Um em cada cinco jovens não consegue arranjar trabalho
Três organizações uniram-se para fazer um diagnóstico do mercado laboral dos mais novos e insistem na articulação entre o ensino e as competências mais procuradas pela economia.
A transição da escola para o mercado laboral em Portugal é marcada pela precariedade, com um em cada cinco jovens a não conseguir encontrar trabalho. Além do mais, os salários dos jovens são muito pouco atrativos e aumenta cada vez mais o desajustamento entre a formação adquirida e a requerida.
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Os dados são do Livro Branco "Mais e Melhor Emprego para os Jovens", levado a cabo pela Fundação José Neves, pelo Observatório do Emprego Jovem e pelo escritório da Organização Internacional do Trabalho para Portugal. Pretende fazer um diagnóstico do mercado de trabalho dos jovens, mas também aponta uma agenda para o futuro neste campo.
Segundo o documento, desde 2015 que o desemprego dos jovens com menos de 25 anos tem sido mais do dobro da população em geral. Durante a pandemia, a proporção foi três vezes e meia mais alta.
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Em suma, a vulnerabilidade do emprego jovem em Portugal é uma realidade. Em termos de futuro, esta situação irá acabar por comprometer o coletivo de Portugal, até porque a fragilidade do mercado de trabalho vai impactar a vida pessoal dos jovens, que vêm a sua independência adiada.
E se dúvidas existem, o Livro Branco justifica com novos dados.
A redução do abandono escolar acaba por se traduzir no aumento de jovens que ingressam no ensino superior. Segundo o estudo, "em 2020, apenas 21% dos portugueses entre os 25 e os 34 anos não tinham terminado o ensino secundário". Já em 2021, 36% e 48% dos jovens portugueses entre os 25 e os 34 anos tinham o ensino secundário e superior, respetivamente.
Como referem os autores do relatório, estes dados relativos ao ensino são promissores, embora as competências digitais na nossa população sejam consideravelmente baixas. Em 2019, ainda 37% e 46% dos jovens entre os 16 e os 24 anos e os 25 e 34 anos, respetivamente, não detinham competências digitais básicas. Uma situação que "causa preocupação pela premência do uso de tecnologias de informação e comunicação no mercado de trabalho".
Desemprego
Apesar de um aumento no ingresso no ensino superior, de acordo com o documento, Portugal apresenta níveis de desemprego jovem superiores à média da União Europeia.
Entre 2015 e 2019, a percentagem diminuiu, mas com a pandemia, a situação piorou consideravelmente. A partir de 2020, para os jovens dos 15 aos 24 anos, o desemprego cresceu aceleradamente, passando de 19,9% no segundo trimestre, para 26,4% no terceiro trimestre. A subida entre o grupo etário 25-29 anos também foi muito significativa (de 9,4% para 13,1%, no mesmo período temporal).
O documento aponta duas razões para este crescimento: o facto dos jovens portugueses serem confrontados com relações contratuais atípicas - só em 2021, a percentagem de jovens dos 15 aos 24 anos com contratos a termo certo era de 53,9%, contra 14,6% na população total (15-64 anos).
E, a segunda razão: a transição da escola para o mercado de trabalho tornou-se ainda mais difícil num período em que a economia estava em retração e que o sistema de ensino enfrentava diversos problemas devido à suspensão das atividades letivas. Em 2021, a percentagem de jovens, entre os 20 e os 34 anos, que conseguia um emprego após terminar o ensino secundário ou superior, diminuiu para 74,2%. Em 2019, era de 77,5%.
Dois fatores que contribuíram para a aceleração muito rápida do desemprego jovem, sendo que a crise provocada pela pandemia evidenciou os problemas estruturais que já existiam no mercado de trabalho para os jovens em Portugal, lê-se no mesmo estudo.
Onde intervir
Os autores do Livro Branco consideram que existe um conjunto de intervenções prioritárias. Promover a complementaridade entre políticas de emprego, de educação (dos ensinos superior e profissional) e de apoio às empresas; bem como a regulação do mercado de trabalho e políticas de inovação, tudo no âmbito da restruturação do sistema produtivo.
Por outro lado, é necessário melhorar a articulação entre sistema de ensino e as competências mais procuradas pelo sistema económico. Envolver os empregadores na conceção e implementação da formação profissional e superior e incorporar ou reforçar da formação em soft skills nos currículos, são algumas das sugestões.
Melhorar a qualidade do emprego ao regular de uma forma mais firme as formas de contratação não permanente e reforçar as políticas ativas de emprego, sem esquecer a promoção do diálogo social com participação ativa dos mais novos, são outras áreas de melhoria recomendadas para que se possa construir um plano nacional de promoção do emprego jovem.
Carlos Oliveira, presidente da Fundação José Neves, reconhece os avanços de Portugal nos últimos anos ao nível da escolaridade da sua população, que se refletem nas competências das novas gerações de trabalhadores, mas alerta que há ainda um longo caminho a percorrer para dotar os jovens de hoje de melhores empregos, que lhes permitam realizar-se a nível profissional e pessoal.
Mónica Costa é jornalista do Dinheiro Vivo