Dar prémios iguais a mulheres e homens ao serviço das seleções

Governo quer equiparar ganhos monetários na representação do País. Medida programática promete revolucionar Desporto português. Federação Portuguesa de Futebol promete equiparar até 2030. Numa década Portugal ganhou mais atletas femininos que masculinos.

São medidas programáticas, mas prometem revolucionar o Desporto em Portugal se forem implementadas e, de alguma forma, comprometem o Governo numa matéria sensível como a igualdade de género no Desporto. A começar pela "adequada proporcionalidade" em remunerações e prémios atribuídos a atletas homens e mulheres que representem Portugal. A título de exemplo, a ideia é, a partir de 2029, pagar o mesmo a Dolores Silva e a Cristiano Ronaldo.

A 4 de agosto de 2022, seguindo uma diretriz acordada pelos Estados-Membros da União Europeia, o Governo constituiu um grupo de trabalho para políticas em matéria de igualdade de género no Desporto, sob a égide da ministra adjunta dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes. Entre as 15 medidas ontem apresentadas, numa cerimónia na Alfândega do Porto, estão o apoio à maternidade de atletas de alto rendimento e o aumento de mulheres em cargos diretivos, como o DN noticiou há dias.

A recomendação do grupo de trabalho coordenado por Leila Marques, vice-presidente do Comité Paralímpico de Portugal, visa equivaler, ou pelo menos aproximar, os valores distribuídos ou atribuídos pela presença em seleções nacionais por parte de homens e mulheres bem como os prémios atribuídos em provas desportivas que sejam organizadas por entidades com utilidade pública ou com recurso a financiamento público, abrindo caminho para a dita igualdade.

O tema da igualdade salarial entre homens e mulheres no desporto de elite, e em particular no futebol colocou o futebol feminino na frente de batalha quando a seleção dos EUA reclamou isso mesmo em tribunal. Processo que acabou por perder. Já em 2023, o País de Gales acordou igualar os pagamentos, como já acontece com Inglaterra e Escócia. Espanha, Brasil, Austrália e Noruega também estão em fase de implementação dessa medida.

Em Portugal, a Federação Portuguesa de Futebol estabeleceu a igualdade de género como uma das prioridades até 2030. "Estamos muito comprometidos com esta causa e temos inscrito no nosso plano para esta década - o plano Futebol 2030, já em execução - vários projetos que nos ajudarão a chegar às metas propostas no relatório. A nossa realidade alterou-se muito nos últimos 10 anos com o investimento, próximo de 50 milhões de euros, que fizemos no futebol feminino", disse, ontem Fernando Gomes, lembrando que nunca houve tantas praticantes de futebol, futsal e futebol de praia federadas (13 239), tantas competições e tantas seleções criadas.

Tem agora a palavra o Governo e a Assembleia da República.

Olhar para os números e ver

Na década de 2010 a 2020, a prática desportiva no feminino cresceu em média 3527 atletas por ano. Se em 2010 havia 128 805 mulheres desportistas, em 2020 eram 164 075. O que significa que em dez anos Portugal ganhou 35 270 atletas mulheres, um aumento superior ao dos homens (30 109), segundo dados fornecidos ao DN pelo Instituto Português do Desporto e Juventude.

Apesar desse grande crescimento a paridade ainda é um palavrão. Portugal tem apenas 140 atletas olímpicas e cinco medalhadas - Rosa Mota, Fernanda Ribeiro, Vanessa Fernandes, Telma Monteiro e Patrícia Mamona. Das 28 medalhas olímpicas, cinco são de ouro e, dessas, duas são de mulheres: Rosa Mota (maratona, 1988) e Fernanda Ribeiro (10 mil metros, 1996). Nos próximos Jogos Olímpicos Paris 2024 haverá tantos praticantes masculinos como femininos, nos chamados jogos da paridade.

Do apoio pós-maternidade às quotas para dirigentes

Para proteger as praticantes mulheres e evitar que abandonem a competição, o grupo de trabalho propõe a criação de "uma subvenção financeira a 100% após o término dos 120 dias de licença de maternidade" para a recuperação de aptidão física a níveis inerentes ao alto-rendimento, o que deve ser assegurado entre este ano e 2025. Segundo o grupo de trabalho este momento é de "acrescida dificuldade da conciliação entre a vida pessoal, familiar e profissional", tornando "mais visíveis os obstáculos que se apresentam às mulheres".

O Estado deve ainda tentar aumentar a percentagem de mulheres no treino desportivo, propondo-se, para isso, que seja gratuito a pessoas do sexo feminino a frequência dos cursos de treinador de grau I, além de ter disponível uma reserva de vagas de inscrição em relação aos outros níveis. Os clubes e as federações com mais de 10 treinadores inscritos devem ter uma proporção de até 20% de mulheres nessas inscrições, sendo que passa a 33,3% a partir de 2029.

As mulheres continuam longe de cargos de liderança e, de acordo com um trabalho feito pelo DN, em 2021 só uma das 33 federações de modalidades que já foram olímpicas era liderada por uma mulher: Sandra Monteiro (basebol), que entretanto já deixou o cargo. Agora o Governo quer propor que a quota de mulheres não seja inferior a 20% a partir de 2024 em qualquer entidade ligada ao desporto, nomeadamente Sociedades Anónimas Desportivas, que passa a 40% até 2029. Já os lugares de direção em entidades públicas ligadas ao desporto devem superar os 40% até 2026.

Para combater a violência de género enquanto problemática que afeta toda a sociedade e o desporto, em particular as raparigas e mulheres, o grupo propõe, entre outras medidas, criar mecanismos de denúncia eficazes e promover formação obrigatória para todos os agentes desportivos que trabalhem diretamente com crianças e jovens e atletas de alto-rendimento.

isaura.almeida@dn.pt

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