Quais são os pilares da função de diretor desportivo?.A versatilidade e a adaptabilidade. No futebol atual, o diretor desportivo é constantemente confrontado com situações e desafios que proveem dos mais variados quadrantes, seja da área da gestão executiva (presidentes, proprietários, conselhos de administração), da área técnica (equipa técnica, plantel ou serviços adjacentes), seja da própria idiossincrasia e vertente cultural do meio onde o clube está inserido, como acontece no meu caso específico do Fenerbahçe e da Turquia. O diretor desportivo tem de possuir essa capacidade de gestão transversal integrada, sendo o elemento aglutinador dos diversos departamentos que gravitam em volta do futebol. A imagem do diretor desportivo que tem “bom olho”, deteta bons jogadores e contrata bem, está esbatida e é, na minha opinião, muito redutora tendo em consideração a atualidade. Nos grandes clubes e nas ligas de topo, é cada vez mais difícil contratar um “mau jogador”, fruto de todo o auxílio tecnológico de que o recrutamento neste momento dispõe. O grande desafio não é contratar o melhor jogador, mas sim contratar o jogador ideal, aquele que se enquadra melhor no contexto em que estamos inseridos. Por vezes comete-se o erro de confundir um bom scout com um bom diretor desportivo. Há espaço para ambos, mas não concordo com a mistura de ambos. A função do diretor desportivo é demasiado específica e ampla. Não se cinge ao “simples” facto de recrutar. Tem de saber recrutar, adaptar, gerir e optimizar os recursos..Contratar José Mourinho faz a carreira de um diretor desportivo? .É claro que contratar José Mourinho não faz uma carreira, mas é certamente uma decisão paradigmática numa carreira, como seria de esperar quando se trata de um dos treinadores icónicos da história do futebol moderno. O mais relevante para mim foi também ter conseguido juntar a “marca” que é José Mourinho a um dos maiores clubes da Europa. Por vezes, em Portugal, não existe a noção clara da dimensão e da crescente qualidade do futebol turco. O Fenerbahçe é um gigante europeu, um clube supranacional com mais de 30 milhões de adeptos. Mas não posso deixar de realçar que tenho tido a oportunidade e o privilégio de - entre outros ao longo da minha carreira - ter trabalhado com treinadores como Jorge Jesus, Marco Silva ou Abel Ferreira, que têm deixado marca por onde passam e que me “obrigaram” a ser cada vez melhor diretor desportivo..Hoje há vários portugueses com essa função em grandes clubes (ler texto ao lado). Já se pode falar de um mercado de diretores?.Já existe um mercado de diretor desportivo, com movimento desses profissionais entre países e campeonatos, de há alguns anos a esta parte. Sensivelmente nas últimas duas décadas, o futebol tornou-se numa indústria de crescimento exponencial, tendo as SAD/Clubes necessidade de recrutar executivos com competências para lidar com a especificidade dos assuntos futebolísticos, tal como acontece na área da finanças, jurídica ou marketing/merchandising, por exemplo. No meu caso específico, em 15 anos de carreira como diretor desportivo, já tive a possibilidade de exercer a minha função em 4 países (Roménia, Croácia, Grécia e Turquia) além de Portugal, o que significa que existe demanda internacional para a função..Ver cada vez mais ex-jogadores a assumir a pasta de diretor é uma moda ou reflexo do futebol moderno....Não concordo que seja um reflexo do futebol moderno ou até que seja uma moda. Entre os primeiros diretores desportivos portugueses e terem experiências e destaque internacional, salvaguardando honrosas excepções, poucos tinham um passado como praticante: veja-se o caso do Antero Henrique, Tiago Pinto, Luís Campos ou mesmo eu próprio. Muitos vezes, o ex-jogador tem a vantagem de dominar uma vertente importante, que é o empírico da gestão de balneário, mas isso não invalida que tenha de munir-se de outras valências para ser um diretor desportivo de sucesso. Existe uma grande diferença entre o jogo e a gestão executiva do jogo. Nesta vertente penso que ainda temos de evoluir consideravelmente em Portugal. A oferta formativa na área da direção desportiva tem evoluído e diversificado, mas ainda estão por definir os requisitos para o exercício da função, o que limita o acesso às oportunidades de trabalho. Ainda assim, continuamos a produzir executivos que são procurados internacionalmente, com destaque para a mudança do Hugo Viana para o Manchester City, num movimento de exportação de talento português na área que espero que continue a aumentar.