Poucas horas depois de, na terça-feira, ter aparecido na conferência após o Manchester City-Feyenoord (que chegou a estar a ganhar por 3-0, mas empatou 3-3), cheio de arranhões na cabeça e ter dito, meio a sorrir, que “queria magoar-se” a si próprio, Pep Guardiola foi obrigado a retratar-se, tal a polémica levantada pela alegada desvalorização de um "tema sério" como é a automutilação. .“A minha resposta não teve, de maneira alguma, a intenção de aliviar o tema muito sério que é a automutilação. Sei que muitas pessoas lidam todos os dias com problemas relacionados com a saúde mental e gostaria de aproveitar o momento para destacar uma das maneiras através das quais podem procurar ajuda”, escreveu o espanhol nas redes sociais, antes de deixar o e-mail e o número de telefone de uma linha de apoio em Inglaterra..Desportivamente, o treinador vive a pior sequência de maus resultados da carreira - seis jogos consecutivos sem vencer, com cinco derrotas e um empate. E, por isso, muitos adeptos questionaram, primeiro, a saúde mental do técnico e, depois, a forma supostamente como aligeirou o assunto da automutilação. “Em que outra indústria é que isto seria considerado normal? As pessoas iriam oferecer apoio e ajuda profissional. Por que razão deveria ser diferente no futebol? É difícil de ver”, questionou Nicky Crosby, apresentadora da beIN Sports..Segundo Jorge Silvério, o treinador do Manchester City “fez muito bem” em esclarecer publicamente o assunto para não parecer que estava “a menosprezar as pessoas que sofrem desse problema” e “que, de facto, é um problema bem complicado”. A automutilação “pode ser um sintoma de algumas doenças e também há casos no Desporto, porque afinal os atletas são humanos”..Para o psicólogo do Desporto, “é evidente que, dentro daquilo que é o rendimento desportivo, a parte mental é extremamente importante e quanto melhor preparados os atletas, os treinadores, os árbitros estiverem mentalmente mais fácil conseguirão lidar com as situações”. Porque “a saúde mental é um aspeto extremamente importante e deve ser trabalhado”..Grande parte do trabalho de um psicólogo do Desporto “é ajudar os atletas a lidarem com a pressão e gestão de expectativas”. .E prevenir não é remediar, avisa Jorge Silvério: “Quando se tem um problema recorre-se a ajuda, mas a questão preventiva é extremamente importante. Eu diria que 90% do trabalho que faço enquanto psicólogo do Desporto é mais por causa da questão preventiva, no sentido de, quando acontecer alguma coisa, os atletas já estarem preparados para lidar com isso e terem as ferramentas necessárias.”.Segundo o especialista “há um conjunto enorme de ferramentas que podem ser utilizadas em função do problema de cada pessoa, desde estratégias mais cognitivas, que têm a ver com a questão dos pensamentos e como os abordar, até às estratégias que passam mais por um trabalho mais fisiológico”. .Em Portugal, segundo Jorge Silvério, “ainda há muito trabalho a ser feito na área da saúde mental no desporto”, apesar de cada vez se falar mais no assunto e isso levar “a uma maior sensibilização para o tema”. Mas “é preciso passar à prática”. Ou seja recorrer a um psicólogo. “Fica mais fácil, para quem estiver a passar por um problema de saúde mental, recorrer a ajuda profissional” depois de ver alguns atletas icónicos, como Tiger Woods ou Simone, Biles a admitirem problemas a esse nível, na opinião de Jorge Silvério, que trabalha com o Comité Olímpico de Portugal e a Federação Portuguesa de Futebol entre outras entidades desportivas..isaura.almeida@dn.pt