O fenómeno Diogo Ribeiro. "Nunca se viu nada assim na natação nacional"

Diretor desportivo da Federação Portuguesa de Natação explica ao DN a estratégia seguida para chegar aos três títulos e recorde mundial. E "é inegável" que agora se vai pensar em medalhas em Paris 2024.

O Recorde do Mundo dos 50m Mariposa foi a "cereja no topo do bolo" para Diogo Ribeiro, que terminou a participação nos Campeonatos do Mundo Júnior de Natação, em Lima (Peru), com três Medalhas de Ouro (50m mariposa, 100m mariposa e os 50m livres). "Sendo muito objetivo e não olhando só para as medalhas, nunca se viu nada assim na natação nacional. Já tivemos, e temos, nadadores extremamente talentosos, mas nada comparado com este fenómeno", admitiu José Machado, diretor desportivo da Federação Portuguesa de Natação (FPN) ao DN.

Lembrando que esta "é uma situação completamente nova", o também selecionador nacional explicou que todos os que trabalharam com o nadador de 17 anos "foram percebendo que estava ali um potencial fora do normal". E o que tem ele fora do normal? "A capacidade de se focar num objetivo. Por exemplo, depois do Bronze Europeu, em vez de ir celebrar com os outros nadadores que terminavam a época, entrou em modo treino. Mostrou uma maturidade incrível. Foi sozinho para o Peru, muito antes das provas, com o fisioterapeuta e o treinador e preparou-se o melhor possível. Foi ele quem se convenceu que era possível fazer três Ouros e um Recorde Mundial e depois convenceu-nos a nós."

Se muitos viram o potencial, poucos esperavam tanto em tão curto espaço de tempo: "Ele teve um problema grave [acidente de moto, em julho de 2021, que lhe colocou a carreira em risco] e começou a época em novembro do ano passado e depois de uma paragem de quatro meses, quando o normal seria ter começado em setembro do ano passado, e desde o início se percebeu que estava numa fase evolutiva fora de série."

Estratégia e crença

A partir do momento em que ele se mudou de Coimbra para o Centro de Alto-Rendimento do Jamor foi traçado um plano competitivo para o jovem do Benfica, que não foi consensual, mas, segundo José Machado, Diogo acreditou na estratégia do treinador: "Foi-lhe dito que tinha um potencial enorme na natação que mais ninguém tinha conseguido. Teve de fazer escolhas que não são fáceis em nome de uma aposta sem garantias."

A preparação já visava que ele atingisse a forma máxima nestes Campeonatos do Mundo Júnior. Nos Nacionais de março bateu Recordes Nacionais por dez vezes, mas melhorou exibicionalmente nos Campeonatos da Dinamarca que foram 15 dias depois. Por isso o treinador [Albertinho] e ele sabiam que competindo nos Campeonatos da Europa, Diogo estaria melhor 15 dias depois nos Mundiais.

A preparação seguiu esta lógica e revelou-se acertada. Assim como a estratégia de abdicar da meia-final dos 100m Livres. O nadador "participou na decisão". Ele sabia que em condições normais essa prova podia dar para medalha, mas o Ouro seria muito difícil, tendo em conta que o primeiro lugar estaria à partida entregue a Popovic (recordista mundial absoluto), apesar de Diogo até ter feito melhor tempo que o romeno na qualificação para as meias-finais. Diogo optou pelos 50m Mariposa, até porque era a última oportunidade de bater o Recorde do Mundo, uma vez que vai deixar de ser júnior.

A não-ida aos Europeus Júnior foi algo polémica e o diretor desportivo teve de explicar a algumas pessoas aquilo que agora é "mais fácil" justificar: "Temos de ter humildade para reconhecer e perceber que não estamos habituados a este nível. A única pessoa que tem experiência é o treinador [Alberto Silva, conhecido por Albertinho], que já teve oportunidade de trabalhar com medalhados Olímpicos [Cielo e Thiago Pereira]. Todos os outros podem opinar, mas..."

Integrado no projeto Olímpico Paris 2024

Nascido a 27 de Outubro de 2004, Diogo era bebé quando teve o primeiro contacto com uma piscina à boleia da irmã mais velha. Tinha 4 anos quando perdeu o pai - em memória dele tatuou uma estrela no ombro direito, o que deslocou no grave acidente de julho de 2021 - e a mãe decidiu colocá-lo na natação. Aos 8 começou por participar no Circuito Regional de Cadetes, em Coimbra, em representação da Fundação Beatriz Santos-Clube. Ao fim de quatro anos transferiu-se para o Clube Náutico Académico e já em 2021 juntou-se à família benfiquista.

Aos 17 anos integra o projeto Olímpico Paris 2024 e "é inegável" que, a partir de agora, se vai pensar em medalhas. "A natação apontou uma final como objetivo Olímpico e, quando o fez, o cenário não era tão animador como agora, nem sonhávamos sequer com estes resultados. Até há um ano nem tínhamos garantias de conseguir uma classificação nos 16 primeiros (meias-finais), depois de no Rio 2016 conseguirmos duas meias-finais e, em Tóquio 2020, só uma. Agora é diferente e não é só o Diogo. Nos Europeus tivemos 9 finais e sete nos oito melhores e isso é um passo importante. Estar nos oito primeiros para lutar por medalha é o objetivo", explicou José Machado.

A Medalha de Bronze nos 50m Mariposa nos Europeus Absolutos de Roma (em agosto) foi de alguma forma desvalorizada pela trilogia do Ouro Mundial, mas "não devia", segundo o diretor desportivo da FPN: "Os ouros e o recorde podem ser mais vistosos, mas o bronze europeu é que o coloca na história da natação e do desporto português."

isaura.almeida@dn.pt

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