Investimento público dispara à boleia de estradas e gastos militares
O investimento público esteve adormecido durante todo o ano de 2016, mas em 2017 regressou em força. Os dados da execução orçamental do primeiro semestre, ontem divulgados pelas Finanças, mostram que o grande impulso está a vir do dinheiro dedicado às estradas e à compra de material militar.
O "aumento muito expressivo de 20,4% do investimento" no primeiro semestre deste ano (face a igual período de 2016) é, aliás, uma das principais explicações para a expansão de 1,5% na despesa primária (sem juros), diz o ministério de Mário Centeno. O valor apurado em junho já ia em 1803 milhões de euros. Em todo o caso, terá de acelerar mais para se cumprir o que está previsto no Orçamento do Estado deste ano: a meta anual é 4988 milhões.
O boletim da execução orçamental explica que a forte subida do investimento (administração central e segurança social) foi "influenciada pelo diferente perfil intranual dos encargos associados às concessões e subconcessões rodoviárias da responsabilidade da Infraestruturas de Portugal, nomeadamente no que se refere a subconcessões cujos pagamentos verificados em junho deste ano ocorreram em meses posteriores em 2016". As concessões em causa são a do Baixo Alentejo, Litoral Oeste, Baixo Tejo e Douro Interior. A atenuar a forte subida do investimento público esteve "a quebra verificada nas construções e requalificações a cargo da Infraestruturas de Portugal, em parte justificada pelos encargos com a construção do túnel do Marão, que ainda tiveram expressão em 2016".
Mas há mais. O governo explica que foi realizada muito mais despesa "em investimento militar, pagamentos ao abrigo da Lei de Programação Militar, pela Marinha Portuguesa, e aquisição de viaturas táticas ligeiras blindadas pelo Exército". O gasto com concessões rodoviárias aumentou 11% no primeiro semestre, para 847 milhões de euros. O investimento militar saltou 66%, para 76 milhões.
Além da administração central, há outros setores que estão a gastar mais em investimento. É o caso das autarquias e regiões que afetaram 672 milhões de euros para esse fim na primeira metade de 2017, um reforço anual de 38%. "Na administração local, o crescimento da despesa em 9,1% reflete, principalmente, o aumento de 47,8% no investimento", dizem as Finanças, que lamentam a falta de informação por parte de sete municípios, entre eles Castelo Branco e Setúbal.
Reembolsos atrasam défice
A receita fiscal excluindo reembolsos está a crescer ao dobro do ritmo previsto no Orçamento de 2017, mas incluindo essas devoluções de impostos, o défice aumenta de forma significativa (+9%).
O gabinete do ministro Mário Centeno diz que "a receita fiscal cresceu 6,3% no primeiro semestre de 2017, excluindo a aceleração dos reembolsos, um valor consideravelmente acima dos 3%" previstos no Orçamento. O maior imposto está a correr bastante bem, "refletindo a aceleração económica". "A receita bruta de IVA cresceu 6,5%." E a criação de emprego também está a dar um contributo aos cofres públicos, via descontos. As contribuições para a Segurança Social aumentaram 5,8%.
No entanto, os reembolsos de impostos continuam a afetar bastante a execução orçamental, embora o ministério diga que se trata de um efeito temporário, que não põe em risco a meta do défice.
É que este ano, por exemplo, a maioria dos contribuintes começou a receber muito mais cedo a devolução do IRS por causa do automatismo introduzido no processamento das declarações. O valor reembolsado neste imposto disparou 84%, para 1,1 mil milhões no final de junho. O Estado recebeu 4,3 mil milhões em IRS, menos 20% do que na primeira metade de 2016.
O IVA arrecadado pelos cofres do Estado conseguiu crescer (+3,4%), mas o ministério repara que "o aumento dos reembolsos em 16,6% atenuou o efeito da subida". "Atendendo ao carácter temporário destes reembolsos, o seu efeito não terá impacto no défice final", garantem as Finanças.
Tudo somado, o défice público global foi de 3075 milhões de euros no primeiro semestre, aumentando 264 milhões face a 2016 (+9,4%), refletindo um acréscimo de 1536 milhões que está "associado à antecipação dos reembolsos fiscais".
Mesmo assim, a despesa afetou mais a subida do défice do que a receita na medida em que cresceu mais. Umas das principais explicações tem que ver com a tal retoma do investimento, e com a despesa com pessoal, cujo aumento ligeiro de 0,3% "reflete essencialmente" o aumento de "recursos humanos nomeadamente nas áreas da saúde e da educação".