"Não estou preparado para parar, mas quero competir sem pressão"

O bom filho a casa torna. Saca Pires diz que a sua participação na Liga Moche deste ano é também uma forma de agradecer aquilo que Portugal fez por ele
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Anunciou há dias a sua reforma das competições internacionais. Porque é que mesmo assim vai participar na Liga Moche?

Não disse que ia parar de competir de vez, ainda não me sinto preparado para isso. Quero continuar a fazê-lo de uma maneira leve, sem a pressão de ter de cumprir um calendário ou estar em determinado lugar de um ranking. Não posso garantir que não vou faltar a nenhuma prova da Liga porque pode acontecer, mas, já que estou em casa, porque não continuar motivado para treinar e a fazer o que sei? Além disso, a minha participação na Liga é também uma forma de agradecer aquilo que foi feito por mim em Portugal, foi neste circuito que me lancei há 20 mil anos (risos), foi aí que tudo começou. É preciso não esquecermos as nossas origens.

O que acha da Liga hoje em dia, tal como está organizada?

A tendência do ser humano é querer sempre mais, especialmente quando se está habituado a um ritmo mais exigente. Penso que em comparação ao que existe por toda a Europa, em países inclusive maiores e mais ricos, temos o melhor circuito nacional de surf e isso é de louvar. A Liga é uma importante rampa de lançamento para qualquer surfista em início de carreira. Temos sorte em ter uma equipa determinada em levar este projeto avante. Não é uma tarefa fácil, pois a maioria das pessoas só quer saber dos melhores do mundo. No entanto, temos de dar importância a estes projetos mais pequenos e o Francisco Rodrigues, presidente da Associação Nacional de Surfistas, tem tido um papel determinante em ser firme nesta aposta e com isto está a construir uma Liga cada vez mais forte e que, quem sabe no futuro, poderá contar com muito mais dinheiro e expressão.

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Em comparação com outros circuitos nacionais em países onde o surf é um desporto com mais história, o que acha do nosso?

Existem poucos lugares onde eu acho que haja circuitos muito mais fortes do que a Liga em termos de organização e mediatização. Nos EUA ou Brasil verifica-se sempre um grande conflito entre as Ligas nacionais e os circuitos profissionais da World Surf League (WSL). Os americanos tinham o Budweiser Tour, os brasileiros o Super Surf durante alguns anos, mas foram passageiros e nenhum apresenta uma história tão longa e consistente quanto o nosso circuito nacional.

Apesar dos elogios tem algumas mudanças a sugerir?

Sim, idealmente gostava de ver a Liga a passar por mais praias, ter mais três ou quatro etapas, um total de oito provas seria o indicado. Também penso que o circuito devia ir do norte ao sul do país, algo que não está a acontecer. É importante o surf ser mostrado em todos os cantos da nossa costa. Outra área onde gostava de ver evolução é na premiação, quanto mais alta for, maior é o interesse e mais intensa a competição.

Que lugares gostava de ver no calendário?

Faz falta termos um campeonato no Sul do país e uma prova com ondas maiores no inverno. É importante os atletas surfarem ondas mais pesadas e habituarem-se a usar pranchas grandes. A Figueira da Foz seria um destino incrível para isto. Quanto às datas, poderia haver algumas alterações. Irmos ao Porto em maio, por exemplo, é arriscado, preferia competir lá no inverno, e evitaria ao máximo campeonatos no verão, faria apenas uma prova nessa altura, provavelmente na Praia Grande, um dos sítios mais consistentes em Portugal. É pena não podermos introduzir estas mudanças, mas estamos condicionados pelos investidores e calendários internacionais. A ANS tenta sempre conciliar as etapas da Liga com a agenda dos surfistas que estão no circuito mundial de qualificação.

Começou a entrar neste circuito em adolescente e tinha 17 anos quando ganhou a primeira prova. Que episódios mais o marcaram? E as maiores rivalidades?

No primeiro ano na Liga, em 1996, tinha 16 anos e fiz uma final. Foi na Ericeira e perdi contra o João Antunes que era então um surfista de topo. No ano seguinte acabei por ganhar a mesma etapa, em Ribeira d"Ilhas, fiz mais algumas finais e cheguei à última prova do ano, na Costa de Caparica, com hipóteses de ser campeão. Lembro-me de estar supernervoso e sucumbi por completo à pressão, perdi logo na primeira bateria e com isso o título. Houve sempre rivalidades interessantes, como a que existiu entre o João Antunes e o José Gregório, ou entre o Bubas (Bruno Charneca) e o Dapin (João Alexandre). Eu não posso falar muito, pois estive pouco tempo no circuito nacional. Abandonei-o em 1998 para me focar no pró-júnior e no circuito europeu. Hoje continuamos com margem para grandes rivalidades, como é o caso do Frederico Morais e do Vasco Ribeiro, são quase sempre eles a ir à final e na disputa pelo título.

Quem vão ser os seus maiores adversários? Estes dois últimos?

Sem dúvida, resta saber se eles e eu vamos poder estar em todas as provas. Também há o Gony Zubizarreta, um surfista muito bom e candidato a ganhar campeonatos, o Miguel Blanco, que pode começar a entrar nas discussões, o Marlon Lipke, que compete sempre na maioria das provas, o Nic von Rupp, o Pedro Henrique... Acho que temos os ingredientes para fazer uma Liga bem disputada este ano.

Disse que estava com vontade de competir sem pressão. Vai para brincar ou para ganhar?

Quando vou para uma prova, vou sempre para ganhar. Afirmei que gostava de ser campeão nacional, embora tenha outros projetos que me vão roubar algum tempo, por isso não posso garantir a minha presença em todas as etapas. Em termos de agenda, a Liga é a minha segunda prioridade este ano e o filme que estou a preparar sobre a minha carreira, a primeira.

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