A Associação Nacional das Indústrias de Vestuário e Confecção considera que as autoridades europeias estão a permitir que as plataformas de ultra fast fashion promovam a “maior fraude fiscal do século XXI”, na medida em que as encomendas feitas a gigantes como a Shein, Temu ou Alibaba “chegam à casa do consumidor sem pagarem IVA ou taxas aduaneiras”. Uma convicção assente numa experiência realizada pela associação, com compras feitas através destas plataformas, e que chegaram “sem fatura ou comprovativo de pagamento de impostos”. De acordo com este responsável, foram feitas compras nas referidas plataformas a partir do Reino Unido e da Alemanha, no valor de 80 euros, e de 180 euros no caso das encomendas feitas a partir de Portugal e dos Países Baixos. Os montantes são relevantes porque, de acordo com a regra de minimis, os bens até 150 euros não estão sujeitos ao pagamento de tarifas alfandegárias, mas acima disso deveriam pagá-las. “Todas estas encomendas que fizemos deveriam pagar IVA e as de 180 euros deveriam pagar as taxas aduaneiras, mas chegaram-nos sem qualquer fatura ou documento associado que fizesse prova disso”, garante César Araújo, que considera que Bruxelas “tem de, rapidamente, por fim ao abuso destas plataformas que põem em causa a indústria e as marcas europeias, mas também o pequeno comércio”.Sem entrar em pormenores sobre a experiência de compra realizada, a Anivec está a enviar cartas aos principais líderes da União Europeia, desde Ursula von der Leyen a António Costa, passando por todos os comissários europeus, incluindo Maria Luís Albuquerque, pedindo a abolição do programa de minimis, e que toda a mercadoria que chega às fronteiras europeias seja rastreada. Pede, ainda, a extensão da aplicação da taxa de carbono também às importações de produtos têxteis e de vestuário e a “introdução urgente e obrigatória do pagamento de um “ecovalor” (nos termos em que está previsto com a implementação da Responsabilidade Alargada do Produtor) que visará constituir um fundo que possibilite dar o devido tratamento ao produto em fim do ciclo de vida e potencie o desenvolvimento de novas matérias-primas e novos processos industriais”, entre outras medidas. .O modelo de minimis prevê isenção de direitos alfandegários para produtos até 150 euros e de IVA para transações inferiores a 20 euros. Anivec fala em lacuna que resulta na perda de milhares de milhões de euros..A Anivec lembra que a fileira industrial europeia “está comprometida” com as metas estabelecidas pelo Pacto Ecológico Europeu, e que “acarretam custos produtivos adicionais para preservar o planeta e cumprir as metas delineadas pela UE”, mas sublinha que “a coexistência destes objetivos com os acordos que promovem a entrada e a “livre circulação” no mercado único de produtos que não obedecem aos mesmos critérios nem ambicionam as mesmas metas é, no mínimo, paradoxal”.Sobre os impostos que ficam por pagar, a carta refere “a perda de milhares de milhões de euros”. Quanto exatamente ninguém sabe. “Ao não haver controlo alfandegário sobre estas mercadorias, ninguém sabe o que circula pela Europa. O que sabemos é que, só a Shein, exporta produtos no valor de 15 a 20 mil milhões de euros ao ano para a UE. E sabemos que, em 2021, nos Países Baixos, foram entregues 172 milhões de encomendas eletrónicas, número que subiu para 700 milhões de pacotes em 2023 e duplicou em 2024. Shein, Temu e Alibaba são responsáveis por 90% destas encomendas, se não for mais”, garante César Araújo. O empresário considera vital que as autoridades tributárias “apurem com rigor” quanto entraria nos cofres europeus se estas plataformas “pagassem IVA e taxas aduaneiras”. Lembra, ainda, que estamos perante atores que “não respeitam nem questões de cariz social, ambiental ou de intelectual” e que as autoridades precisam de olhar pela indústria europeia, composta por mais de 190 mil empresas e 1,3 milhões de trabalhadores, e que geram vendas superiores a 170 mil milhões de euros. “Não queremos protecionismo, queremos reciprocidade”, sustenta.