Como manter a tradição deu prémio a dupla de arquitetos portugueses
A Cinemateca Portuguesa e o ANIM - Arquivo Nacional de Imagem em Movimento. O edifício da câmara municipal de Odemira, a biblioteca pública de Portel e o Museu Arqueológico de São Miguel de Odrinhas, em Sintra. Cinco edifícios públicos que têm em comum a assinatura dos arquitetos portugueses Alberto Castro Nunes e António Maria Braga, que esta quinta-feira recebem em Madrid o prémio Rafael Manzano da Nova Arquitetura Tradicional em 2019.
O galardão é atribuído a profissionais que defendam modos de construção apoiados em formas e técnicas tradicionais. O júri reconhece que os portugueses se "têm destacado na prática das tradições arquitetónicas portuguesas, tanto na realização de novos edifícios clássicos e vernáculos, responsáveis na maior parte por diversas administrações públicas, assim como pelas suas intervenções em edifícios existentes".
Alberto Castro Nunes e António Maria Braga defendem métodos construtivos tradicionais, uma continuidade com as formas anteriores ao modernismo e, sempre que possível, sem betão ou cimento, materiais mais poluentes e menos duráveis do que a cal que com a construção industrializada foi caindo em desuso, mas da qual foram feitos edifícios tão antigos como o templo de Diana, em Évora, ou o Parténon, em Atenas.
"No desenvolvimento destes trabalhos é evidente o forte compromisso com os materiais naturais e os ofícios tradicionais da construção, procurando que as suas obras se caracterizam pela sua durabilidade, sustentabilidade e pela sua beleza", salienta o júri sobre os premiados.
Formados em Arquitetura em 1980 na Escola Superior de Belas Artes, em Lisboa, contam que quando saíram a faculdade sabiam pouco sobre arquitetura. Pertencem a uma "fornada" que quis pôr em causa as linhas retas e o betão - um pós-modernismo que até meados dos anos 90 era aceite com naturalidade. "Havia uma vontade de dominar o modernismo dominante", contam na sua apresentação oficial.
Começaram a trabalhar juntos quando começaram a fazer trabalhos grandes, predominantemente edifícios públicos. Um dos primeiros foi o tribunal de Foz Côa, onde já foram à procura de elementos da arquitetura regional. Um dos maiores projetos foi o ANIM, em Loures. "O que nos preocupa é que a tradição se mantenha no que projetamos", diz Alberto Castro Nunes. "E integrar os edifícios nos locais onde são construídos, preocupa-nos a construção em continuidade com a historia".
"Trata-se em geral de obras de pequena escala, ou decompostas em elementos que são capazes de recompor a mesma, que conseguem curar os tecidos urbanos nos quais estão inseridas, e que recuperam o equilíbrio com a natureza e com a cultura local. Além disso, a utilização das formas clássicas e vernáculas não está isento de criatividade e originalidade, o qual demonstra a mestria arquitectónica", acrescenta o júri composto por arquitetos dedicados ao estudo da nova arquitetura tradicional (e, entre eles, o vencedor de 2017, o português José Baganha).
"Cada um dos trabalhos constitui um verdadeiro manifesto sobre a formação cívica, o respeito pelas características próprias de cada sítio, o humanismo e a dedicação da comunidade", diz ainda a nota do júri, em sintonia com os propósitos que levaram o filantropo norte-americano Richard H. Driehaus a criar um fundo - e um prémio de 200 mil euros - de preservação da arquitetura clássica e vernacular, instituído em 2003, nos antípodas do Pritzker, o mais conhecido dos prémios de arquitetura e atribuído já a dois arquitetos portugueses - Siza Vieira (1992) e Souto Moura (2011).
O prémio Rafael Manzano, assim designado em homenagem do arquiteto espanhol, académico e estudioso do classicismo ocidental e islâmico, tem um valor de 50 mil euros e é atribuído desde 2012 e em Portugal desde 2017. É organizado pela rede INTBAU - International Network for Traditional Building Architecture and Urbanism, uma organização fundada e patrocinada por Carlos de Inglaterra e implementada em Portugal pela Fundação Serra Henriques.