Sebastian Stan, já nos filmes da Marvel se percebia o fulgor deste ator único…
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'The Apprentice' - O triunfo da mediocridade de Trump

'The Apprentice - A História de Trump' é o registo da juventude e das tropelias de Trump ou o triunfo de um vilão. Ali Abbasi não está ao nível de 'Holy Spider' mas filma também uma doença americana, a ganância. Competiu em Cannes para a Palma de Ouro.
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Apropósito de Megalopolis, de Francis Ford Coppola, tem-se falado, justamente, em coragem no cinema. A coragem de Ali Abbasi, cineasta de Na Fronteira, é a de recusar a mera caricatura ou sátira a Donald Trump nesta visão sobre a sua ascensão no mercado imobiliário em Nova Iorque. Uma coragem de recusar o óbvio e preferir fazer um estudo de personagem, tão vibrante como entretido de um homem a ficar um monstro humano. The Apprentice não destrói o caráter de Trump, apenas evoca o nascimento do trumpismo. Fá-lo de uma maneira necessária, direta e bem divertida.

Um intratável Sebastian Stan é perfeito neste Trump que começa a querer ascender socialmente nos Anos 1970, sobretudo quando se associa ao infame advogado gay Roy Cohn, rei dos compadrios e da corrupção, e se torna um nome no mundo dos investimentos de imobiliário em Nova Iorque.

Depois, filma-se o seu sucesso, ao mesmo tempo que se mostra o romance com a modelo de Leste, Ivana. Uma escalada ao Olimpo que não se afasta dos momentos em que cria uma persona, seja através de uma crueldade mesquinha, na forma como dispensa os colaboradores, como trata a família e, sobretudo, quando trai os amigos. É a pequenez de uma figura que se torna um pai ausente, tenta perder peso, faz compromissos com o crime organizado e engana a mulher. Um homem vazio, apaixonado pelo poder, que conseguiu impor uma imagem de ogre.

Pensado para poder ser uma pedra no calcanhar da campanha dos Republicanos nestas eleições, este é um filme que tenta também compreender uma fascinação por um líder ou como o sonho americano criou uma figura de pesadelo. Pena é que Abbasi, a dada altura, não tenha um golpe de asa na realização que finte a placidez de um argumento de tese, uma argumento que, em boa verdade, nunca nos surpreende, nem mesmo quando o ângulo seja o da cultura pop. É esse Trump de sorriso parvo que fez com que Hollywood o tivesse posto num pequeno papel numa das sequelas de Sozinho em Casa  e que a televisão lhe tenha dado um reality-show, nem de propósito intitulado The Apprentice

Esta semana o próprio Trump já fez uma crítica ao filme no X e denigre os responsáveis. Diz que tem pouca classe. “Pouca classe”… Melhor elogio deste “crítico de cinema” não poderia ter havido. Afinal, o visado percebe o ambiente encenado por Abbasi : classe aqui nunca poderia existir ou não estivéssemos num circo de horrores.

Ironicamente, é um filme que nos vai ficar na cabeça pelo fascínio que a personagem de Roy Cohn convoca. Uma imensa, grande personagem de cinema, só possível pelo toque negro de Jeremy Strong, um dos protagonistas de Succession. Uma interpretação certamente recompensada na temporada dos prémios na categoria de Melhor Ator Secundário. Sente-se que a personagem de Cohn (já anteriormente evocado por Al Pacino na série Anjos na América) engole Trump.

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