#1 “E depois do adeus” (José Niza / José Calvário), Paulo de Carvalho, 1974
Vitor Higgs

#1 “E depois do adeus” (José Niza / José Calvário), Paulo de Carvalho, 1974

Uma melodia feita com a cabeça nas nuvens
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A 7 de março de 1974, realizou-se o “XI Grande Prémio TV da Canção”. O sistema eletrónico de pontuações avariou e Glória de Matos teve de subir a um banquinho e escrever os pontos a giz. O festival “vestia-se” de “smoking” ou vestido comprido, cheirava a naftalina, tal como o regime caduco, e nem todas as canções eram modernas. Venceu a melodia composta numa viagem de avião, com um poema feito a partir de bocadinhos de cartas que o seu autor escreveu à mulher desde Angola. A voz era a que tanto porfiava ganhar: Paulo de Carvalho. Porém, a canção de José Niza e de José Calvário não era a mais incómoda. A censura apenas estava de olho na canção de José Cid, “No dia em que o rei fez anos”, interpretada pelo grupo Green Windows. Ambas acabariam por ser inspiradoras do futuro do povo português em vésperas do 25 de Abril, mas a primeira ganhou a soar a “Amanecer”, representante de Espanha no festival eurovisivo dois anos antes, e a segunda perdeu a soar à canção irónico-humorística alemã “Ra-Ta-Ta” criada quatro anos antes. Essas são contas de um outro rosário, porque o que mais importa é que ambas se despediram de um certame onde a metáfora foi o recurso para que alguns autores passassem as suas mensagens e provocassem impacto junto do povo português. Uma canção de amor, com a frase “quis saber quem sou, o que faço aqui”, inspirou o avanço das forças militares e faz parte de um conjunto de canções que, até esse dia luminoso, contribuiu para transformar a situação política e cultural portuguesa.

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