O “Natal dos Hospitais” era, na época, um dos mais esperados e populares programas televisivos de variedades e o único que não tinha censura prévia. Na primeira fila, estavam Ramiro Valadão, o todo-poderoso presidente da RTP, e César Moreira Baptista, secretário de Estado da Informação e Turismo. João Maria Tudella tinha solicitado a Nuno Nazareth Fernandes e a Ary dos Santos uma canção para o efeito, e o poeta lança uma farpa ao regime. A transmissão televisiva era em direto, e ao ouvir as palavras de Ary o semblante de Ramiro Valadão não augurava nada de bom: “Cantarei livremente / E direi ao meu povo / Que não caia doente / Que não morra de novo”. O tema seria censurado e o cantor proibido de voltar a trabalhar na RTP, ainda assim, no ano seguinte, lançaria um novo trabalho, “Tudella canta música de Pedro Jordão”, que inclui, por exemplo, “Liberdade”, com palavras de Manuel Alegre, e “Fuzilaram um homem num país distante”, em que José Gomes Ferreira lembra o assassinato de Humberto Delgado. Este disco também foi proibido pela censura. O registo poético-musical destas canções situava-se à margem da música ligeira e da corrente emergente dos baladeiros. Há quem diga que ele foi o cantor que melhor divulgou a terra onde nasceu, Moçambique, e que, cantando a liberdade, teve a coragem suficiente para afrontar, olhos nos olhos, um regime que, tardiamente, defendia o colonialismo. “Cama 4, Sala 5”, a canção que enfrentou de frente o regime, foi orquestrada por Pedro Osório, mas não ficou qualquer gravação para a posteridade.