17 anos depois, Lisboa avança com sala de 'chuto' sobre rodas
A primeira sala de consumo de droga assistido em Portugal avança até ao final do ano em Lisboa, 17 anos depois de ter sido aprovada legislação que permite estas infraestruturas.
Será uma carrinha que vai circular na zona da Avenida Almirante Reis e na zona oriental da cidade, onde atualmente existe consumo a céu aberto.
A esta unidade móvel vão seguir-se dois locais fixos que estão escolhidos - Alta de Lisboa e Vale de Alcântara - e os processos para a sua abertura devem ser tratados durante o primeiro semestre de 2019 para que a sua abertura simultânea seja feita ainda no próximo ano.
O primeiro passo para este projeto de apoio aos cerca de 1400 consumidores na rua identificados pela autarquia é dado ao final da tarde desta quinta-feira quando o vereador Manuel Grilo, o diretor do SICAD João Goulão e o presidente da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT) Luís Pisco assinarem o protocolo de cooperação entre estas entidades para a implementação e monitorização do programa de consumo assistido.
Segue-se a apresentação e votação em reunião de câmara, o que está agendado para o próximo dia 15.
Este projeto-piloto vai no primeiro ano com investimento da Câmara Municipal de Lisboa e está previsto que após os 12 meses iniciais o SICAD - Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências passe a pagar 80% do custo deste programa, que poderá rondar os 200 mil euros numa primeira fase.
O gabinete do vereador Manuel Grilo (eleito pelo Bloco de Esquerda) frisa em comunicado que este equipamento móvel vai ser gerido por uma "equipa técnica multidisciplinar, de forma a garantir a segurança e a higiene dos consumidores, das comunidades envolventes, assim como a ligação a respostas sociais, de saúde e de cidadania".
No protocolo que vai ser assinado fica estabelecido que o SICAD vai "colaborar na definição e verificação dos termos e condições" de funcionamento como horários, percursos, equipa técnica.
À câmara compete a escolha das "entidades sem fins lucrativos que deverão executar fisicamente o programa no primeiro e no segundo ano de implementação", bem como "financiar a execução do projeto" nesse período.
E a ARSLVT tem de "garantir a transição de equipamento(s) adquirido(s) durante os dois primeiros anos de execução do programa, designadamente aceitando em doação, após aquele período, a propriedade do veículo utilizado como unidade móvel e, consequentemente, reafetando-o àquele ou a outro que o substitua, na área do município, nos anos seguintes".
Em Lisboa haverá cerca de 1400 pessoas que estão em maior risco, de acordo com um documento produzido pela Associação Crescer, pela Associação Ares do Pinhal, o Grupo Ativistas em Tratamento e os Médicos do Mundo e apresentado a 19 de abril deste ano.
Para este diagnóstico foram incluídas consultas às juntas de freguesia, polícias e moradores da cidade.
O estudo mostra que os toxicodependentes identificados são uma população "envelhecida, a larga maioria com idade superior a 40 anos, e que apresenta, do ponto de vista social, um perfil de pobreza e de exclusão social".
São, também, sem-abrigo ou a viver em instituições de acolhimento ou casas abandonadas.
São consumidores diários, em risco de overdose e com elevadas prevalências de hepatite C, infeções pelo VIH e hepatite B. Sempre com baixos índices de tratamento.
As salas de consumo vigiado existem na Europa desde 1986 quando foi inaugurada a primeira estrutura deste tipo em Berna.
Os dados mais recentes, divulgados pelo Observatório Europeu da Droga e Toxicodependência, apontam para a existência de cerca de cem salas destas em 67 cidades. Na Holanda, Alemanha, Dinamarca, Espanha, Noruega, França, Luxemburgo e Suíça.
Tal como Portugal também a Irlanda aprovou uma lei (no ano passado) com vista a permitir o licenciamento e a regulação destas estruturas.
E depois de um estudo efetuado em cinco cidades belgas (Gante, Antuérpia, Bruxelas, Liège e Charleroi) foram, segundo o Observatório, apresentados pedidos, em fevereiro deste ano, à classe política para viabilizar salas de consumo assistido.