Celebrar a Cultura em Aveiro ao longo de todo o ano
De que forma o mote “O ano como palco. Um cenário infinito” se alinha com a visão que Aveiro tem para Capital Portuguesa da Cultura? Qual é a mensagem central que a organização deseja transmitir através deste tema?
José Ribau Esteves (JRE) - A Câmara Municipal de Aveiro, ao longo dos últimos dez anos, fez uma aposta estratégica na Cultura. Elaborou o seu Plano Estratégico para a Cultura para a década atual; qualificou de forma relevante a oferta cultural, com sede no Teatro Aveirense; assumiu a gestão do Museu de Aveiro / Santa Joana, no âmbito do processo de descentralização; implementou um novo conjunto de eventos marcantes da agenda cultural, com destaque para o Festival dos Canais; e apostou num processo de capacitação sob o pretexto da candidatura de Aveiro a Capital Europeia da Cultura 2027. É nesse âmbito que surge o conceito “O ano como palco. Um cenário infinito”, como um símbolo de união e interceção, síntese do processo de crescimento e capacitação em que temos vindo a trabalhar com sucesso. Pretendemos reforçar Aveiro não só como um lugar de cultura, de criação, de património e de contemporaneidade, mas também como um território inclusivo e plural, de horizontes abertos, um território sempre ambicioso e com uma imensa vontade de abraçar a imensidão de oportunidades e de dinâmicas que se irão gerar a partir deste ano 2024. É a demonstração do cenário infinito e da envolvência da comunidade que pretendemos em torno do projeto e do Território.
Quais foram os maiores desafios que a organização enfrentou ?
JRE - Foi um grande desafio desenhar a primeira Capital Portuguesa da Cultura. Os principais desafios foram o tempo reduzido para a sua construção e programação, o facto de o modelo de gestão ser totalmente interno, sem externalizações, e construído pelas estruturas técnicas da câmara municipal, num contexto de grandes dinâmicas de trabalho internas com múltiplas frentes, e, simultaneamente, garantir um programa ambicioso, de qualidade e diferenciador e que fizesse face aos objetivos delineados. É nossa profunda convicção que superámos os desafios e que Aveiro 2024 - Capital Portuguesa da Cultura vai ser uma operação de grande qualidade e vitalidade.
De que maneira a sustentabilidade vai ser incorporada nas iniciativas culturais que vão decorrer?
JRE -A sustentabilidade é uma matéria sempre presente neste território, em particular nas preocupações e nas ações diárias da governação da Câmara Municipal de Aveiro. Falamos não só na presença humana neste território tão sensível e nas alterações climáticas, que afetam Aveiro há séculos, como também na sustentabilidade das comunidades, dos ecossistemas e dos equipamentos. A relação tensa e positiva, desafiante e realizadora entre o homem e a natureza tem uma história e uma existência muito relevante em Aveiro cidade, município e região. A sustentabilidade como urgência e desafio de sobrevivência foi o mote para algumas das ações que visam discutir, criar e contribuir para uma maior consciência local e global.Teremos espetáculos, conferências, festivais em que estas temáticas estarão presentes, num diálogo permanente e que queremos frutífero com criadores, público e instituições.
Existem parcerias com instituições e empresas locais para maximizar o impacto positivo? E colaborações específicas com artistas e grupos culturais locais?
JRE - Sim, existem ambas as dimensões. No programa de Aveiro 2024 temos colaborações muito específicas e relevantes com algumas das empresas e instituições de referência a nível regional e nacional, quer no campo da cultura e das artes, quer ao nível empresarial. Como exemplo podemos referir a parceria com a empresa Vista Alegre, do Grupo Visabeira, que neste ano comemora os seus 200 anos e com quem temos um programa conjunto de iniciativas. Há também uma série de projetos conjuntos com a nossa Universidade de Aveiro, que está a comemorar os seus 50 anos. A Escola Artística do Conservatório de Música Calouste Gulbenkian de Aveiro é outro exemplo relevante de cooperação. Temos ainda uma parceria com operadores turísticos e hoteleiros na divulgação do projeto e na afetação de muitos dos recursos financeiros e técnicos junto de empresas da economia local ao nível da construção do projeto (acolhimento, restauração, serviços criativos, serviços técnicos e de produção, entre outros).
Como estão a ser aproveitadas as oportunidades para inovar e fazer deste evento uma referência?
José Pina (JP) - Um projeto de grande ambição e expectativas como este, que congrega em si um conjunto de múltiplos esforços e investimentos financeiros, técnicos, de planeamento, tem de marcar a diferença e constituir-se como mais uma valia face às dinâmicas habituais.
É neste cruzamento entre o título de Capital Portuguesa da Cultura, a criatividade, as imensas estruturas, os artistas, os técnicos, as instituições, o público e os imensos parceiros que Aveiro ambiciona reforçar, a uma escala nacional e europeia, o estatuto de um polo permanente de cultura, de criação artística e de inovação. Abrimos as portas a novos projetos, à criação e ao reforço de novas redes colaborativas no domínio da criação e da programação cultural, à construção de mais e melhor mediação cultural e à envolvência e criação de novos públicos, com o objetivo de capacitar o setor cultural e criativo da região de Aveiro e de reforçar o apoio à criação artística contemporânea a nível nacional.
Quais são as atividades culturais planeadas em diferentes áreas?
JP - Aveiro 2024 foi pensado para responder a quatro cruzamentos da cultura com alguns desafios que o futuro nos apresenta: a identidade como fator distintivo da individualidade e da diversidade; a democracia como valor fundamental do desenvolvimento coletivo; a sustentabilidade como urgência e desafio de sobrevivência; e a tecnologia como ferramenta de inovação e experimentação. Neste sentido, no desenho da programação, foram criadas áreas de programação que incluem propostas para artes performativas, exposições, cinema, literatura, espaço público, gastronomia e pensamento, convocando nomes cimeiros do panorama local, regional, nacional e internacional. Para cada um dos temas eleitos foram encomendados conteúdos originais, formando um mosaico amplo de vozes e perspetivas.
Como é que essa programação reflete a diversidade cultural de Aveiro e de Portugal como um todo?
JP - O programa reflete uma visão coerente, de qualidade, com grande diversidade e regularidade, e suscetível de captar a atenção de vários públicos de diferentes proveniências. Trata-se de um programa agregador e aberto à diversidade, sem barreiras entre criadores e público, onde a ambição se entrelaça com a inclusão. É também uma programação que promove a análise e a discussão a nível artístico de múltiplos temas que nos afetam não só enquanto comunidade local e regional, mas também enquanto país. As diferentes manifestações da cultura portuguesa (da mais erudita à alternativa, passando pela mais popular) estão presentes no programa, assim como a promoção e valorização da cultura aveirense (município e região).
Para o efeito convidamos e contamos com a presença de alguns dos mais prestigiados artistas, criadores, pensadores, estruturas artísticas a nível nacional e internacional, assim como temos o prazer de ter connosco um número significativo de artistas, coletivos artísticos e estruturas associativas de Aveiro, da nossa Academia e do nosso setor empresarial.
O certame pretende promover a identidade de Aveiro enquanto comunidade ligada ao mar e à Ria de Aveiro?
JP - Vivemos um tempo muito sensível no que toca às questões identitárias e este programa pretende mostrar como a identidade é um espaço aberto, inclusivo e participativo. Queremos, através da criação e do pensamento, abordar o tema da identidade na sua aceção mais lata e não só da identidade de Aveiro. Aveiro é uma cidade com identidade, mas de várias identidades. A sua relação com o mar e a Ria é uma ligação não só de passado, mas também de presente e de muito futuro. Aveiro é uma cidade de cruzamentos entre a terra e o mar, com uma identidade em constante movimento.
A programação, em particular a do primeiro trimestre, coloca Aveiro num lugar que confronta o mundo que temos, com todos os seus paradoxos contemporâneos, tendo na cultura uma via aberta à interação enquanto processo de construção do presente e do futuro e da sua relação com o território e os cidadãos. O tema do primeiro trimestre, Cultura e Identidade, também é o resultado natural de um conjunto de datas e eventos que celebram Aveiro e que servem de ponto de partida para uma reflexão mais ampla em torno da ideia de identidade e de como esta define o sentimento de pertença.
Além de promover a cultura local, Aveiro 2024 pretende destacar e divulgar a cultura nacional nas suas diversas dimensões. Como?
JP - Criámos um desenho de programação assente num vasto mosaico de vozes e perspetivas, com propostas para artes performativas, exposições, cinema, literatura, espaço público, gastronomia e pensamento, convocando nomes cimeiros do panorama nacional, que, através das suas estreias, residências artísticas, coproduções e acolhimentos, apresentam no nosso programa as suas mais recentes criações.
Qual a estratégia para envolver a comunidade local e os visitantes externos? E como incentivar ambos estes públicos, o local e o de outras regiões do país e até do estrangeiro, a participar nas atividades propostas?
JP - A estratégia de envolver a comunidade local e os visitantes está presente na pluralidade, na diversidade e na regularidade dos conteúdos apresentados. São conteúdos que, pela sua pertinência (tema) ou pelo contexto da sua apresentação, são suscetíveis de captar a atenção de diferentes públicos.
Simultaneamente, a qualidade artística, as diferentes estéticas, o facto de muitas dessas propostas serem estreias ou projetos de cocriação, e a dimensão e qualidade dos criadores são também muito relevantes na captação da atenção do público. Existe também um cuidado muito forte na criação de oportunidades de participação e de envolvimento das diferentes comunidades, através de ‘open calls’ e de convites a determinadas comunidades a participarem.
A tecnologia e a inovação terão um papel a dizer? Existem iniciativas específicas que destaquem a simbiose tecnologia/inovação/cultura?
JP - Sim. A tecnologia assume um papel muito relevante na paisagem cultural e socioeconómica desta região. Há uma ligação umbilical entre este território e a tecnologia, não só ao nível da Academia como também na dimensão empresarial. É importante não esquecer que algumas das empresas de ponta ao nível tecnológico em Portugal e na Europa tem em Aveiro os seus centros de investigação e que muitas das empresas de referência nestas áreas em Portugal estão implementadas em Aveiro. A própria Câmara Municipal tem investido de forma muito significativa, estratégica e regular nesta dimensão, assumido como uma das suas prioridades para o desenvolvimento do território, como é o exemplo disso o projeto Aveiro Steam City. Ao nível da programação de Aveiro 2024 teremos momentos muito marcantes em que, através da arte, se discute as oportunidades e os perigos da tecnologia. e a tecnologia como ferramenta de inovação e experimentação. Apresentamos ainda grandes eventos ligados à tecnologia como a Aveiro Tech Week e o Festival Prisma Art,Light&Tech.