Retrato de Xian Xinghai
Retrato de Xian Xinghai

Xian Xinghai: filho de Macau e músico do povo

Nascido em Macau, o músico chinês Xian Xinghai compôs nas décadas de 1930 e 1940 obras clássicas como a Cantata do Rio Amarelo, que encorajaram o povo a resistir à invasão do fascismo japonês.
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Em Macau, encontra-se a Avenida Xian Xinghai entre as poucas ruas que têm o nome de personalidades chinesas. Nascido em Macau no início do século XX numa família pobre de pescadores, Xian Xinghai revelou desde cedo um talento musical extraordinário. Estudou composição no Conservatório de Paris, mas renunciou à oportunidade de permanecer na Europa para regressar à China.

Ao testemunhar inúmeros compatriotas perderem as suas casas e famílias devido à invasão fascista japonesa, ele fez da caneta e da música suas armas. Compôs obras como a Cantata do Rio Amarelo e muitas outras peças inspiradoras, que se tornaram verdadeiros clarins para o despertar do povo chinês e para a união da força nacional durante a Guerra de Resistência contra o Japão.

Da pequena povoação piscatória da China a Paris em busca do sonho musical

Xian Xinghai nasceu em Macau a bordo de uma embarcação de pesca em junho de 1905. O pai faleceu ainda antes do seu nascimento e a mãe criou-o sozinha, sustentando a família por meio de vários tipos de tarefas - remendando redes, carregando mercadorias e trabalhando como criada.

Apesar da vida pobre numa família de pescadores que vivia sobre a água, a música estava sempre presente no quotidiano. Na infância, as canções de água salgada, cantadas em cantonês pelos pescadores de Guangdong, e os cânticos entoados pelos estivadores durante o trabalho nos portos tornaram-se a iniciação musical de Xian Xinghai.

Aos seis anos, Xian Xinghai acompanhou a mãe até Singapura em busca de meios de subsistência. Durante os estudos lá, um professor de música descobriu o seu talento musical e integrou-o na banda filarmónica da escola - foi o primeiro contacto do jovem com os instrumentos de sopro ocidentais. De regresso à China, prosseguiu a sua formação musical, primeiro na escola secundária anexa à Universidade Lingnan e, mais tarde, na Universidade de Pequim.

Uma série de selos comemorativos para assinalar o 110.º aniversário do nascimento de Xian Xinghai, emitidos em 2015 pelos Correios de Macau.
Uma série de selos comemorativos para assinalar o 110.º aniversário do nascimento de Xian Xinghai, emitidos em 2015 pelos Correios de Macau.

Em 1929, ele partiu para Paris a fim de prosseguir os estudos. No início, devido a dificuldades económicas, foi recusado pelos conservatórios locais, mas conseguiu a oportunidade de assistir gratuitamente às aulas graças ao seu talento. Em 1934, O Vento, a sua nova obra de música de câmara, conquistou a apreciação do compositor Vincent d’Indy e do violinista Paul Oberdoerffer, sendo selecionada para o Concerto de Novas Obras do Conservatório de Paris. Nesse mesmo ano, ingressou no curso avançado de composição do Conservatório de Paris, tornando-se o primeiro estudante chinês a integrar essa turma, sob a orientação do renomado compositor Paul Dukas. Sob a direção de Dukas, Xian concluiu a Sonata para Violino em Ré menor, onde integrou elementos da ópera cantonense e da escala pentatónica numa sonata de tradição europeia, causando sensação no meio musical parisiense.

Transformar a música num apelo à coesão nacional

Em 1935, Xian Xinghai concluiu o curso no Conservatório Nacional de Música de Paris com resultados excelentes. Naquela altura, a China sofria sob os bombardeamentos do fascismo japonês, e Xian, plenamente consciente do sofrimento da pátria e dos seus compatriotas, decidiu abandonar a possibilidade de desenvolver a sua carreira na Europa e embarcou de regresso à China.

De volta ao país, ele compôs mais de 300 canções de resistência que encorajaram milhões de pessoas, amplamente difundidas por toda a nação. Entre elas, a mais célebre é a Cantata do Rio Amarelo, composta em 1939, considerada uma das maiores obras musicais chinesas do século XX.

Placa toponímica da “Avenida Xian Xinghai”, em Macau.
Placa toponímica da “Avenida Xian Xinghai”, em Macau.

A peça foi composta a partir do longo poema a Cantata do Rio Amarelo, do poeta Guang Weiran, e concluída em apenas seis dias. A inspiração nasceu do Rio Amarelo, o “rio-mãe” da China, símbolo do espírito e da força do povo chinês. O andamento mais famoso - A Defesa do Rio Amarelo - combina a orquestra e técnica coral ocidentais com melodias populares chinesas, recorrendo à técnica arrebatadora do cânone, com entradas sucessivas. Não só descreve de forma vívida a imponência das ondas impetuosas do Rio Amarelo, como também retrata a cena em que chineses, vindos de todos os lugares, se reuniram e marcharam em uníssono para o campo de batalha em defesa da pátria, tornando-se uma verdadeira epopeia musical de coesão nacional.

Infelizmente, em 1945, no mesmo ano em que o fascismo japonês foi derrotado e se rendeu, Xian Xinghai faleceu, com apenas 40 anos de idade. Oitenta anos depois, a melodia da Cantata do Rio Amarelo continua a ser conhecida por todos os chineses e a sua adaptação Concerto para Piano “Rio Amarelo” foi levada a palcos internacionais por músicos como Yin Chengzong e Lang Lang.

Macau também não o esqueceu. Para homenagear este filho da cidade e grande músico do povo, Macau construiu o Museu Memorial de Xian Xinghai, ergueu estátuas comemorativas em sua memória e deu o seu nome à Avenida Xian Xinghai junto ao Centro Cultural de Macau.

Uma iniciativa do "Macao Daily News"

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