Valdo: "O Bernardo Silva, sinceramente, acho impossível regressar ao Benfica agora”
Nos últimos dias muito se tem falado do possível regresso ao Benfica de antigos jogadores como Bernardo Silva, João Félix, Nelson Semedo, João Cancelo ou Victor Lindelöf. Um cenário de sonho para os adeptos e para o presidente Rui Costa - também ele um retornado -, mas muito complicado de se consumar, segundo Valdo, ex-jogador do Benfica que em 1995 voltou ao clube onde tinha jogado entre 1988 e1991, oriundo do PSG.
“Estamos a falar de jogadores de topo. A situação do Semedo é um pouco diferente, porque está em final de contrato e isso facilita porque não tem de haver uma negociação entre clubes, acertas com o jogador e pronto. Agora, quando colocamos na equação, João Félix, João Cancelo é diferente. O Bernardo Silva então, muito sinceramente, acho impossível regressar agora ao Benfica”, afirmou ao DN o antigo internacional brasileiro, lembrando que o médio “é um dos jogadores mais importantes do Manchester City.
Bernardo Silva ganhou praticamente tudo na carreira - seis vezes a Premier League e uma Liga dos Campeões - e tornou-se num dos melhores do mundo na sua posição, tendo várias vezes manifestado o desejo de voltar a casa. Está com 30 anos, tem contrato com os citizens até 2026 e um salário na ordem dos 12 milhões de euros/ano.
Por isso, para Valdo, ainda não é o tempo de regressar. “Para trazer um desses jogadores de topo, o Benfica tem que ter uma agilidade financeira muito forte e todos sabemos que é impossível um clube português contratar esses jogadores. Mesmo que eles estejam disponíveis para baixar o ordenado, não vão jogar de graça, e os clubes não vão libertar jogadores de topo, vão querer dinheiro e mesmo no caso do futebolista ficar livre é preciso pagar o prémio de assinatura”, lembrou, colocando a parte financeira como principal obstáculo ao plano de Rui Costa.
“Mesmo que um jogador tenha ganho mais dinheiro do que poderá gastar nesta vida, não vai deitar dinheiro à rua. A ligação emocional existe e pode ser determinante, mas não acredito que abra mão de milhões. Por mais que um atleta goste do Benfica, FC Porto ou Sporting, não vai abrir mão de dez milhões. Tudo isso é muito bonito, poético, mas a realidade é outra. O futebolista pensa que pode ter uma fatalidade e vai ter de viver com o que ganhou até terminar a carreira.”
O caso de João Félix
Bernardo Silva e João Félix são duas das principais referências da formação do Seixal. Em ano de Mundial de Clubes e de eleições no Benfica (marcadas para outubro), segundo o jornal Record, Rui Costa pretende o regresso da dupla no curto prazo - no cenário ideal, até ao início de junho, antes do início da competição - e, no caso de Félix, conta com um trunfo chamado Bruno Lage.
Foi com o técnico que o avançado se destacou e se projetou. Depois de meia época avassaladora e de um título de campeão na Luz, João Félix mudou-se para o Atlético Madrid por 126 milhões de euros. Um valor histórico que não refletiu em campo. Desde então anda de empréstimo em empréstimo e continua sem mostrar a melhor versão, mesmo depois de ter sido comprado pelo Chelsea.
O avançado, agora cedido pelos londrinos ao AC Milan, ainda procura a afirmação internacional, mas Valdo não concorda que o regresso à Luz possa ser encarado como um passo atrás.
“Muito sinceramente, não consigo emitir uma opinião clara sobre o João Félix, posso estar a cometer uma injustiça... se há jogador que já teve oportunidades foi ele, em clubes de topo, com vários treinadores, vários sistemas. Não quero ser leviano e dizer que a culpa é do jogador, mas ele é o ator principal e precisa de refletir sobre isso, e não sei se voltar ao Benfica e ao futebol português é boa opção”, defendeu Valdo.
Segundo o ex-jogador, o avançado de 25 anos terá de fazer “uma introspeção”, porque “tem muito talento”e “é um grande jogador”, e regressar à Luz pode colocar-lhe o “rótulo de só conseguir ser grande jogador no Benfica e na Liga portuguesa”.
Valdo voltou para jogar e pela família
Valdo nunca gostou da frase “regressar para acabar a carreira”. Acha-a um pouco depreciativa para os jogadores que ainda têm valor desportivo a dar aos clubes: “O jogador não regressa pelo dinheiro. O jogador quer voltar, mas em condições de dar alguma coisa ao clube.”
Esteve na Luz entre 1988 e 1991 e voltou, proveniente do Paris Saint-Germain. Titular indiscutível, para além da qualidade futebolística, deixou uma imagem de enorme profissionalismo, tendo ganho a Taça de Portugal na época em que regressou (1995-96).
“Tinha chegado um treinador novo ao PSG e o clube queria colocar os jogadores contratados por Artur Jorge na II liga francesa. E eu disse-lhe que não era jogador de II liga. Apareceu o convite do Benfica, através do Manuel Barbosa, falei com o PSG para facilitarem a minha saída e não tive dificuldade em acertar o contrato com o Benfica. Mas era outra época, estou a falar em 1995/96, já lá vão 30 anos, o futebol mudou muito. Os valores salariais era completamente diferentes e não eram tão dispares como hoje, em que o salário pesa mais na decisão do jogador”, recordou.
A ligação emocional ao Benfica já existia, portanto, sabia que era uma casa onde podia voltar e ser feliz. Mas não foi isso que o fez voltar. Era casado com um portuguesa, “alfacinha de gema” e voltar a Lisboa e ao futebol português foi também “uma opção de vida e familiar”, dizendo não ao futebol italiano e espanhol, que não o seduziam.
De Chalana a Di María, passando por Rui Costa
Renato Sanches foi o último dos 13 grandes jogadores que saíram e voltaram ao Benfica. Chegou no início desta época e faz parte do plantel atual, tal como Ángel Di María.O argentino regressou em 2023-24 com o estatuto de campeão do Mundo, 13 anos depois de sair para o Real Madrid. Este ano já ergueu a Taça da Liga e ainda luta pelo título.
Antes do argentino houve o caso de Gonçalo Guedes, por empréstimo do PSG, em 2022-23 , que celebrou o título de campeão.
O próprio presidente do Benfica também viveu um regresso emocionado. Rui Costa deixou a Luz ainda jovem para jogar na Fiorentina e no AC Milan. Em 2006, após 12 épocas, decidiu voltar a casa e ainda vestiu a camisola encarnada duas temporadas.
Já Nuno Gomes, que em 2000 se transferiu para a Fiorentina, acabou por regressar dois anos depois para ficar mais nove temporadas, tendo ganho todos os quatro troféus nacionais. E na década de 1990, além de Valdo (ver texto principal) também Carlos Mozer e Ricardo Gomes voltaram, mas só o primeiro se sagrou campeão nacional (1993-94).
Outro regresso histórico foi de Rui Águas, que protagonizou em 1988 uma das transferências mais polémicas do futebol português, quando trocou o Benfica pelo FC Porto. O ponta-de-lança voltou duas épocas depois para conquistar dois campeonatos.
Mais antigos são os casos de Humberto Coelho, João Alves e Fernando Chalana, históricos que também regressaram depois de experiências no estrangeiro. Todos voltaram a conquistar troféus.
isaura.almeida@dn.pt