Há 20 anos a viver na Idade do Gelo

A partir de hoje, no Disney+, há novo título da série A Idade do Gelo. Recuperando a personagem a que Simon Pegg deu voz desde o princípio, As Aventuras de Buck é uma adição tresloucada e familiar no universo animado que continua a fazer as delícias dos fãs.
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Há 12 anos que eu vinha dando dicas sobre isto. Comentários do género: "o Buck devia ter a cena dele". Simon Pegg começa assim o discurso orgulhoso sobre o regresso à sua personagem, que vem acrescentar o sexto filme a uma das franchises mais bem-sucedidas do cinema de animação. Na conferência virtual em que o DN participou sobre este A Idade do Gelo: As Aventuras de Buck, com um painel composto também pelo realizador John C. Donkin, a produtora Lori Forte e uma das novas vozes no elenco de animais, Justina Machado, imperou a ideia de que Ice Age só precisa de saber tirar partido das suas personagens para expandir a série que tantas alegrias tem dado por esse mundo fora. E não há como negar: com o seu charme de paródia pré-histórica, os filmes continuam a procurar uma energia infantil que introduz algumas lições de vida mais crescidinhas.

Nesta nova entrada da série, só disponível no Disney+, os dois irmãos gambás Crash e Eddie, irresistivelmente traquinas, estão decididos a sair debaixo da asa - salvo seja - da irmã adotiva, a mamute Ellie que os trata como crias passando o tempo preocupada com as consequências do seu espírito aventureiro. Sem dar cavaco, a dupla foge para longe do bando (formado pela preguiça Sid, o mamute Manny, marido de Ellie, e o tigre-dente-de-sabre Diego) à procura de emoções fortes e rédea solta. Qual o melhor lugar para esbarrar com a atração do perigo? O Mundo Perdido, evidentemente.

"O Mundo Perdido foi algo que inventámos há muito tempo, quando estávamos a fazer pesquisa para o primeiro filme, e alguém do Museu de História Natural veio ter connosco e disse: "Façam o que fizerem, certifiquem-se de que não põem dinossauros com mamutes, porque eles estão separados por milhões de anos...", conta Lori Forte, a produtora que faz questão de lembrar que "vive na Idade do Gelo" há 20 anos. A solução para não misturar espécies de forma tosca foi então criar "uma mitologia acerca de um mundo debaixo dos nossos pés, onde os dinossauros existem... Talvez não tenham sido extintos durante o impacto do asteroide, talvez alguns tenham ido para o subsolo e sobrevivido."

É nesse Lost Word debaixo do gelo que damos com o famoso Buck Wild, a doninha de pala no olho a que Simon Pegg deu vida desde o primeiro filme em que apareceu, A Idade do Gelo 3: Despertar dos Dinossauros (2009). "Já passou algum tempo desde a última vez que o vimos - regressou em A Idade do Gelo 5: O Big Bang [2016], precisamente porque o Simon não parava de perguntar quando é que recuperávamos a personagem -, e agora, no momento de contar uma nova história dentro do universo Ice Age pareceu-nos muito natural voltar ao Mundo Perdido e a Buck, porque é uma personagem que toda a gente gosta", sublinha Lori. E a verdade é que os putos histéricos Crash e Eddie veem nele o modelo do grande aventureiro. Que é como quem diz, um herói solitário que habita uma terra de perigo sem grandes preocupações, mas com relativo sentido de alerta.

O ator britânico tinha genuinamente saudades da personagem: "Eu adoro o Buck. Tenho uma grande afeição por ele, até porque nasceu ao mesmo tempo que a minha filha. Quer dizer, a primeira vez que o interpretei foi no ano em que minha filha nasceu, e ela cresceu com estes filmes, cresceu com ele. Por isso, não sinto mais nada senão alegria por interpretar uma personagem que tem este tipo de ressonância emocional para mim e para a minha própria família." Mas voltar a dar-lhe voz não foi propriamente peanuts. "O Buck agora está numa espécie de memória muscular minha. Só tive de dormir muito antes das sessões de gravação porque eram sempre extremamente enérgicas... Fazes uma sessão e no final ficas exausto porque puseste tudo na voz. Repare-se que quando estás numa performance de ação ao vivo, tens gestos e expressões em que te apoiar." É essa a diferença para quem molda personagens a partir do aparelho vocal.

E aí o ponteiro da conversa vira para Justina Machado, a americana de Porto Rico que dá voz a Zee, a nova personagem que é o contraponto feminino de Buck, uma "guerreira social" com o perfil certo para comandar a operação que visa salvar o Mundo Perdido das garras de um dinossauro vilão. Sobre o efeito da presença dela, Pegg faz uma observação interessantíssima partindo do seu próprio boneco animado: "Uma das coisas importantes, para mim, em termos de Buck, é que ele traz ao filme um subtema muito doce... É uma questão bastante masculina: a capacidade de pedir ajuda. Buck é tão solitário, está tão acostumado a fazer tudo sozinho, que a ideia de confiar nos seus amigos, ou confiar em alguém para fazer outra coisa, é um pouco desconfortável para ele. E no filme ele aprende que não é apenas bom pedir ajuda, mas também pedir ajuda a uma amiga, a uma rapariga, e confiar nela para assumir o controle. Buck faz uma verdadeira jornada nesse sentido. Acho que muitos rapazes crescem ensinados a não pedir ajuda porque "parece pouco masculino", o que é muito nocivo." No final, o ator pede desculpa por tornar o assunto tão sério, mas claro que o que quer que passe nas entrelinhas de As Aventuras de Buck é sempre num estilo "ridiculamente tonto, implacavelmente divertido".

Por sua vez, John C. Donkin, que se estreia na realização depois de ter produzido alguns dos títulos da franchise, valoriza aquilo que pode bem ser a razão pela qual A Idade do Gelo continua a gerar simpatia: "Há aquela bela frase de Sid no primeiro filme: "Somos o bando mais estranho de sempre." Porque é um tigre-dente-de-sabre, uma preguiça, um mamute e um bebé humano. Ou seja, está no ADN de toda a série a tendência para olhar a família, antes de mais, como algo cumulativo, que está em constante crescimento. E não tem que ver necessariamente com ligação de sangue, é mais uma lealdade, neste caso, entre animais. Isso tem sido temático em todos os filmes." Claro. Também em As Aventuras de Buck a escapadela dos manos irrequietos Crash e Eddie não se traduz em falta de carinho pela mamute Ellie e o resto do grupo. Mais coisa menos coisa, chega-se sempre à conclusão que a família improvisada é uma bênção. E na hora em que mais precisamos dela, não falha.

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