Astérix e Obélix metem a colher em intrigas de druidas
Há mais de meio século que estes populares heróis da banda desenhada, criados pelos franceses Albert Uderzo e René Goscinny, conquistaram o grande (e pequeno) ecrã. E a verdade é que tudo começou no próprio formato criativo da animação com o filme Astérix, o Gaulês (1967), de Ray Goossens, seguido da brilhante diversão em terra de pirâmides e múmias, Astérix e Cleópatra (1968), realizada pelos respetivos autores das personagens.
Depois de mais uma mão-cheia de desenhos animados, surgiu uma série de produções em imagem real - entre 1999 e 2012 - que chegou a incluir uma versão dessa Cleópatra interpretada pela italiana Monica Bellucci, tendo Gérard Depardieu em todos os filmes, sem exceção, no papel inigualável do corpulento Obélix. Finalmente, em 2014, com O Domínio dos Deuses, assinado por Alexandre Astier e Louis Clichy, a animação voltou a ser a grande aposta para prolongar o universo Astérix no cinema... Sucedendo a essa história sobre a tentativa de os legionários romanos tomarem a pequena aldeia do Astérix, o novo O Segredo da Poção Mágica, também de Astier e Clichy, assinala o segundo momento deste retomar da linguagem dos desenhos animados - que hoje têm uma aparência digitalmente mais trabalhada mas nem por isso mais apelativa. Para todos os efeitos, importa dizer que se destina sobretudo ao público infantil, apesar da óbvia atração geracional.
Neste capítulo inédito das aventuras dos gauleses, o vetusto druida da aldeia, Panoramix, cai de uma árvore, torce o pé e começa a fazer contas à vida. Que é como quem diz: apercebendo-se de que, pela idade avançada, os seus dias poderão estar a chegar ao fim, decide iniciar a busca por um jovem druida que seja digno de o substituir quando for necessário. Mais precisamente alguém a quem possa confiar a bendita fórmula da poção mágica que dá aos gauleses a força sobre-humana para combater os romanos. E se a sua decisão não é bem-vista pelos conterrâneos, a viagem que deve concretizar, escoltado pelos fiéis companheiros Astérix e Obélix, será uma missão mais complexa. Até porque ao trio junta-se a pequena Pectina, uma menina curiosa e disposta a tudo para ajudar o velho druida, que acabará por ser uma relevante personagem feminina no enredo, desafiando as leis conservadoras que dão exclusividade aos homens nos assuntos de druidas...
Explorando o passado oculto da personagem de Panoramix, os realizadores Clichy e Astier (este último escreveu o argumento original) abrem então uma nova janela narrativa através da figura de Sulfurix, um antigo rival do druida que terá um esquema maquiavélico para ser o seu sucessor. Enquanto ele conjura um plano com o patrocínio de César e o próprio Panoramix percorre toda a Gália à procura da verdadeira boa alma que lhe tomará o lugar, a aldeia dos gauleses é, sem surpresa, ameaçada pelas tropas romanas, que se limitam a ser bombardeadas pelas aldeãs e aldeões munidos da poção mágica... O problema é que ela está quase a esgotar-se e não há sinal dos heróis da fita.
Da mesma forma, podemos dizer que o filme de Astier e Clichy acaba por esgotar-se um pouco nesta representação simples do bem e do mal, não chegando a tirar partido da sua icónica dupla. Isto é, não conseguindo segurar com eficácia o tempo para a comédia intrínseca de Astérix e Obélix, que no fundo é a chave do deleite dos fãs. Apesar de alguns momentos aflorarem tal dinâmica da parelha, a linha de ação acumulada, e os diálogos pouco trabalhados, não lhes permite desenvolver um autêntico charme humorístico. Algo que se nota ainda mais por se tratar de uma versão dobrada - sem que aqui se tire o mérito a Manuel Marques, na voz do herói loiro baixinho, e Eduardo Madeira, na do ruivo volumoso.
Resta então a este O Segredo da Poção Mágica a qualidade da receita intemporal: a peculiar simpatia das personagens, o teor das suas peripécias e os valores que as definem. Caso para dizer (por Tutatis!) que só era preciso ter mais Astérix/Obélix e menos Sulfurix.
** Com interesse