Metallica como o vinho do Porto: quanto mais velhos melhor

Ao terceiro dia do festival Nos Alive a enchente que se deslocou ao passeio marítimo de Algés para ver Metallica foi presenteada com um dos melhores concertos da banda norte-americana em Portugal.
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Lars Ulrich o baterista dos Metallica, já no final do concerto do Nos Alive, que encerrou a turnée europeia da banda, e quando os quatro elementos da banda de São Francisco vieram agradecer ao público disse que "guardamos o melhor para o fim". Pela energia que foi posta que em palco tinha razão. Mas tal como Ulrich, vamos guardar o melhor destas linhas para o fim. A memória no futuro pode ser traiçoeira, mas houve mais música no Nos Alive antes de Metallica.

Depois do rap de AJ Tracey, o rock tomou conta do palco principal do Alive. O vocalista/baixista do duo britânico Royal Blood, Mike Kerr, começou logo por atiçar o público dizendo que deviam gritar mais com as suas músicas.

O duo - que conta com músicos convidados para fazerem as atuações ao vivo - tocou musicas dos seus três álbuns com especial incidência para o mais recente Typhoon (2021).

Apesar do som, consistente, e da animação do outro membro da banda, o baterista/teclista Ben Thatcher fez questão de se levantar da sua bateria para interagir com o público.

Pareceu que havia palco a mais para os Royal Blood. Na audiência, esperava-se por Metallica e as cabeças já abanavam no mar de tshirts pretas que invadiu o passeio marítimo de Algés. Contudo, o duo de Bristol cumpriu e fez pensar se, de facto, o rock não está mesmo a regressar e a conquistar um público mais novo.

No meio da assistência, Joana Costa de 20 anos, confirmava. "Gosto muito do rock que eles tocam, o vocalista tem uma grande voz".

Os Royal Blood que têm uma versão bem conseguida de Sad But True dos Metallica (que não foi tocado pelo britânicos) cumpriram a sua missão de aquecer o público para o que vinha a seguir no palco principal.

Ainda os Royal Blood tocavam no palco principal, e já o palco Heineken (o secundário) se preparava para receber St. Vincent. Às 21h50 em ponto - como estava no programa -, apagavam-se as luzes e a reação era apoteótica. Quem ali estava, sabia ao que ia e não era por acaso que, dentro da tenda onde está o palco, se passava, voluntariamente, por tanto calor.

Já os músicos estavam em palco quando, num vislumbre, Annie Clark (nascida para a música como St. Vincent) entrava por uma ponta do palco e saía pela outra... para voltar a entrar novamente mas desta feita já com a indumentária a condizer com o ambiente estético a puxar aos anos 70 muito presente no último disco. Arrancando com Digital Witness (de 2014), foi logo possível perceber: o público estava nas palmas das suas mãos.

E foi justamente nas mãos das primeiras filas que St. Vincent - ao fim de cinco músicas e depois de convidar a um brinde ("É estupidamente incrível pensar que estamos aqui reunidos outra vez, brindemos!") - acabou por ir parar. Isto porque, a meio de New York (retirada do muito aclamado Masseduction, de 2017), a norte-americana decidiu ir para a grade e cantar por entre apertos de mão e vídeos gravados com telemóveis da plateia. Se dúvidas havia, dissiparam-se nesse momento: além de uma compositora que se reinventa a cada disco, Annie Clark é, também, uma entertainer que tem espetáculo para dar e vender. Mantendo-se em modo Masseduction, seguiu-se Los Ageless, na qual, de guitarra em riste, St. Vincent encarnou a figura de femme fatale e, com um solo carregado de efeitos, mostrou que não se tratava apenas de (mais) um adereço cénico. Cenário esse que, a meio do concerto (de pouco mais de uma hora, com 14 músicas), mudou de figurino quando, em Sugarboy, as três coristas que acompanham St. Vincent nesta digressão agarraram em luzes e as passearam pelo palco, com a artista na sombra, dançando com cada um dos músicos.

No final do concerto (e da digressão, que teve em Lisboa a sua última paragem), as certezas eram muitas: St. Vincent, à semelhança do que fazia Bowie, é uma artista que cria em cada álbum pequenos universos conceptuais que acabam por se traduzir para palco. Ao mesmo tempo assume toda a sua feminilidade e empoderamento. No fim, a soma de todas as partes resulta em algo concreto: charme. E, a julgar pelo concerto de sexta-feira no palco Heineken, é coisa que não falta a St. Vincent e o público sabe-o bem.

Cerca de 10 minutos depois da hora prevista (23h) a música de Ennio Morricone e as imagens do filme O Bom, o Mau e o Vilão (1966) de Sérgio Leone deram o sinal que James Hetfield (voz e guitarra) Kirk Hammett (guitarra), Robert Trujillo (baixo) e Lars Ulrich (bateria) estavam prestes a entrar em palco.

Com néons vermelhos, a banda de São Francisco começou a atuação com o clássico Whiplash (de 1983) e James Hetfield a gritar por "Lisboa" com a sua voz grave e de punhos serrados.

Com um alinhamento de musicas idêntico ao concerto anterior, em Madrid , Enter Sandman fez o público -mais novos e menos novos - que esgotou os bilhetes do terceiro dia de festival cantar em uníssono.

À medida que o concerto foi decorrendo, notava-se na cara dos membros da banda o gozo que lhes estava a dar o concerto de Lisboa. Talvez por ser o último da digressão europeia.

Mas ao invés de cansaço, mostraram uma energia que muitas bandas mais novas não têm. Os Metallica, que já contam com 41 anos de carreira, tocaram a grande maioria dos seus clássicos e, curiosamente, pouco ou nada tocaram dos três últimos álbuns (contam com 11).

O baterista Lars Ulrich saiu da sua bateria e veio cumprimentar o público. E James Hetfield, com uma voz melhor que nunca, disse que era muito bom estar com a família Metallica. "Novos e mais velhos fazem todos parte da família Metallica", disse.

Seguiram-se mais êxitos: Wherever I May Roam, a balada Nothing Else Matters - que mais uma vez o público cantou e empunhou os smartphones para gravar o momento. Sad But True, a versão da música tradicional irlandesa Whiskey in a Jar e Seek and Destroy foram as últimas músicas antes do encore.

A banda regressou ao palco para terminar em apoteose com Damage, One e a terminar com o clássico Master of Puppets que ultimamente, e muito graças à série da Netflix Stranger Things, tem conquistado um público mais jovem.

Com a bandeira de Portugal nos ecrãs e fogo de artifício a banda terminou um dos melhores concertos em solo português, senão o melhor.

Ao fim de duas horas de concerto, ao qual os Metallica estão bem habituados, notava-se felicidade na carad os músicos. Tanto que já um par de minutos depois do final do concerto , ainda em palco e já sem os seus instrumentos cada um dos músicos agradeceu à audiência com algumas palavras - Trujillo falou em português - e Lars Ulrich disse a frase com que começou este texto: "Parece que guardamos o melhor concerto para o fim da turné". Pareceu mesmo! E assim, os quatro membros da banda, nascidos entre 1963 e 1964 provaram que velhos são os trapos.

Depois das atuações de Florence + The Machine e Metallica os Da Weasel vão ter que dar tudo para subirem ao pódio dos melhores concertos da edição deste ano do Nos Alive.

São os cabeça de cartaz, a par dos Imagine Dragons, este sábado, o quarto e ultimo dia do NOS ALIVE 2022.a

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