Evocando a vida e as canções de Charles Aznavour (1924-2018), o filme Monsieur Aznavour faz-nos reencontrar um velho problema: o casting de grandes nomes da música popular. A saber: qual o ator ou atriz com capacidade para “recriar” uma determinada figura fortemente enraizada no imaginário coletivo? Por vezes, essa “recriação” parece condenada desde o início - penso, por exemplo, em Rami Malek a interpretar Freddie Mercury, em Bohemian Rhapsody (2018). Noutros casos, a “fusão” com a figura retratada surpreende pela inesperada justeza dramática - aconteceu, a meu ver, no caso de Renée Zellweger, em Judy (2019), sobre Judy Garland (curiosamente, ambos os intérpretes citados foram “oscarizados”).Agora, em Monsieur Aznavour, o problema torna-se evidente desde o princípio. De facto, parece difícil “reconhecer” em Tahar Rahim (notável em Um Profeta, realizado em 2009 por Jacques Audiard) a pose, a energia, o misto de rudeza e sofisticação que distinguiam Charles Aznavour. Será um problema de tratamento do rosto? Em boa verdade, a caracterização, com diferenças que vão acompanhando a passagem das décadas, parece “prender” o ator numa exigência de “duplicação” que condiciona a verdade física e dramática da própria personagem.Dito isto, o filme dirigido por uma dupla - Mehdi Idir e Grand Corps Malade (nome artístico do cantor e poeta Fabien Marsaud) - exibe as virtudes e limites de uma conceção rudimentar do género biográfico, entendido como “ilustração” mecanicista de um destino individual, apoiada nos chamados efeitos de “reconstituição”. Por vezes de forma francamente esquemática, como acontece com o uso de material documental para ilustrar as raízes arménias de Aznavour.Seja como for, na competência profissional da sua fabricação, Monsieur Aznavour é um inequívoco reflexo das qualidades de produção dos estúdios franceses. Com um suplemento que, neste caso, importa sublinhar: mesmo com todas as suas limitações, o filme obriga-se a criar tempos narrativos que permitam ao espetador escutar as canções que fazem a história e a mitologia de Aznavour. J.L. .“Espelho meu, espelho meu...” Branca de Neve e o reflexo da sobrevivência .Paris como mapa de histórias cruzadas.Um retrato feminino vindo da Índia