Tribunal de Contas: Segurança Social deixou fugir 1,1 milhões de euros com vendas diretas de imóveis
Auditoria deteta vendas abaixo do mercado num décimo dos negócios do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social entre 2016 e 2018.
A gestão de imóveis pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social entre os anos de 2016 e 2018 terá resultado numa perda potencial de 1,1 milhões de euros, conclui o Tribunal de Contas numa auditoria que aponta também falhas na cobrança de rendas e num acordo com o município de Lisboa que vai colocar antigas instalações da Segurança Social no arrendamento acessível.
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Os valores que o Tribunal de Contas diz que o IGFSS deixou fugir dizem respeito a 15 imóveis, num grupo de 147, que a gestão imobiliária da Segurança Social entregou em vendas diretas ao primeiro interessado. Segundo o TC, encaixou 2,5 milhões de euros, menos 1,1 milhões de euros daquele que seria então o valor de mercado para o conjunto.
A maior parte das perdas diz respeito à venda de nove frações na baixa lisboeta, em 2015, numa venda de urgência que ficou por 1,6 milhões de euros - menos 695,2 mil euros que o que contava de uma avaliação feita em março do ano anterior.
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Em parte das frações vendidas, funciona atualmente o Centro Social da Sé, da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Noutra parte, está o Misericórdia 116, empreendimento com apartamentos para venda por valores entre 900 mil e 1,25 milhões de euros, segundo anúncios de agências imobiliárias que podem ser consultados online.
Os baixos valores de venda, cerca de 30% abaixo do valor de mercado, são justificados pelo IGFSS com o facto de ter promovido antes concursos que ficaram desertos de interessados, acabando os imóveis por ser vendidos de acordo com o regulamento então vigente - à primeira proposta, e não à de maior valor, conforme passaria a ser regra após março de 2016.
Ainda assim, os juízes do Tribunal de Contas (com apenas um voto de vencido no relatório) lembram que a opção "apenas se justificaria em situação de necessidade, o que não foi demonstrado". E criticam vários outros aspetos, desde a ausência de estudos económico-financeiros que guiem as vendas anuais de imobiliário pelo IGFSS até à contratação de um único avaliador a cada venda. Aliás, pelo custo de 100 euros, "um montante exíguo face aos benefícios", lembra o Tribunal.
Dos 147 imóveis vendidos, apenas 50 foram a concurso. Houve, nota o relatório, 61 imóveis localizados no concelho de Lisboa vendidos por ajuste direto. No período analisado, o mercado imobiliário estava já em recuperação.
A análise do TC nota um agravamento dos resultados negativos da gestão da carteira de imóveis da Segurança Social. Atingiam 580,4 mil euros em final de 2018, mais 38,4 mil euros que três anos antes."Ao longo do triénio, os custos foram sempre superiores aos proveitos, podendo-se concluir da ineficiência desta área de negócio do IGFSS", refere.
É assim também no arrendamento, onde o Tribunal destaca 3,5 milhões em dívida, na quase totalidade considerada de difícil cobrança. Diz que "a arrecadação de receitas de rendas não está a ser devidamente acautelada, não se encontrando suportada em procedimentos uniformes e sistemáticos que assegurem, de forma eficaz e eficiente, a cobrança tempestiva da receita e a recuperação da dívida".
O relatório debruça-se ainda sobre um memorando de entendimento assinado no verão de 2018 com a Câmara Municipal de Lisboa para o arrendamento de 11 imóveis que estavam na esfera do Instituto de Segurança Social, com uma opção de compra que o TC diz que não foi valorizada nas contrapartidas, e que o município decidiu exercer ao fim de menos de um ano, e com um período de carência de dois anos. Os imóveis serão votados ao arrendamento acessível e ficam, na compra, por 57,2 milhões de euros, na média de avaliações encomendadas pela câmara e da Segurança Social.
Para o TC, "as condições da operação fixadas no memorando e posteriormente nos contratos celebrados apresentavam-se vantajosas para o município, em detrimento da receita e da sustentabilidade do orçamento da segurança social".
O Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social garantiu já esta quinta-feira que a venda de 11 imóveis da Segurança Social à Câmara de Lisboa para arrendamento acessível "foi feita a valores de mercado" e na sequência de quatro avaliações externas.
"Foi prosseguido o interesse público (...) de forma pública e transparente e assegurando a rentabilização do património da Segurança Social, respeitando os princípios da eficiência e eficácia na sua gestão", defende a tutela, sublinhando que a venda dos imóveis à autarquia da capital foi "rentável para a Segurança Social" e resulta de "um longo processo negocial".
A venda dos edifícios ao município liderado por Fernando Medina (PS) foi a solução que "melhor respondeu à circunstância" de haver 11 imóveis devolutos na cidade, depois da concentração dos serviços do Instituto da Segurança Social na Avenida de Berna.
Maria Caetano é jornalista do Dinheiro Vivo
[Notícia atualizada às 08:21 com reação do Governo às conclusões da auditoria do Tribunal de Contas.]