Leonor Silveira no papel de Ema, a "Bovarinha" de Vale Abraão.
Leonor Silveira no papel de Ema, a "Bovarinha" de Vale Abraão.D.R.

Vale Abraão regressa às salas de cinema

Lançado em 1993, habitualmente reconhecido e celebrado como um título central na filmografia de Manoel de Oliveira, Vale Abraão, com Leonor Silveira no papel central, está de volta aos cinemas.
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A história do cinema faz-se da revelação dos novos filmes e também, cada vez mais, do reencontro com os filmes “antigos” que, ao longo das décadas, foram conquistando um lugar nessa história. Daí o significado cinéfilo e o valor simbólico da reposição, em várias salas do país, de Vale Abraão (1993), de Manoel de Oliveira, com chancela da distribuidora Nitrato Filmes — assim se assinala também o 10º aniversário da morte do cineasta.

Em termos simples, mas muito significativos, podemos dizer que este foi o filme de Oliveira que, definitivamente, inscreveu o seu nome entre os mestres do cinema internacional. Assim se cumpriu a globalização de uma obra que, em qualquer caso, já tinha sido objecto de múltiplas formas de reconhecimento, sobretudo através de títulos como Amor de Perdição (1978) e Francisca (1981), este o primeiro confronto de Oliveira com a escrita de Agustina Bessa-Luís.

Produzido por Paulo Branco, Vale Abraão resulta de um reencontro com Agustina Bessa-Luís, tendo como base o romance homónimo (ed. Relógio D’Água) que, aliás, a autora escreveu a pedido do próprio realizador. O objetivo era “refazer” a herança do clássico de Gustave Flaubert, Madame Bovary (publicado em 1857), agora em versão moderna portuguesa.

A figura central de Ema (dita a “Bovarinha”) surge como símbolo de uma sensibilidade feminina, eminentemente poética, vivida na paisagem sensual e misteriosa do Vale do Douro — as suas emoções e impulsos geram uma biografia em que uma sensualidade vital se confunde sempre com uma perturbante pulsão de morte. Ao interpretar Ema, Leonor Silveira, embora já com algumas presenças na filmografia de Oliveira (estreara-se em 1988, em Os Canibais), encontrou o papel que, para todos os efeitos, passou a ser celebrado como o trabalho fulcral da sua “persona” cinematográfica.

Poder-se-á considerar que Vale Abraão contém marcas de um maneirismo formal que viria a condicionar algum do trabalho futuro de Oliveira (é, em qualquer caso, uma perspetiva a que o autor deste texto não é estranho). Seja como for, continua a ser uma das referências mais emblemáticas da obra “oliveireana” e, nessa medida, pode funcionar como uma boa porta de entrada nos fascínios e enigmas que povoam as suas aventuras narrativas ao longo de oito décadas.

Foi, além do mais, um dos filmes que gerou um evento verdadeiramente excecional no Festival de Cannes de 1993, mais precisamente na Quinzena dos Realizadores, com uma recepção apoteótica. Três décadas mais tarde, portanto em 2023, a mesma secção (designada Quinzena dos Cineastas a partir da edição do ano anterior) apresentou Vale Abraão em cópia restaurada pela Cinemateca Portuguesa — para o respetivo cartaz oficial, a Quinzena utilizou a imagem de Leonor Silveira, no papel de Ema, aqui reproduzida.

Leonor Silveira no papel de Ema, a "Bovarinha" de Vale Abraão.
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