A Fundação D. Luís tem a seu cargo a organização e programação de 16 equipamentos culturais do município de Cascais, entre os quais o Centro Cultural da vila e a Casa das Histórias Paula Rego no local agora apelidado de Bairro dos Museus. Salvato Teles de Menezes, presidente da fundação que foi criada há 26 anos para se ocupar da cultura no município de Cascais, faz, com a sua equipa, a gestão dos vários equipamentos para, entre outros assuntos, evitar, explica, as "desnecessárias coincidências" de programação. Contudo, sublinha a autonomia de cada equipamento cascalense na escolha de propostas que podem ou não adequar-se à linha estratégica da fundação. Em conversa com o DN, revela algumas novidades na programação e o que falta para Portugal receber grandes e mediáticas exposições como acontece noutras paragens..São 16 equipamentos culturais geridos pela fundação que preside, como fazem a sua gestão? Dou um exemplo, o Centro Cultural de Cascais não é um museu, e por isso definimos nesse equipamento uma linha de equilíbrio entre diferentes manifestações das artes plásticas, que vão desde a escultura, a fotografia, a pintura, a instalação, etc. - é o equipamento mais eclético de Cascais e com maior liberdade de seleção. Os outros estão mais balizados. Como o Museu Condes de Castro Guimarães que tem pintura naturalista portuguesa e onde há mobiliário importante. Ou, outro exemplo, a Casa das Histórias Paula Rego, dedicado à pintura contemporânea, que é um museu tendo como objetivo prioritário o estudo da obra da pintora, com quem temos um protocolo de entendimento. A ideia é tirarmos partido da especificidade de cada equipamento e definir o que lá fazer para não estarmos a criar situações até difíceis de entender por quem lá vai..Nos últimos anos, no Centro Cultural, têm tido sucesso com exposições de fotografia, com grande adesão de público. Surpreendeu-o? Sim. Confesso que não esperava que em tempo de pandemia tivéssemos 45 mil visitantes para ver a exposição da fotógrafa Vivian Maier. Foi uma agradável surpresa. Quem é que em Portugal conhecia bem a obra de Vivian Maier? Aqui há que sublinhar o papel fundamental dos meios de comunicação na divulgação da qualidade da obra da fotógrafa, que é bem merecida..Citaçãocitacao"É o Estado que deve definir uma estratégia que, simultaneamente, dê a conhecer obras de grande importância internacional e promova as obras dos nossos artistas mais importantes.".Com isso pode dizer-se que os tempos de pandemia vos sorriram? Apostámos mais em tecnologia, passámos a disponibilizar visitas virtuais às exposições e aos equipamentos mais emblemáticos de Cascais, e que estão disponíveis no nosso site . E até fizemos uma coisa que julgo ter sido inédita na altura. Tínhamos no programa uma proposta de comemorar a viagem de circum-navegação de Fernão de Magalhães. Era suposto que as obras viessem do Chile de barco para Portugal, uma logística complicada sobretudo com a pandemia. Chegámos então a uma solução, em conjunto com os nossos colegas latino-americanos: enviámos imagens tridimensionais do local onde iria ser a exposição física, por sua vez, eles estudaram o local e como as obras se adequariam melhor ao espaço. De seguida enviaram-nos as imagens em alta resolução e montámos a exposição num espaço tridimensional como se estivesse mesmo no local. Na altura, confinadas em casa, as pessoas estavam ávidas de ver coisas e correu muito bem. Dou outro exemplo: em média cada exposição na Casa das Histórias Paula Rego traz 55 mil visitantes, no caso das visitas online, e mais uma vez, em tempos de pandemia, tivemos cerca de 70 mil visitantes da exposição virtual. Ou seja, encontrámos várias soluções e que já não abandonaremos.....era a pergunta seguinte: ficará para o futuro alguma dessas adaptações que fizeram? Vamos manter esta aposta e transformar isso num estímulo ainda maior para as pessoas visitarem os nossos equipamentos. Uma espécie de teaser das exposições. Fizemos melhorias no site e melhorámos a facilidade de consulta. No fundo, todos os que trabalham na área da cultura têm de ser capazes de encontrar sempre novas soluções e até procurar perceber como o público acede às propostas, saber do que estão à espera e tentar ir ao encontro desses anseios..Mesmo assim adiaram muitas exposições? Sim, mas tentámos logo recuperá-las ou substitui-las. Uma delas que vai ser feita em junho/julho é a exposição da obra de um grande pintor contemporâneo espanhol, Juan Genovés, que era para ter decorrido no ano passado. As obras de Genovés vêm de locais muito diferentes de Espanha e era complicado realizar naquela altura. E também é uma exposição que me parece não se deve ficar pela solução virtual, mas sim pela visita ao local, ver pessoalmente as obras desse grande pintor..E continuando a levantar o véu aos leitores do DN, e também em jeito do tal teaser que mencionou, para além de Genovés, o que está previsto este ano e que mereça destaque? Há muita coisa interessante. Em breve vamos ter uma exposição da pintora Menez, nas Casa das Histórias, que, como se sabe, foi uma pintora que teve relações de amizade com Paula Rego. No Centro Cultural de Cascais vamos ter uma exposição de uma grande fotógrafa canadiana, Margaret Watkins, que não é muito conhecida em Portugal, mas quando o público vir as suas fotografias estou certo de que ficará entusiasmado. E, no último trimestre de 2022, vamos inaugurar a Vila das Artes, à volta do Edifício Cruzeiro, no Monte Estoril, que está a ser totalmente remodelado, onde será instalada a escola de teatro do Teatro Experimental de Cascais, onde este vai atuar, e vai para lá também o conservatório de música, ou seja, vamos ter um excelente auditório para música, teatro e cinema. O que é hoje o bairro dos museus serve para as artes plásticas, ali será o espaço das artes performativas. Vamos ter uma série de auditorias disponíveis que irá articular a programação com o auditório a ser construído..Como homem da cultura, não acha que falta a Portugal, e às cidades portuguesas, e locais com muito turismo como é o caso de Cascais, grandes exposições como se veem em cidades de outros países europeus, seja Espanha ou países mais da nossa dimensão geográfica como Bélgica, Países Baixos, Suíça...? Concordo, genericamente, que em Portugal ainda não existem com a regularidade de outras cidades. Ainda não temos em Portugal museus como o Prado ou o Reina Sofía ou mesmo o Thyssen-Bornemisza, como em Madrid. Mas também esses são alguns dos melhores museus do mundo. No entanto, para que exista alguma regularidade de grandes exposições é necessário um maior investimento por parte do Estado. É o Estado que deve definir uma estratégia que, simultaneamente, dê a conhecer obras de grande importância internacional, assim como promover as obras dos nossos artistas mais importantes. Porque, a meu ver, é também insuficiente a aposta que se faz nos grandes artistas portugueses. Agora estamos a falar nas artes plásticas, mas também podemos falar de literatura....salvo o caso de José Saramago que não precisa de nada porque que ganhou o Prémio Nobel, há outros grandes escritores que não são falados. Era muito importante promovermos os nossos próprios escritores. Essa promoção daria frutos seguros. Por exemplo, esqueci-me de mencionar, vamos apresentar no próximo dia 25 de abril ,no Forte de Santo António da Barra, uma ideia do próprio presidente da Câmara de Cascais , Carlos Carreiras, um centro da língua e do mar, para promover a língua que foi divulgada através do mar. É um projeto que envolve Portugal e todos os países que falam português. Porém a sua questão é pertinente, mas tem de ser definida de forma central..Mas, pelo menos, e até ao momento, o Orçamento do Estado dedicado à cultura parece ficar aquém dessas expectativas... Ainda não se percebeu, provavelmente, a cadeia de valor do setor da cultura. Não é despiciendo que tenhamos 45 mil visitantes de uma exposição ao invés de 10 mil. Se tiver 45 mil sei que vai causar um efeito muito importante. Não vejo que seja de descurar a ideia de ir buscar mais públicos - porque não é só um público. Mas, seja em que área for, sem investimento não há nada..O orçamento da fundação vem exclusivamente da Câmara de Cascais? Não, tem várias origens. Câmara Municipal de Cascais e privados. A fundação quando foi criada teve como catalisador a câmara mas agregou mais sete privados, bancos, empresas e até pessoas a título individual. Ao longo dos anos fomos conquistando outros apoiantes que também têm importância significativa. Por outro lado, temos fontes de receitas próprias, para o nosso orçamento, que ronda o milhão de euros e que, penso, aplicamos bem..filipe.gil@dn.pt