HBO vai apostar na fantasia e na mensagem política

<em>His Dark Materials, The Righteous Gemstones</em> e<em> Watchmen</em> são os próximos grandes acontecimentos televisivos da HBO. O DN esteve nos encontros de verão com a imprensa internacional em Los Angeles e espreitou o que aí vem.
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Jeremy Irons, James McAvoy, John Goodman e a oscarizada Regina King são as estrelas da nova vaga de conteúdo da HBO. O gigante televisivo esteve esta semana nos TCA, os encontros de imprensa em Los Angeles, e o Diário de Notícias assistiu ao lançamento das novidades. Em pleno Hotel Beverly Hilton, casa dos Golden Globes, puderam ser vistas as primeiras imagens de blockbusters do pequeno ecrã com a chancela HBO.

A maior aposta será o imaginário da fantasia distópica, sobretudo em duas séries para colmatar a ressaca do fim de Game of Thrones, neste caso Watchmen, escrita por Damon Lindelof (um dos cérebros de Lost) e His Dark Materials, a partir dos livros de Philip Pullman, material que já tinha servido para o cinema, neste caso para o fracasso A Bússola Dourada, de Chris Weitz, com Daniel Craig e Nicole Kidman.

De Watchmen, a partir da novela gráfica de Dave Gibbons e Alan Moore, o primeiro episódio mostrado em Los Angeles dá para garantir uma escala cinematográfica empolgante. Para além do mais, a série denota uma negritude bastante explícita, expondo um futuro onde a América é presidida por Robert Redford e onde vigilantes de supremacia branca atacam as forças policiais. Um cenário bastante diferente dos próprios mandamentos do livro de Alan Moore. Quem estava à espera de uma variação do filme de Zack Snyder bem que pode tirar o cavalinho da chuva - este Watchmen tem uma mensagem política feroz e que faz rima com a própria situação do regime de Trump. Sente-se um tom pessimista que faz lembrar a fábula futurista de Os Filhos do Homem, romance de P.D. James que em 2006 foi muito bem adaptado ao cinema por Alfonso Cuáron.

Watchmen terá grandes possibilidades de chegar como favorito na temporada dos prémios, nomeadamente na categoria dos atores: Jeremy Irons é um vilão com sotaque britânico assustador e Regina King imperial como agente sobrevivente da polícia. Aqui, os super-heróis são vistos como foras-da-lei. A inspiração vem dos ataques raciais de Tulsa, em 1921, conforme Damen contou no painel destes lançamentos HBO: "Quando aprofundei melhor sobre o que se passou nesses massacres de 1921 fiquei confuso e envergonhado. E aí a minha ideia foi aproveitar o conteúdo de Watchmen e refletir sobre raça e policiamento na América. O que é interessante nas bandas-desenhadas do Watchmen é que não sabemos bem o que é História e ficção. De facto, em 2019 percebemos que a supremacia branca não está derrotada. Senti que era uma oportunidade formidável para abordarmos estes temas". A série estreia em Portugal na HBO Portugal em outubro, tal como His Dark Materials, grande produção que mete ursos gigantes, um mundo de fantasia paralela e uma visão também política sobre totalitarismo. Lyra, uma adolescente, é a heroína de uma aventura que a leva até ao Norte numa sociedade onde todos somos vigiados e em que também qualquer ser humano tem como companhia um animal alma-gémea. Lyra tenta seguir a pista que lhe permite salvar o seu melhor amigo, uma das muitas crianças misteriosamente raptadas.

His Dark Materials é feito com um orçamento gigante e, tal como Game of Thrones, não poupa nos efeitos visuais e cenários de fantasia. O elenco mistura atores famosos do cinema, como James McAvoy, Ruth Wilson e Lin Manuel Miranda, um dos protagonistas do último Mary Poppins. Do primeiro episódio visto ainda sem os efeitos digitais finalizados, destaca-se uma carga trágica fora do vulgar no que toca ao género da fantasia. Sente-se também que os detalhes literários da escrita de Pullman são respeitados e não haverá abreviações como acontecia no incompleto filme de Chris Weitz. Trata-se de um acontecimento televisivo para adultos que as crianças podem e devem ver. E tal como Dafne Keen (a revelação de Logan), a adolescente protagonista, contou a todos os convidados da HBO, esta é uma série com subversão pura de ficção-científica: "o Magisterium é aqui uma espécie de Big Brother, do 1984, do Orwell. A mensagem não creio que seja do ponto de vista religioso, é antes uma crítica às ditaduras políticas. Acho que é uma crítica à opressão". E acha bem: num mundo com tanto novo fascismo, este His Dark Materials é entretenimento para abrir os olhos e a mente.

Na "label" HBO Comedy o prato forte desta apresentação foi A Black Lady Sketch Show, de e com Robin Thede, uma sitcom baseada em sketchs sempre com o tema da representação da mulher negra americana na sociedade dos nossos dias. Thede ensaia um discurso feminista liberal sobre a condição das mulheres afro-americanas num país racista. Do que se conseguiu ver de Black Lady Sketch Show advinha-se um sucesso de escala mais doméstica. O material de humor é bastante específico a um grupo etário demarcado, a geração de 80 e os temas não têm espessura para sair de um contexto bem americano. Temas esses que vão desde a sátira à religião, sexo, identidade e relações. Grita-se muito e Robin mais um grupo de comediantes conseguem transformar-se em mil e uma personagens.

"Esta série tem muitos tons, é como se fosse uma amálgama de 40 curtas-metragens! Vamos do terror ao thriller, passando pelo musical. Quis mostrar que as mulheres afro-americanas são capazes de tudo e quis também afastar-me dos clichés. Por exemplo, não temos nenhum sketch a gozar com o nosso cabelo de negra...", afirmou em alto e bom som a criadora da série. A Black Lady Sketch Show vem da escola de programas como Saturday Night Live e na América pode causar controvérsia, coisa que a HBO espera rentabilizar. Em Portugal estará já disponível para a semana.

Bem mais aplaudida no Beverly Hilton foi The Righteous Gemstones, sátira em parte realizada por David Gordon Green, cineasta de Prince Avanlanche e Joe, e criada pelo comediante Danny McBride. Dos episódios transmitidos dá a ideia de que a HBO encontrou ouro neste conceito que brinca com a fortuna dos ideólogos das igrejas televangelistas. Um gozo que é explicitado através das desventuras dos Gemstones, uma família que ganhou fortuna com a sua igreja. Temas como desvio, novo-riquismo e ganância são explorados com um humor seco e adulto. Será também o "show" televisivo que dará a Danny McBride a sua definitiva consagração, sobretudo após o sucesso de Vice Principals. John Goodman e Adam Levine completam o elenco que nestes encontros com a imprensa internacional confessou a vontade de continuar com mais uma temporada. Para o criador, The Righteous Gemstones é sobre o que acontece quando temos tudo o que podemos ter: "e é também sobre o mau gosto. É terrível ficarmos mimados, podemos ficar realmente prejudicados. Cabe ao nosso público decidir como se sente perante estes trafulhas. Trafulhas mas atenção: eles acreditam no que dizem! Só que o negócio da igreja cresceu tanto que, algures, todos se perderam".

The Rigtheous Gemstones tem as melhores gargalhadas da próxima temporada da televisão americana. Ao DN, David Gordon Green confessou que sonha voltar a Portugal, depois de ter sido um dos realizadores em destaque no LEFFEST de 2015.

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