Ruínas de São Paulo, o que resta da fachada frontal da antiga Igreja da Madre de Deus.
Ruínas de São Paulo, o que resta da fachada frontal da antiga Igreja da Madre de Deus.

Ruínas de São Paulo: O ex-líbris da cidade de Macau

As Ruínas de São Paulo, parte essencial do Centro Histórico de Macau, são o que resta da antiga Igreja da Madre de Deus e reflexo da fusão entre as arquiteturas europeia e chinesa.
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Situada na costa sul da China, Macau é uma cidade portuária que floresceu graças ao comércio internacional e à fusão intensa entre as culturas oriental e ocidental. Em 2005, o Centro Histórico de Macau, composto por 8 largos e 22 sítios arquitetónicos de estilo europeu e chinês, foi inscrito na lista do Património Mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). Entre eles, destacam-se as Ruínas de São Paulo, o símbolo mais reconhecido da presença europeia e um dos pontos turísticos mais visitados em Macau.

As Ruínas de São Paulo são o que resta da Igreja da Madre de Deus, cuja construção teve início em 1602 e se prolongou por mais de 30 anos. Curiosamente, a fachada de granito que ainda permanece foi a última parte a ser erguida. Na altura, esta era a maior igreja da Ásia e o principal centro da missão jesuíta no Mundo Sínico, o que lhe valeu o apelido de “Vaticano do Oriente”.

Anexo à igreja funcionava o Colégio de São Paulo, fundado pelos jesuítas em 1594. Foi a primeira instituição de ensino superior de estilo ocidental no território chinês e um dos mais antigos da região. Inspirado na Universidade de Coimbra, durante mais de cem anos, o colégio formou gerações de estudiosos poliglotas. Missionários como Matteo Ricci, Giulio Aleni e Johann Adam Schall von Bell estudaram e ensinaram ali. Eles traduziram clássicos confucianos para o latim, lançando as bases da sinologia europeia, e divulgaram a ciência, tecnologia e cultura europeias junto da sociedade chinesa, impulsionando o desenvolvimento da educação moderna na região e contribuindo para o intercâmbio cultural entre Ocidente e Oriente.

Obra do pintor britânico George Chinnery(1774-1852) datada de outubro de 1834 retratando a igreja e o colégio jesuíta cem dias antes do incêndio que, em 1835, deixaria apenas a fachada.
Obra do pintor britânico George Chinnery(1774-1852) datada de outubro de 1834 retratando a igreja e o colégio jesuíta cem dias antes do incêndio que, em 1835, deixaria apenas a fachada.

Infelizmente, ao longo da história, a igreja e o colégio sofreram três grandes incêndios. O último, em 1835, foi particularmente devastador e destruiu quase todo o complexo, sobrevivendo apenas a imponente fachada em granito.

Ao observar a fachada de perto, destaca-se uma harmoniosa combinação de elementos renascentistas e barrocos, com detalhes orientais raramente encontrados noutras construções de estilo ocidental. Dividida em cinco níveis, a parede está coberta por esculturas ornamentadas. No topo, uma cruz domina a composição. Logo abaixo, uma pomba rodeada de símbolos celestes simboliza a criação do mundo. Os níveis seguintes retratam a Paixão de Cristo, a Virgem Maria entre peónias e crisântemos, flores emblemáticas da China e do Japão, além de inscrições em chinês com mensagens morais, tais como “Recorda-te da morte e evita o pecado”. Há ainda leões esculpidos ao estilo tradicional chinês, nuvens estilizadas e figuras de santos jesuítas. Acima da entrada principal, está gravada a inscrição latina “Mater Dei” (Mãe de Deus) e, nas portas laterais, o emblema da Companhia de Jesus - “IHS”.


Detalhe do terceiro nível da fachada: à esquerda, a Virgem guia uma caravela portuguesa, simbolizando proteção divina; à direita, pisa um dragão de sete cabeças, representação da vitória sobre o mal.
Detalhe do terceiro nível da fachada: à esquerda, a Virgem guia uma caravela portuguesa, simbolizando proteção divina; à direita, pisa um dragão de sete cabeças, representação da vitória sobre o mal.Guan Zhe

Hoje, as Ruínas de São Paulo continuam a ser o símbolo vivo do Centro Histórico de Macau, tendo testemunhado não só a chegada do cristianismo à região, mas também a rica interação entre as artes, a arquitetura e a espiritualidade de duas culturas. Este monumento inspirou o pavilhão de Macau na Expo 98, em Lisboa, e uma réplica em escala reduzida encontra-se hoje exposta no Parque da Cidade de Loures, prova da ligação duradoura entre os dois países.

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