Dez anos da Casa das Histórias "foram muito importantes" para Paula Rego
O realizador Nick Willing, filho de Paula Rego, considera que os dez anos de existência do museu Casa das Histórias, em Cascais, que acolhe o acervo da pintora, "foram muito importantes para a carreira" da artista residente em Londres.
Ponto de passagem de milhares de turistas portugueses e estrangeiros, o museu, criado em 2009, cumpre uma década de existência na quarta-feira, 18 de setembro, na sua missão de acolher, divulgar e preservar a obra de Paula Rego.
"Paula Rego é uma figura internacional, e, por isso, muitas das obras têm viajado para outros museus que as pedem para exibição, mas este é especial porque tem investigação, mais ligações a outros artistas, e também à História de Portugal e de Paula Rego", comentou Nick Willing, em entrevista por telefone à agência Lusa.
O realizador, que reside habitualmente no Reino Unido, e viaja muito pelo mundo devido aos seus projetos no cinema, tem acompanhado o projeto da Casa das Histórias Paula Rego a pedido da mãe, desde a inauguração. "Para nós é algo mais profundo e especial do que a exibição da obra da mãe noutros países", sublinhou, sobre o museu em Cascais que agora cumpre dez anos.
Nascida em Lisboa, em 1935, Paula Rego deixou Portugal ainda adolescente, durante a ditadura de Salazar, para fazer os estudos na Slade School of Art, em Londres, cidade onde se radicou e vive com a família desde 1972.
"Este é um dos museus portugueses mais conhecidos noutras partes do mundo. É realmente internacional. Ver isso é, para a Paula, e para mim, um dos maiores prazeres que nós temos. Continua a ser muito bem visitado, com portugueses e estrangeiros que vão lá especialmente para ver a obra da mãe", apontou.
Nick Willing, realizador do filme "Paula Rego, Histórias & Segredos" (2017), disse à Lusa que fica "sempre um bocadinho surpreendido com tantos visitantes - e cada ano há mais - mas é porque são lá mostradas obras que nunca foram vistas".
A Casa das Histórias Paula Rego recebeu 630 mil visitantes desde a abertura do museu. Contactada pela agência Lusa, fonte do museu indicou que o aniversário da abertura - a 18 de setembro - será assinalado no fim de semana de 21 e 22 seguinte, com atividades preparadas pelo Serviço Cultural e Educativo do Bairro dos Museus, integradas numa "programação especial".
Nesse fim de semana, no sábado, às 15:00, e no domingo, às 11:00, decorrerá a iniciativa "Conta-me Histórias - Por 10 Anos com Histórias...", para crianças com mais de quatro anos, em que várias personagens criadas por Paula Rego são recuperadas, às 10:30, e reinventadas.
No sábado também decorrerá a Oficina de Gravura III, que acontece a par da exposição dedicada à obra gráfica de Paula Rego, "Olhar para dentro", para explorar diversas técnicas usadas pela artista na criação da sua obra gráfica, num programa para diversos públicos.
A Casa das Histórias Paula Rego alberga uma coleção composta por 620 obras. Esta coleção é constituída por pintura, desenho e gravura, reflete o seu percurso artístico, de cerca de 50 anos, e inclui também obras do seu marido, o artista britânico Victor Willing (1928-1988).
A coleção integra ainda uma obra têxtil de grandes dimensões, e parte do seu acervo documental.
Durante o período de dez anos de existência do museu, "a coleção tem vindo a ser alvo de uma excecional internacionalização devido a itinerância de muitas das obras em museus artísticos de referência", nomeadamente, a Pinacoteca de S. Paulo, no Brasil, o Museu de Arte Contemporânea de Monterrey, no México, e a House of Illustration, em Londres, no Reino Unido.
O estabelecimento do acervo deve-se à doação de Paula Rego da totalidade da sua obra gravada, que ascende a 267 exemplares, a que se junta um conjunto inédito de 273 desenhos.
A título de empréstimo, Paula Rego cedeu à Casa das Histórias recentemente 28 pinturas da sua autoria, particularmente da produção dos anos 1980 - as séries "Óperas", "The Vivian Girls", "Dentro e Fora do Mar" -, mas onde pontuam alguns trabalhos emblemáticos dos anos 1960, como "Sempre às Ordens de Vossa Excelência", "Quando Tínhamos uma Casa no Campo", e "Centauro".
Também há obras dos anos 1990, como "Anjo", "Amor", "Entre as Mulheres".
O marido, Victor Willing (1928-1988), está representado com 15 pinturas a óleo, de finais dos anos 1950 - "Aborrecimento Precário" -, dos anos 1970 - "Lugar" -, e com os últimos trabalhos da sua carreira, datados da segunda metade dos anos 1980, "Falhado" e "Ascot".
Acresce ainda uma coleção de 34 desenhos e estudos preparatórios de figura e composição para obras pictóricas executadas nas décadas de 1980 e 1990.
De acordo com o presidente da Fundação D. Luis I (responsável pela gestão do museu), Salvato Teles de Menezes, o protocolo, que agora termina entre a pintora Paula Rego e a Câmara Municipal de Cascais, "será renovado em termos praticamente idênticos, com alguns ajustes que vão permitir o aprofundamento da relação" entre as partes.
"O contrato original foi feito com a câmara, que é a proprietária das obras e a Fundação D. Luís I é a responsável pela gestão logística, administrativa e financeira da Casa das Histórias, cujo financiamento também é da autarquia", recordou o responsável.
Teles de Menezes disse à Lusa que as partes envolvidas "já concordaram com a renovação por mais dez anos, e a assinatura deverá ser realizada entre final de setembro e início de outubro".
"Chegou a correr a ideia de que a pintora ponderava levar o seu acervo para fora de Portugal, mas nada disso é verdade", disse o responsável, referindo-se a notícias de que Paula Rego quis acabar com o projeto quando a sua fundação foi extinta, em 2015, no âmbito de uma reestruturação do universo das fundações do país, levada a cabo pelo anterior governo.
Para o final deste ano, está a ser preparada uma nova exposição intitulada "Sketchbook", que deverá reunir cerca de 60 desenhos e esculturas da artista, de acordo com o filho da artista.
Paula Rego é a única artista mulher do grupo da Escola de Londres, que se distingue por uma obra fortemente figurativa e literária, considerada incisiva e singular pela crítica de arte.
Nessa época, Paula Rego conviveu com nomes de destaque da pintura como Francis Bacon, Lucian Freud, Frank Auerbach e David Hockney.
Foi na Slade School of Fine Art, onde frequentou o curso de pintura entre 1952 e 1956, que veio a conhecer o marido, o artista britânico Victor Willing.
"Em Inglaterra, a Paula Rego é conhecida como uma artista inglesa. Os ingleses gostam muito dela", comentou o filho, acrescentando que a pintora, nascida em Lisboa, em 1935, está a preparar uma exposição retrospetiva para ser apresentada em Londres, na Tate Britain, em 2021. A Tate Britain é uma das galerias mais conceituas do Reino Unido e a nível internacional, e já realizou retrospetivas dedicadas a artistas consagrados como Lucian Freud ou Francis Bacon.
"A minha mãe continua a trabalhar todos os dias", disse Willing sobre o quotidiano da pintora que foi condecorada este ano com a Medalha de Mérito Cultural do Ministério da Cultura de Portugal.