trabalhadores independentes, firmas especializadas em determinado ofício e empresas prestadoras de serviços de mão-de-obra. 

Estas sociedades “têm maior capacidade negocial, adaptaram-se a uma procura que não é satisfeita no mercado” e os serviços que prestam “são cada vez mais caros”, sublinha. Também esta a ser construída muita habitação de gama alta, exigente em empreitadas muito especializadas. Essas empresas também assumem despesas como alimentação, habitação quando necessária, aquisição de equipamentos de segurança, que entram no bolo de gastos com os trabalhadores. Em suma, os custos da mão-de-obra “não estão refletidos diretamente nos salários”.

A solução para o aumento da oferta de habitação para a classe média, média-baixa e para as famílias com parcos rendimentos passa pela construção off-site ou modular, que não exige tanta mão-de-obra, defende o especialista. Na sua opinião, o país continua indexado a uma construção tradicional, exigente em trabalhadores, que não responde no preço e no tempo de execução às necessidades dos portugueses. E para finalizar lembra: “A produtividade da construção evoluiu menos do que a do setor agrícola”.

sonia.s.pereira@dinheirovivo.pt

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