Aí está, finalmente, o primeiro jogo oficial do Benfica com uma equipa argentina, 94 anos depois do primeiro de 13 encontros particulares. E que melhor adversário os encarnados poderiam ter para se estrearem no Mundial de Clubes senão o Boca Juniors, o popular clube de Buenos Aires que tantas afinidades e ligações tem com o emblema da Luz.O pontapé de saída está marcado para segunda-feira, 16 de junho, quando em Lisboa forem 23h00. As bancadas do estádio Hard Rock, em Miami, vão vestir-se de vermelho e azul – as cores dos dois clubes – com adeptos fanáticos, sendo que são esperados mais argentinos do que portugueses, tendo em conta a força dos emigrantes dos respetivos países na Flórida. Certo é que se tratam dos clubes mais populares e com maior base de apoio de Portugal e Argentina – estando ambos no top 5 de clubes com mais sócios do mundo –, que tornam os respetivos estádios autênticos pesadelos para os adversários, pois se o Estádio da Luz é conhecido internacionalmente como “o inferno”, a mítica La Bombonera é um templo do futebol, um verdadeiro vulcão quando o Boca joga em casa.Contudo, as semelhanças entre os dois históricos clubes mundiais não se esgotam aqui, afinal têm ambos como símbolos dois dos maiores futebolistas de sempre. Se na Luz a estátua de Eusébio marca a presença do rei dos benfiquistas, o Boca Juniors tem um autêntico deus em Diego Armando Maradona, que foi a maior estrela que alguma vez representou os xeneizes. Por outro lado, os dois emblemas são presididos por antigos números 10 que foram ídolos dos adeptos: Rui Costa dirige o Benfica desde junho de 2021, enquanto Juan Román Riquelme chegou ao cargo mais alto do Boca Juniors em 2019.Sem vencerem os respetivos campeonatos há dois anos, Benfica e Boca Juniors iniciam o Mundial de Clubes em fases diferentes da temporada, pois de os lisboetas estão no final de uma época de desilusões, o emblema de Buenos Aires vem de um Torneio Abertura que foi uma completa desilusão com a eliminação nos quartos de final numa época em que falhou a entrada na fase de grupos da Taça Libertadores, a Champions da América do Sul. São, pois, duas equipas em depressão, que nos últimos três jogos somaram dois empates e uma derrota, que valeram aos argentinos uma troca de treinador, com a chegada do veterano Miguel Ángel Russo, o último a levar pela última vez o Boca a vencer a Libertadores, em 2008. Ao contrário, Bruno Lage mantém-se à frente dos encarnados e tem neste Mundial um teste de fogo para a sua continuidade no cargo..Com tantas afinidades, é natural que seja este o clube argentino que mais vezes o Benfica defrontou, mas a quem nunca ganhou nos cinco jogos particulares realizados, nos quais o 1-1 é o resultado habitual, mais parecendo um autêntico pacto entre cavalheiros. Só a 27 de dezembro de 1954, no Estádio Nacional, não foi esse o resultado, com os argentinos a levarem a melhor por 1-0 no Torneio Quadrangular de Lisboa. Seguiram-se quatro partidas sempre com o mesmo resultado: duas vezes em 1967 nos Estados Unidos, em 1968 no Torneio Internacional de Buenos Aires e, finalmente, outra vez nos EUA em 1995 no Torneio Parmalat, tendo o Boca acabado por vencer no desempate por penáltis..Apesar de o último encontro ter sido há 30 anos, não se pode dizer que os jogadores em campo são desconhecidos, pois do lado do Benfica estão os argentinos Otamendi, Di María e Prestianni, que em tempos diferentes se habituaram a defrontar o Boca Juniors. Pelos xeneizes – alcunha que tem a ver com os imigrantes genoveses (‘zeneizes’ no dialético da Ligúria) que fundaram o clube do bairro portuário de La Boca – há vários futebolistas com passado em Portugal, desde logo o defesa Cristián Lema, que teve uma curta passagem pela Luz em 2018/19, mas também o guarda-redes Agustín Marchesín (FC Porto), o peruano Luis Advíncula (V. Setúbal), Marcos Rojo (Sporting) e Rodrigo Battaglia (Sp. Braga, Moreirense, Desp. Chaves, Sporting). Isto além do goleador uruguaio Edinson Cavani, que há uns anos protagonizou uma autêntica novela de verão com o Benfica, numa transferência que acabou por não se concretizar.Um onze argentino de luxoMais recente é a ligação entre Benfica e Boca Juniors no que diz respeito a futebolistas que envergaram os dois emblemas, afinal apenas desde 1978 a assembleia geral dos encarnados permitiu que o clube pudesse ter jogadores estrangeiros. O primeiro argentino a chegar à Luz foi o avançado Claudio Caniggia, em 1994, de onde saiu um ano depois para jogar no emblema xeneize, apesar de ter sido formado no rival River Plate. Dois anos depois foi o colombiano Jorge Bermúdez a chegar ao Benfica e, um ano depois, a rumar ao Boca.Em 2010 chegou à Luz o argentino com mais jogos (266) e golos (62) de águia ao peito, Eduardo Salvio, que dez anos depois rumou à La Bombonera para cumprir um sonho de criança. Neste período fez o percurso inverso Nico Gaitán, outro dos ídolos benfiquistas, o segundo com mais partidas (253) e o terceiro com mais golos (41). Lisandro López e Cristián Lema são os outros dois que defenderam os dois emblemas..Mas a legião de futebolistas argentinos no Benfica tem sido considerável, e com uma boa taxa de sucesso, afinal entre os 25 nomes que jogaram oficialmente de águia ao peito (só o Brasil tem mais, com 94) constam, por exemplo, Pablo Aimar, Javier Saviola, Nicolás Otamendi, Ángel Di María, Ezequiel Garay, Enzo Pérez, Enzo Fernández, entre outros.Aliás, seria mesmo possível fazer um onze de internacionais argentinos que, por certo, daria muito que falar com o Gustavo Bossio, o único guarda-redes argentino que passou pela Luz (sem muito sucesso); uma defesa composta por Lisandro López, Otamendi e Garay; com uma dupla de ‘Enzos’, Fernández e Pérez, que deixaram saudades entre os benfiquistas, e depois Salvio, Gaitán, Di María, Aimar e Saviola..12 jogos em 94 anosCom o primeiro jogo oficial à porta, refira-se que foi a 9 de março de 1931 que se realizou, no antigo Estádio das Amoreiras, o primeiro duelo do Benfica com equipas argentinas: o Gymnasia y Esgrima estava de visita a Portugal e venceu esse particular por 1-0.Além do Boca Juniors, os encarnados mediram depois forças com outros cinco emblemas da Argentina, sendo que apenas venceu dois, em 1950 frente ao Racing Avellaneda (1-0) para o Torneiro Internacional de Lourenço Marques, em Moçambique; e em 1975, no Torneiro Internacional de Jacarta, na Indonésia, frente ao Rosário Central, por 2-1.Registou-se ainda um empate 3-3 com o River Plate, o outro gigante argentino, no Torneio Internacional de Buenos Aires, numa partida em que José Torres bisou e Eusébio também deixou a sua marca, curiosamente num jogo disputado no La Bombonera. Os restantes embates saldaram-se por derrotas com em 1950 com o San Lorenzo Almagro (2-5), em 1951 com o Lanús (1-2) e em 1953, no Jamor, com o Independiente (1-2).O outro desaire no currículo acabou por ser natural, uma vez que foi frente à seleção argentina que se preparava para o Mundial de Espanha em 1982, onde iria defender o título de campeã do mundo conquistado quatro anos antes. O selecionador César Luis Menotti escolheu o Benfica, treinado pelo húngaro Lajos Baroti, para ser o último teste antes do Campeonato do Mundo. Os encarnados atravessaram o oceano Atlântico para jogarem no Estádio Monumental de Buenos Aires, a 26 de maio de 1982, frente a uma seleção cheia de estrelas como Fillol, Daniel Passarella, Osvaldo Ardiles, Ramón Díaz, Mario Kempes e jovem Diego Maradona..Os encarnados com Bento, Humberto Coelho, Carlos Manuel, Shéu, Chalana, Nené, entre outros, fizeram a vida difícil à campeã do mundo, que venceu apenas por 1-0 com um golo de Kempes, de fora da área no início da segunda parte. Os exigentes e fanáticos argentinos que encheram o estádio despediram-se da equipa com uma grande vaia. Anos mais tarde, em entrevista ao jornal Observador, Menotti recordou esse momento, dizendo que foi o pior jogo da sua era. “Éramos os campeões mundiais, mas jogámos mal e só marcámos porque o Kempes atirou uma pedrada lá para dentro”, referiu o lendário treinador..Mundial dos milhões: Benfica no top-10 dos plantéis mais valiosos do torneio.Mundial de Clubes. 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