No Colombo, não houve enchentes. Os táxis até esperaram pelos clientes
"Aqui o Colombo não está com muita gente. Estou aqui há 2.15 horas na fila e é o primeiro serviço que estou a fazer. Olhe aqueles táxis todos acolá", e António Augusto Lopes, 70 anos de idade e há 32 anos a conduzir um táxi, aponta para o outro lado da rua onde se alinham dezenas de táxis à espera dos visitantes do Centro Colombo que nesta segunda-feira reabriu quase todas as mais de 300 lojas.
Os táxis fizeram fila à espera dos clientes de um dos maiores shoppings na Grande Lisboa, mas o centro comercial esteve longe de atingir a sua lotação máxima, mesmo com as restrições impostas pela Direção-Geral de Saúde (DGS): apenas 5 clientes por cada metro quadrado. No ano passado, recebeu 25 milhões de visitas, cerca de 75 mil pessoas por dia. Tem capacidade para receber em simultâneo cerca de 7 mil, mas isso, mesmo antes da pandemia que levou ao encerramento da maioria das 342 lojas, só era alcançado em alturas muito específicas do ano, como o Natal. E este dia de reabertura claramente não foi um Natal. Os clientes vieram mas, pelo menos no primeiro dia, parecem estar afastados os receios de aglomeração de visitantes que levaram o governo a adiar em duas semanas a abertura dos centros na Grande Lisboa num momento em que os casos de infeção de covid-19 não dão sinais de abrandar na região.
Filas nem vê-las. Na maioria dos casos, quando muito um ou dois clientes aguardavam de máscara a sua vez de entrar; à porta, a indicação do número de pessoas que era permitido receber em simultâneo. A única que ainda contou com alguns clientes alinhados à espera foi mesmo a Primark, onde, por volta das 14.00, cerca de 50 clientes aguardavam na entrada do jardim, mas em média cerca de 10 minutos bastaram para chegar a vez.
Com mesas vagas e lugares sentados a sobrar à hora do almoço, também a zona de restauração se mantinha tranquila, com alguns espaços de cadeias como a Lusitânia ou Frango da Guia ainda de portas fechadas.
O Colombo nunca chegou a encerrar, mesmo durante o Estado de Emergência, mantendo-se os cerca de 300 trabalhadores de limpeza, segurança entre outros, no ativo. Nesse período, 35 das mais de 300 lojas no Colombo - incluindo supermercado, lojas de produtos eletrónicos e farmácias - estiveram sempre de portas-abertas; com a chegada do estado de calamidade esse número subiu para 70 e "com um número apreciável de visitantes, sendo nesta segunda-feira enfim mais de 300", adianta Paulo Gomes, diretor do Centro Colombo. Houve até quem aproveitasse a pausa para neste dia abrir novos conceitos de loja, conta. É o caso da Parfois. "Estava há um mês com tudo pronto. Inauguraram hoje um conceito novo a nível mundial, o Parfois Closet", adianta. A Party Fiesta foi outra que abriu portas na segunda-feira e a Decénio também avançou já com o novo conceito de loja, enumera o responsável do centro Colombo.
A Perfumes & Companhia também voltou a funcionar hoje, com a loja no Colombo a ser uma das 35 de uma rede total de 144 a nível nacional que aguardavam o 15 de junho para receber os clientes. Sem filas, pelo menos, enquanto por lá estivemos, mas "em linha com a expectativa" da cadeia. "Já sabíamos que no primeiro dia podia haver algum entusiasmo inicial dos clientes, que precisavam de recomprar os seus produtos habituais. De outras reaberturas, sabemos que no primeiro dia pode haver o efeito de um pequeno boom", diz Isabel Costa Cabral, diretora de marketing da Perfumes & Companhia.
"É um tipo de cliente diferente do que tínhamos pré-pandemia: são pessoas que entram na loja com uma ideia muito clara do que precisam, vêm para comprar, não estão fazer shopping e a ver as oportunidades, querem uma venda assistida, rápida, eficaz e voltar para casa", diz Isabel Costa Cabral. E o que compram? "A categoria em que notamos maior dificuldade (na venda) é a de maquilhagem. Tem muito que ver com o facto de as pessoas estarem confinadas e com uma vida social mais reduzida - a mulher portuguesa tendencialmente maquilha-se mais quando existe uma festa, um evento, vai jantar fora, tem uma celebração. Nesta fase houve uma quebra na venda de maquilhagem especialmente notável nos batons, porque estamos com máscara, e, em contraponto, um crescimento nos produtos de maquilhagem para olhos, hoje os grandes protagonistas do nosso rosto", adianta a diretora de marketing da Perfumes & Companhia.
A verdade é que a covid-19 mudou o comportamento dos consumidores e a cadeia também teve de se adaptar, sobretudo, por ser um tipo de retalho muito assente na experimentação de produtos, algo impossível num momento em que o distanciamento social é a palavra de ordem.
"Estamos a aprender a criar formas que permitam aos nossos consumidores ter o mais próximo de uma experimentação sem haver toque, para um maior distanciamento, para evitar contágios." Se não pode haver testers, há tecnologia. "Usamos ferramentas digitais, como um iPad que tira uma fotografia e permite identificar os tons que ficam melhor a cada pessoa, ou do face chart, um papel onde está desenhado o rosto de uma senhora e que permite às equipas fazer recomendações com base no tom de pele, formato dos olhos, tipo de maquilhagem. Faz-se um desenho com os próprios produtos de maquilhagem, para as pessoas terem noção dos tons e textura que vão ser conseguidos", explica.
Preocupações para evitar o contacto que, de resto, são visíveis por todo o centro. Máscaras (2,50 euros) e viseiras estão disponíveis para compra à entrada do centro em máquinas de venda automática, há dispensadores de gel distribuídos pelo edifício, na dúvida por onde circular as marcações no chão indicam o caminho e os seguranças controlam entradas e lotação. Foram ainda reforçadas as limpezas de espaços como casas de banho. E para os mais distraídos, uma voz nos altifalantes lembra, a cada 10 minutos, que os visitantes devem manter a distância de segurança de dois metros, em português e inglês. É uma das 10 mensagens de segurança pré-gravadas.
Paulo Gomes não adianta o investimento feito pelo centro para criar o que chama de "cultura de segurança", mas só no sistema de UV instalado para fazer a limpeza dos corrimãos das escadas rolantes foram investidos cerca de 100 mil euros.
Tudo para criar a confiança necessária para levar os clientes ao shopping. Ainda assim, apesar de o número de visitantes ter lentamente vindo a aumentar ao longo do dia, em nenhum momento da visita da imprensa o centro teve de fechar portas, sistema acionado quando atinge 85% da lotação permitida. Uma decisão só possível porque, através de um sistema de contagem de entradas permitido por câmaras, o centro sabe a cada momento quantos visitantes tem no espaço.
O cenário ter-se-á repetido pelos shoppings da Grande Lisboa cujo o adiamento da reabertura foi "penoso e dramático" para os lojistas - ou não se concentrassem na região 35% dos shoppings do país, representando 50% do emprego total gerado pelo setor a nível nacional.
"Houve afluência e com bastante segurança em locais como o El Corte Inglés ou o Almada Forum", relata Gonçalo Lobo Xavier, diretor-geral da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED), que representa cadeias como a C&A, El Corte Inglés, Foreva, Sacoor, entre outras, a prova de que "com as duas restrições ao nível de lotação - à entrada do centro e depois nas lojas - não serão focos de transmissão". Por outro lado, "certos centros como o Amoreiras Shopping, que vivem dos escritórios que estão nas redondezas, tiveram uma afluência muito baixa, com as pessoas ainda em teletrabalho", ressalva o responsável.
As cadeias associadas da APED "todas abriram as lojas, estava tudo preparado", mas "as vendas estão muito aquém do que pode ser esperado, com níveis de receita e rendibilidade muito reduzidos", lamenta Gonçalo Lobo Xavier. "Áreas de negócio como o têxtil estão a trabalhar para escoar produto", exemplifica. "Todos os estudos indicam que há falta de confiança, o consumo tem diminuído, dando um quadro de incerteza para o futuro", conclui.
Desde maio que a Perfumes & Companhia tem vindo a fazer a reabertura das sua rede de 144 lojas, processo que concluiu agora com o abrir portas dos shoppings na Grande Lisboa. "Notamos uma maior procura do comércio de rua, no que é Like for Like há um crescimento face ao ano passado mas estas lojas também receber um tráfego que se moveu dos centros comerciais. Ainda é cedo para fazer a avaliação concreta", diz Isabel Costa Cabral.
"Estes primeiros 15 dias de junho, em que já tínhamos as lojas dos centros e de rua abertas correram acima da nossa expectativa, que era bastante negativa. Num perímetro de lojas comparáveis - abertas - estamos com crescimento de cerca de 10%, faltavam todas as lojas dos centros de Lisboa, como Colombo, Vasco da Gama, Cascaishopping, que têm muito peso", adianta a responsável de marketing. A cadeia já tem praticamente todo o pessoal fora do regime de lay-off simplificado. Do total de 900 colaboradores, "das equipas de loja, 95% já estão a trabalhar. Faltam equipas de loja com horário mais reduzido - lojas de rua estão a trabalhar das 10h às 19h".